Fagner Sena: O retorno aos clássicos
É controverso dizer que “o capitalismo cria seus próprios coveiros” e que, por vezes, os socialistas sustentam a sua manutenção. Obvio que é uma inverdade. Entretanto, exemplos confirmam a tese.
Por Fagner Sena*
Publicado 01/07/2014 13:00 | Editado 04/03/2020 16:49
Li hoje uma resenha do livro “A Força das Ideias de um Capitalismo Sustentável” de Raymundo Magliano Filho, presidente da Bovespa de 2001 a 2008. Ao que parece são as memórias de uma gestão da maior instituição financeira do Brasil e uma das maiores do mundo que foi responsável pelo aumento de 11 mil para 500 mil pessoas físicas investindo na Bolsa. Ou seja, um verdadeiro processo de popularização da bolsa de valores, aproximando a “sociedade civil” do mercado de capitais.
O mais interessante é que o autor relata que buscou inspiração em filósofos e pensadores do campo da esquerda, especialmente da esquerda marxista. Para Raymundo, em Norberto Bobbio aprendeu a importância de conjugar o capitalismo com aspectos do socialismo. Daí a importância da pessoa física para legitimar o mercado de capitais. Em Gramsci viu que para mudar uma sociedade, ou seja, para que ela percebesse de outra forma o mercado de capitais, era necessário mudar os valores da sociedade. Veio daí a ideia de investir em programas educacionais, aproximar a bolsa de valores de instituições de educação. "Resolvi sair do 10º andar do prédio da Bolsa e fui para a rua, conversar com as pessoas e mostrar como o mercado funciona", salienta o autor.
Segundo o historiador inglês Eric Hobsbawm, a crise econômica de 20072008 promoveu um verdadeiro “retorno a Marx”. Economistas, banqueiros, acadêmicos, fizeram uma profissão de fé às livrarias na Europa, notadamente na Inglaterra, e nos EUA em buscas dos clássicos do marxismo na busca de entender e dar solução ao que parecia o fim do capitalismo.
Se os clássicos são demasiadamente úteis para os que querem manter o capitalismo e aprofundar seu regime de exploração, imaginemos como devem ser úteis para nós, comunistas que, nos marcos do capitalismo, lutamos para a sua suplantação? Nós que participamos plenamente da vida política, econômica e social e nas próprias instituições que reproduzem a lógica do capitalismo o quanto os clássicos podem contribuir.
Como contribuir para mudar os valores de uma sociedade, por exemplo, quando estamos à frente de governos? Como utilizar a força e o prestígio – mesmo que momentâneos, amparado em velhas estruturas – para reformar instituições, leis e etc. no sentido democrático e popular? Como contribuir para a unidade política e social das forças de esquerda em torno de ideias e programas avançados? Como traduzir para cada realidade local as diretrizes do novo projeto nacional de desenvolvimento, inclusive adotando medidas de governo?
* Fagner Sena é secretário de Organização do PCdoB-Contagem