Relator da ONU denuncia ocupação e colonos de Israel em Hebron

O relator especial das Nações Unidas para a situação dos Direitos Humanos nos Territórios Palestinos ocupados, Richard Falk, instou Israel, nesta terça-feira (15), a impedir os colonos de tomarem a Casa Al-Rajabi, em Hebron, cidade palestina ocupada militarmente pela administração israelense, na Cisjordânia. O apelo é uma reação à permissão de ocupação anunciada pelo ministro israelense da Defesa, Moshe Ya’alon.

Por Moara Crivelente, da Redação do Vermelho

Hebron Palestina segregação - Mondoweiss

Após uma disputa jurídica levada pelos palestinos à Suprema Corte israelense, a Casa Al-Rajabi, um edifício de quatro andares capaz de alojar 40 famílias, em Hebron, é ocupada pelos colonos. O local fica entre duas colônias ilegais, Kiryat Arba e à próxima da Mesquita de Abraão (também conhecida como Tumba dos Patriarcas), no centro da cidade antiga de Hebron.

“Três famílias de colonos já se mudaram para o edifício. Isto provavelmente significa mais restrições de movimento para os palestinos na área, mais bloqueios de estradas e mais acosso aos residentes palestinos e defensores dos direitos humanos pelos colonos,” advertiu Falk.

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A violência e os confrontos com os colonos são recorrentes e motivo de grave preocupação, com janelas gradeadas e redes metálicas acima das ruelas dos mercados antigos, protegendo os comerciantes árabes do lixo e das pedras lançadas por colonos que vivem nas casas por cima das lojas, por exemplo. De acordo com fontes locais, cerca de 400 famílias israelenses vivem como colonos na cidade.

   Foto: Moara Crivelente

  Ruas da cidade antiga de Hebron, com o que restou aberto do mercado de rua, com grades metálicas acima que, de
   acordo com palestinos no local, previnem contra as pedras e o lixo lançado por colonos israelenses.

Hebron no centro da ocupação israelense

A cidade de Hebron tem um estatuto especial de divisão administrativa dentro dos territórios palestinos, segundo um acordo da década de 1990, que deveria ser temporário, mas segue vigente. A região é ocupada militarmente pelas tropas israelenses, com postos de controle militar dentro do centro urbano, entre diferentes bairros, que impõem restrições sérias à movimentação dos palestinos, com revistas frequentes e horário de encerramento (geralmente, 21h00), à partir do qual a movimentação é vedada.

“Esta é a primeira vez que uma nova colônia é criada no centro de Hebron, desde os anos 1980 – e somaria ao suplício da comunidade palestina”, enfatizou Falk. “Não poderia haver coisa pior para alimentar a retomada da violência do que a criação de uma nova colônia no coração da [parte] antiga de Hebron.”

Os colonos ocuparam ilegalmente o edifício de quatro andares que estava sendo construído por famílias palestinas em março de 2007, e continuaram lá até dezembro de 2008, quando uma decisão da Suprema Corte israelense despejou os colonos, pendente de uma revisão judicial mais detalhada sobre as reivindicações de propriedade, explica o portal do Departamento do Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos.

“Durante aquele período, a ONU e organizações não governamentais de proteção dos direitos humanos testemunharam um aumento grave da violência dos colonos e do acosso contra os residentes palestinos daquela vizinhança.”

A casa da família Al-Rajabi, que foi despejada pelas forças israelenses de segurança, ficou vazia por ordem judicial, afirma o portal, até 11 de março deste ano, quando a Suprema Corte israelense emitiu sua decisão final, rejeitando um apelo dos palestinos e favorecendo a propriedade dos colonos sobre o prédio, reocupado por eles no domingo (13), após a permissão do ministro da Defesa israelense.

“Hebron incorpora as piores características do apartheid, colonialismo e opressão a serem encontradas em toda a Palestina ocupada,” enfatizou Falk, enquanto descrevia a cidade dividida por postos de controle militar, muros, fios de arame farpado e ruas de segregação onde os colonos e os palestinos são separados, apesar de viverem a metros de distância.

Aumento da violência fundamentalista

O relator especial também pontuou que os residentes da maior colônia da região, Kiryat Arba ("Cidade de Arba", um gigante na Bíblia judaica, ou "Cidade dos Quatro" gigantes), com quase oito mil habitantes, estão entre os colonos mais extremistas e ideologicamente motivados em toda a Cisjordânia, o que agravou os inúmeros incidentes de violência dos últimos anos, ressalta o portal do Departamento.

“Além de Kiryat Arba, Falk ressalta, já há várias colônias israelenses pequenas dentro ou próximas à cidade antiga de Hebron que criaram restrições severas e uma atmosfera de tensão contínua que afetam adversamente todos os palestinos,” continua o portal. O relator especial disse que “esta situação inaceitável é agravada pela falta de imposição da lei [aos colonos] pelas forças de segurança israelense. O que já foi um mercado vibrante no centro de Hebron é, agora, uma cidade fantasma.”

Palestinos residentes da região costumam mostrar aos que visitam uma cidade abandonada, lojas seladas pelas tropas israelenses e ruas completamente bloqueadas, o que, junto com o aumento da violência, levou centenas de palestinos a deixarem a cidade. Nem mesmo os incentivos da ONU e outras agências internacionais como o Banco Mundial para a restauração do comércio têm sido suficientes, uma vez que a ocupação militar e a presença dos colonos é uma constante.

“O estabelecimento de colônias na Cisjordânia é uma clara violação do direito internacional e uma contravenção ao artigo 49 da Quarta Convenção de Genebra,” ressalta Falk, mencionando uma conclusão idêntica emitida pelo Tribunal Internacional de Justiça em sua Opinião Consultiva, em 2004.

“Israel precisa tomar medidas para cumprir o direito internacional e assegurar que as tensões – já altas em Hebron – não saiam do controle,” enfatizou o relator especial, que também lembrou a origem de Baruch Goldstein, autor dos disparos que mataram 29 palestinos na Mesquita de Abraão em 1994: a própria colônia Kiryat Arba.

Richard Falk, dos Estados Unidos, é o quinto relator especial sobre a situação dos direitos humanos nos Territórios Palestinos ocupados desde 1967 (a partir de quando, após a Guerra dos Seis Dias, Israel passou a ocupar mais territórios árabes), designado pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU. O mandato foi estabelecido originalmente em 1993, pela então Comissão de Direitos Humanos.