Venício Lima: “O Estado mantém essa estrutura de mídia privada”
O III Fórum do Pensamento Crítico, que acontece desde a última segunda-feira (24/3) e vai até sexta-feira (28), em Salvador, recebeu o sociólogo e professor aposentado da Universidade de Brasília (UnB), Venício Artur de Lima. Na manhã desta quarta-feira (26), Lima, que é especialista em comunicação e política, participou dos debates sobre a herança cultural e comunicacional da ditadura militar (1964-1985) no Brasil.
Publicado 26/03/2014 16:12 | Editado 04/03/2020 16:15

Durante a palestra, o sociólogo defendeu que a estrutura de comunicação do país, que, em muitos momentos, serviu de sustentação para a ação dos militares [só o presidente-general Figueiredo aprovou 91 decretos de concessões como moeda de troca], pouco mudou com o processo de Redemocratização, que pôs fim à ditadura. A Constituição Federal de 1988 (CF88) teria reafirmado o que ele chamou de “privilégio” de alguns grupos de comunicação, que detém o poder sobre a informação, hoje.
O privilégio a que ele se refere está relacionado, principalmente, às concessões de rádio (10 anos) e TV (15 anos), que são de responsabilidades do Estado, e que cujas regras permanecem impossibilitando que as emissoras percam o contrato quando abandonam a função social. Pela CF88, a rejeição do pedido de renovação da concessão precisa ser votada publicamente por 2/5 do Congresso Nacional.
“Isso é impossível porque significa dizer que 238 deputados e senadores precisam declarar voto contrário à renovação, em uma votação aberta. Os parlamentares não querem se comprometer porque podem se tornar alvo dos grandes grupos de comunicação, que possuem poder sobre a opinião pública”, defende Venício Lima, que também é articulista do Vermelho.
Além da facilidade para renovação da concessão, que acontece sem uma devida investigação, Lima ainda condenou outras ações relacionadas ao Estado que terminam por fortalecer a estrutura comunicacional como está organizada. Para ele, a destinação das verbas publicitárias e as isenções fiscais oferecidas tornam o país um dos principais financiadores do oligopólio no setor.
“Ajuda-se a manter essa estrutura de mídia privada, comercial e oligopolizada, que promove um cerceamento da liberdade de expressão. A opinião pública é pautada por essa mídia e o interesse privado sempre prevalece”, continuou o sociólogo. Apesar do império construído pelos grandes grupos de comunicação do Brasil, que está nas mãos de sete famílias, Lima acredita que há meios de acabar com todo o poderio, que é, segundo ele, prejudicial à democracia.
A saída seria, principalmente, a criação de um marco civil para o setor, além de fortalecer e apoiar as mídias públicas, desenvolver debates sobre a questão [como o Fórum do Pensamento Crítico], e a criar os conselhos de comunicação. Sobre isso, Venício Lima elogia a Bahia, estado considerado por ele como um dos mais avançados no que diz respeito a essas preocupações.
“A Bahia é a mais honrosa exceção [em relação ao descomprometimento do país com as discussões sobre a democratização da comunicação]. O Conselho [Estadual] de Comunicação não é uma experiência perfeita, mas merece todo o nosso apoio”, finaliza.
O encontro da manhã desta quarta-feira também contou com as presenças da jornalista Ana Arruda Callado, do deputado Zezeu Ribeiro (PT), da secretária nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Luiza de Bairros, do cineasta Geraldo Sarno e do ativista de Direitos Humanos, Manuel de Almeida.
De Salvador,
Erikson Walla
Foto: Manoel Porto