Alexandre Lucas: Cultura, mercado e resistência

Por *Alexandre Lucas

A mercantilização da cultura é um dos fatores preponderantes dentro da lógica capitalista, notadamente no que se denomina de indústria cultural ou cultura de massa. Conforme Edgar Morin, “a produção cultural é determinada pelo próprio mercado. Por esse traço, ela se diferencia fundamentalmente das outras culturas”. Entretanto, se alinha na mesma lógica de mercado e perversão, o beneficiamento de instituições públicas e privadas através de políticas públicas para cultura.

Apesar dos avanços ocorridos na última década no campo das políticas públicas para a cultura, ainda persistem alguns entraves de mercado na legislação e no processo de privilégio do mercado. As leis de incentivo fiscal é um dos exemplos. No Ceará, a Lei do Mecenato beneficia grandes empresas e que vende a sua marca com recursos públicos. Nacionalmente, a Lei Rouanet tem o mesmo perfil, ou seja, o setor privado define em quem vai investir e ainda faz publicidade privada com recursos públicos. Valer ressaltar que somente as grandes empresas são atendidas por essas legislações.

Existe também algo que deve ser combatido e denunciado de igual forma, que são as políticas de editais burocráticas para os pequenos produtores simbólicos e facilitadoras para empresas “produtoras culturais”. O Ceará é um exemplo implacável deste modelo. As políticas de editais cearenses privilegiam os aspectos jurídicos como primários, em outras palavras, antes de analisarem o conteúdo de qualquer projeto, primeiro estabelecem o aspecto jurídico como medida de descarte, o que acaba favorecendo as empresas de administração e contabilidade (Produtoras Culturais).

A atual Ministra da Cultura também assume uma postura equivalente. Um dos exemplos é o edital de Ocupação para os Centros de Artes e Esportes Unificados – CEUS, que atenderá “empresas especializadas”, tendo em vista a sua complexidade de execução para os produtores individuais (artistas) e os grupos e coletivos artísticos. Outra lógica poderia ser mais consequente do ponto de vista de descentralização de recursos e empoderamento dos grupos, seguindo a coerência do Programa Cultura Viva abandonado na atual gestão.

Dinheiro público para promoção privada é outra fator que deve ser criteriosamente analisado. Diversas empresas criam suas fundações culturais e instituições ligadas ao comércio e à indústria, a exemplo do Sistema S, que recebe valores públicos para promover a imagem das suas instituições e empresas. É preciso ter critérios de controle social destas instituições. É inadmissível recursos públicos destinados a empresas e instituições privadas não terem controle social. Elas não fazem um favor à sociedade, pelo contrário administram ao seu bel sabor o dinheiro desta sociedade. É preciso urgente criar mecanismos de controle e proposição social, transparência nos processos de escolhas artísticas, averiguação contábil e de contrapartida social destas instituições e empresas. Elas não podem ditar o que fazer com os recursos públicos.

É preciso antes de tudo estamos juntos e aguerridos contra os processos de mercantilização da cultura, tanto os que bestificam a população, como os que dizem se contrapor a isso, mas que acabam mamando e se beneficiando dos escassos recursos para cultura do país.

Um dos caminhos é a interlocução nacional dos movimentos sociais ligados à cultura, entrelaçadas com dois instrumentos fundamentais para essa luta que é a Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados e a Frente Parlamentar Mista em Defesa da Cultura, que já desempenham um papel fundamental de fiscalização e discussão de um novo marco legal para as políticas públicas de cultura no País.

Resistir é tarefa dos guerrilheiros da cultura. Não vamos pagar para o mercado ou para os parasitas de recursos públicos que teimam em querer ditar as regras.

*Alexandre Lucas é pedagogo, artista/educador, integrante do Coletivo Camaradas

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