José Cícero: Anos de chumbo nunca mais!

Por *José Cícero

Ao rememorarmos, sem nenhuma nostalgia, os 50 anos do golpe militar que instituiu a ditadura no nosso país, há que voltarmos nossas atenções para uma recapitulação histórica de todos aqueles fatos. E com isso, poderemos (quem sabe) aferir no seu devido grau o quão daninho, maléfico, desumano, retrógrado e criminoso foi todo o regime de exceção, imposto a duras penas à nação brasileira pelas elites raivosas e os militares criminosos desta terras tupiniquins.

Destarte, todo um aparato político infernal arquitetado sob o patrocínio, o interesse e a batuta do governo norte-americano. Um verdadeiro crime de lesa-pátria e lesa-humanidade pelo qual deveria se debruçar mais atentamente a tal 'Comissão da Verdade'. Assim como ocorreu recentemente no Chile, Uruguai e Argentina, seus verdadeiros culpados (ainda vivos) possam ser julgados e, uma vez condenados, possam pagar na cadeia todos os seus crimes horrendos que cometeram. Inclui-se aí a urgente revisão pelo Congresso Nacional da chamada Lei de Anistia.

Só após este histórico momento de absoluta reflexão talvez seja possível se avaliar a real importância da nossa atual democracia, da liberdade e do estado de direito como argamassas essências à formação da nossa autêntica cidadania. Conquistas que, diga-se de passagem, não aconteceram por acaso, nem da noite para o dia e tampouco vieram de graça na base de benesses, flores e confetes, mas ao custo de muita luta, sangue, suor, lágrimas e mortes.

Um preço, como se nota, dos mais altos, mas que infelizmente, muitos brasileiros, sobretudo os mais, jovens – em particular e os despolitizados em geral quase sem nenhuma compreensão histórica – ainda não se deram conta do valor e do sofrimento que foi toda a construção deste imenso legado. Algo que temos a obrigação de defender com unhas e dentes em nome das gerações vindouras.

Portanto, a passagem dos 50 anos da ditadura militar no Brasil é um marco, não somente simbólico como pode parecer para muitos, mas um chamamento a todos os brasileiros para pensar e repensar o país que queremos para refletirmos sobre os efeitos do passado como aprendizado para o presente e o futuro da nação. Ou ainda, para que se possa avaliar o que de fato estamos fazendo da democracia que temos e vivenciamos no dia a dia.

Que futuro nos aguarda daqui para frente, a partir dos nossos erros e vacilações. Das escolhas que fizemos ou que tememos fazê-las de agora em diante com este instrumento chamado liberdade de escolha e pensamento. Que este passado negro possa pelo menos nos situar devidamente no mundo das ideias, como na compreensão do presente. E assim, reavaliemos o nível da escolha que optamos para o horizonte do futuro e do presente.

A ditadura foi, por assim dizer, um grande exercício de aprendizado ético, moral, social e político. E isso não é pouca coisa diante dos perigosos momentos por que passaram o país. Que a sociedade brasileira, em seu conjunto articulado e pensante, possa refletir positivamente sobre tudo isso. Notadamente agora que estamos às portas de novas eleições das mais importantes para a consolidação de um país que se almeja forte e moderno no cenário mundial.

Razão da premente necessidade que temos de valorizar, o quanto antes, esta jovem democracia e que a cultuemos com mais consciência ética e protagonismo político, como ingredientes fundamentais para a edificação sólida de um país efetivamente justo e resolvido social e democraticamente.

Saber desta dura história de horror que assinalou os chamados "anos de chumbo" é uma exigência crucial (ou pelo menos deveria ser), sobretudo para a formação intelectual e crítica de cada cidadão. Quem sabe, uma boa maneira com que cada brasileiro (sem exceção) exercitará seu empoderamento sociopolítico no sentido do seu pertencimento, enquanto cidadão livre, feliz e consciente.

Assim, valorizar o regime democrático que ora temos a partir da observação histórica acerca da ditadura militar será realmente, a certeza de que a sociedade brasileira escolhera o melhor caminho e que jamais se permitirá a outro descalabro como tal que ocorreu a partir de 1964. E isto certamente nos ajudará, e muito, no salutar entendimento do nosso verdadeiro papel social. Então, sem mais delongas, abominemos coletivamente para todo o sempre qualquer forma de poder que não esteja amplamente alicerçada na democracia como um bem da humanidade como um todo. Nunca mais regime de exceção!

Que as mortes por assassinato dos nossos bravos lutadores – homens e mulheres das mais distantes regiões deste país e das mais diferentes classes sociais ou bandeiras ideológicas – não possam ter sido em vão. Que o sofrimento e toda sorte de torturas e sevícias impostos aos cidadãos brasileiros pelo regime ditatorial nunca sejam apagados da nossa memória história.

Quem sabe, uma forma empírica de fazer com que as novas gerações tanto do presente, quanto do futuro jamais se permitam que sequer algo parecido possa se repetir daqui em diante… Porque doravante, à luz da democracia, todos haveremos de estar condenados à liberdade. Que de agora em diante o antigo sonho da felicidade coletiva não nos seja tão somente uma utopia, mas uma realidade deveras real, papável e concreta.

Por isso gritemos bem alto e em bom som: Ditadura nunca mais! Viva a democracia! A liberdade e o estado de direito… O povo do Brasil pode mais!

*José Cícero é dirigente do Comitê Municipal do PCdoB de Aurora, professor, pesquisador e poeta.

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