Sem categoria

Luisa Barbosa: O começo do fim

Parte 2
"Quero estar bem acordado/ Quando o povo despertar/ Pra sair com ele à praça/ Em meio a sua massa/ Espero que pra cantar”. Trecho da Musica “Diz que vai virar” de Luiz Gonzaga.
Por Luisa Barbosa*

Em virtude do nosso 13o Congresso, até 16 de novembro deste ano passaremos por um período de reflexão interna. Avaliaremos tática e realizaremos análises sobre a situação político-econômica, questões de organização e luta pauta de ação, objetivos, orientações…

No ponto 172 de nosso Caderno de Teses, está colocado o desafio do 13° Congresso: “… colocar o Partido à altura do atual nível de embate político no país, confrontar as deficiências e potencializar seu papel”. Desafio esse que tem como ponto “cardial”, ser um Partido de milhões.

Nesse século, não existiu momento político no país melhor para fazer essa discussão por três motivos: A) o capitalismo, como já destacado na parte 1 dessa reflexão, vive uma crise sistêmica e estrutural. B) o país está mais desenvolvido, menos desigual. Os mais de 10 anos de governo das forças democráticas e populares o qual nos incluímos, representados por Lula e Dilma, são de fato parte constitutiva de uma transição ao neoliberalismo; C) a novidade recente é que pela primeira vez nesse século vivemos um momento de grandes mobilizações sociais e, como já dito, as crises do capitalismo abrem oportunidades para as mudanças mais profundas, vide os exemplos de todo o do mundo.

Na nossa “história do tempo presente” diversos elementos contribuíram para centelha que incendiou a pradaria das manifestações iniciadas em junho (e não finalizadas): a covarde violência da polícia à manifestação em São Paulo contra o aumento da passagem urbana; o problema da mobilidade (dominada por monopólios) que é um dos muitos que assola quase todas as cidades do Brasil; a demanda da população por mais direitos; a criminalização da pobreza… E o contexto de uma crise mundial (globalizada também em suas mensagens e signos pelos meios de comunicação) que tem estimulado mobilizações também por todo mundo. Por isso, de maneira geral, as manifestações possuem uma profunda marca anti-capitalista, a favor da distribuição da riqueza (produzida pelo povo) gerida pelo Estado em benefício do serviço público de qualidade. Esse é um importantíssimo elemento, que não pode ser descartado das nossas avaliações. Descartá-lo atrapalha nossa tática, a avaliação de nossas ações.

A “velha” questão da vanguarda e do povo

Entretanto é importante destacar que as mobilizações tiveram estreita relação com o imaginário do consumismo impulsionado pela ampliação do crédito no Brasil (+ de 500% em 10 anos). Não à toa às principais palavras de ordem eram de campanhas publicitárias: “o gigante acordou” (Johnny Walker); Vem pra Rua (Fiat). Também que de fato setores conservadores e de direita aproveitaram o momento para se apresentarem com uma pauta nacionalista, conservadora, anti-corrupção e contra partido, na esperança de uma saída “bonapartista”. A história, ao menos, se repetiu como farsa.

Entretanto bandeiras como educação de qualidade, sistema único de saúde, mobilidade urbana, combate à corrupção, um novo sistema eleitoral, são bandeiras progressistas, empunhada por nós.

A verdade nua e crua, para desespero do PIG, é que as manifestações não surgiram de forma espontânea, via facebook. A população brasileira já vinha sendo mobilizada há tempos pelos movimentos sociais e partidos políticos, que ainda influenciam sim a sociedade, e são atores fundamentais.

Também por isso, quando a euforia de junho/julho arrefeceu, a esquerda e movimentos anti-capitalistas (alguns organizados em black blocks) continuou nas ruas, defendendo suas pautas. As centrais sindicais se mobilizaram, foi realizado um dia nacional de lutas em 11 de julho (veja bem, não junho), trabalhadores em vários estados entraram (e muitos ainda continuam) em greve, e a luta política popular e progressista segue como sempre seguiu.

Para ficarmos em alguns exemplos caseiros, desde o primeiro governo Lula o PCdoB defendia o “mergulho nos movimentos sociais” e a mobilização do povo para “puxar o governo para a esquerda”; a UJS convocava a juventude #nasredesenasruas, estava “na pressão pelas mudanças”… Foi exatamente isso que ocorreu no período recente, vide a postura mais agressiva do governo no sentido de promover mudanças mais profundas (Mais Médicos, plebiscito da reforma política, royalties para educação…).

A população nas ruas clamava também, de maneira geral, por parte das pautas que definimos como prioritárias no nosso último congresso: reforma urbana, da educação, da mídia, tributária, agrária e política.

Não prevíamos o futuro. Avaliávamos corretamente a conjuntura política e o desafio colocado para o país. Mas…. A pergunta que ficou foi: “por que não ouviram o nosso comando? Nós que estamos nas ruas há muito mais tempo? Nós que nunca dormimos?”. “Por que (mesmo com ônibus, mobilização, lanche) era sempre tão difícil colocar o povo na rua?” e até: “quem são esses playboys para protestar?”.

Nosso Partido, que tem 92 anos de história em defesa do Brasil e do seu povo, tem muito a contribuir para compreensão desse momento. Entretanto precisa refletir sobre os acontecimentos, com os pés no método do materialismo histórico, entender a realidade a qual estamos todos inseridos. Realidade essa que envolve uma crise de grandes proporções (não um colapso passageiro) no sistema que, como desnudado por Lênin, é dominado pelos monopólios e pela fusão do capital bancário com o capital produtivo. Por isso precisamos estar bem atentos aos questionamentos do povo a esse modelo, mesmo que esses sejam difusos, pouco claros e aparentemente "sem consciência". Por que, o capitalismo por si só (nas palavras de Gonzagão) “não vai virar”. Precisamos empurrar.

Lutamos por um país menos desigual, com redução da pobreza, “mais médicos”, universidades, escolas técnicas…. Mas nossa estratégia vai muito além. Por mais que – como já dito por um conterrâneo nessa mesma tribuna de debates ao menos na aparência, a natureza da atual crise do capitalismo não permita alternativas fora de seu escopo, é preciso desafiar o possível! Outra conterrânea, em vídeo de saudação ao congresso, também defendeu que, acima de tudo neste congresso, não devemos arriar a bandeira vermelha do socialismo. É esse o desafio. As crises, que possibilitam o nascimento do novo, pode ser o começo (um longo começo) do fim.

*Luisa Barbosa Pereira é militante do PCdoB Contagem-MG.