Cine Belas Artes: A esperança para novos cinemas de rua

Com as portas reabertas desde o dia 19 de julho, o Caixa Cine Belas Artes retorna como um dos protagonistas do cenário cultural da capital paulista. Longe de ser apenas um mero espaço de entretenimento, o cinema volta com o desafio de servir de exemplo para a abertura de outros espaços culturais fechados na cidade.

Por Mariana Lima, na Carta Maior

Cine Belas Artes - Moara Crivelente | Portal Vermelho

“O sucesso do Belas Artes está nos fazendo explorar possibilidades de abertura de outros cinemas de rua em São Paulo. Entendemos que esse modelo de parceria onde o parceiro, seja público ou privado, possa fechar a conta existente, reformar o espaço e reabrir ao público um cinema tradicional, pode ser um modelo interessante para cinemas inativos como o Marrocos e o Ipiranga”, disse o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad em coletiva de imprensa.

O processo de reabertura dos cinemas tradicionais da Cinelândia, que permanecem de portas fechadas, está sendo avaliado e negociado no gabinete da Secretaria de Cultura da Prefeitura de São Paulo que foca suas ações na procura de novos parceiros.

Entre as preocupações da prefeitura está o de nivelar os interesses do setor imobiliário que tendem a fechar os espaços culturais para faturar em cima dos imóveis. “Há vários cinemas e teatros que estão fechando porque individualmente não tem capacidade de confrontar com a dinâmica da especulação imobiliária […] Muitas vezes esses estabelecimentos culturais foram um grande instrumento de valorização daquele equipamento. Quando se estabeleceram em áreas degradadas da cidade valorizaram o espaço, mudaram o sentido social daquela área e depois que o valor é agregado eles são expulsos para serem construídas outras atividades econômicas. A gente não pode ter os interesses econômicos do setor imobiliário sem ter o contraponto dos interesses culturais da cidade”, disse o secretário de cultura da cidade, Juca Ferreira.

Novas salas no Belas Artes

Até o fim de agosto duas novas salas, localizadas no subsolo do prédio, serão entregues ao público do Belas Artes, segundo o administrador do cinema André Sturm. A abertura dos espaços garantirá ao cinema um total de seis salas com projeção DCP (Digital Cinema Package) e três delas também terão projetores de película 35mm.

“Logo em Agosto retorna o ‘Noitão’, a maratona que começa à meia noite e segue até às 7 da manhã com três filmes diferentes. Teremos a partir de setembro programação de música às sextas à noite e outras novidades que em breve anunciaremos”, disse Sturm.

Entre as novidades previstas está a inauguração do “Drive-in Riveira” uma parceria com o Belas Artes e o restaurante Rivieira, localizado em frente ao cinema. “A partir de 2015, o espaço do cinema vai oferecer uma experiência nova, misturando cinema e gastronomia. Uma parceria com o Riveira Bar, reaberto recentemente na esquina em frente ao Belas Artes, vai levar para lá o “Drive-in Riveira”, uma sala no térreo com poltronas, sofás e mesas. Será uma sala com três sessões para ir em turma, assistir a filmes comendo e bebendo itens do bar, e não uma espécie de espaço VIP com aqueles assentos que deitam”, adiantou Sturm.

Com o valor de ingresso abaixo dos demais shoppings da Paulista e iniciativas populares de acesso ao cinema, como o Dia do Trabalhador, que garante meia-entrada às segundas-feiras, a aposta de Strum é que o cinema retome o espaço de protagonista no cotidiano dos cinéfilos de São Paulo. “O Caixa Belas Artes tem uma programação diferente com filmes de qualidade, os quais ficam mais tempo em cartaz, fora a exibição de clássicos – então, além do público geral, o cinema, com certeza, atrairá mais cinéfilos, que querem assistir filmes clássicos (muitas vezes até com aqueles risquinhos que trazem um clima especial), mas num ambiente de cinema”.

Foto: Gabi Buchter

Sturm afirma ainda não se sentir pressionado de ter a sua administração à frente do Belas Artes servindo de exemplo aos demais cinemas que permanecem fechados na cidade .“ Não acho [que há pressão]. A prefeitura é parceira em viabilizar a reabertura do cinema. E entendo que o modelo que permitiu essa reabertura, parceria entre um gestor privado, apoio da prefeitura e patrocínio de uma empresa pode servir de exemplo para outras iniciativas”, concluiu.

Mobilização social

Ao todo foram necessárias 100 mil assinaturas para que o Belas Artes retomasse o funcionamento após um ano e seis meses de negociações entre prefeitura, dono do prédio, patrocinadores e antiga administração do cinema. Um grupo de cinéfilos frequentadores do local assumiu as rédeas da linha de frente de batalha pela reabertura, formando o Movimento Cine Belas Artes.

À frente da linha de batalha para a reabertura do cinema estava um grupo de cinéfilos frequentadores do Cine Belas Artes. Por três anos, passeatas, encontros, debates e um abaixo-assinado foram feitos para que o cinema reabrisse as portas criando o movimento.

O coordenador da iniciativa popular, jornalista Alberto Gonçalves, disse que a mobilização prol-cinema vai além do processo de abertura do tradicional cinema na rua da Consolação. “O Movimento Cine Belas Artes, a partir do momento em que foi se amadurecendo, se politizou e começou a elaborar propostas para dar sustentabilidade a uma futura reabertura do local. Entendemos que não basta abrir o cinema, precisa dar sustentabilidade para que ele tenha condições de permanecer aberto”.

Outras iniciativas

Paralelo ao processo de reabertura do Belas Artes, a empresa SP Cine, criada em parceria entre a Prefeitura, o Governo Estadual e a Ancine anunciou que disponibilizará R$ 1 milhão para a distribuição e exibição de 10 filmes produzidos no Estado de São Paulo.

A iniciativa tem como base o levantamento feito pela Secretaria Municipal de Cultura onde foram apontados 50 filmes finalizados que não possuíam espaço no mercado comercial exibidor.

“Uma das salas do novo Cine Belas Artes será a sala SP Cine [Sala Aleijadinho] dedicada ao lançamento de filmes brasileiros, paulistas e focada em programações que viabilizam a colocação dessas obras no mercado”, disse o responsável pela SP Cine, Alfredo Manevy.

CPI Belas Artes

O poder público possui um papel importante na manutenção dos cinemas de São Paulo. É o que defende o vereador que atuou como presidente da CPI Belas Artes, na Câmara Municipal de São Paulo, Eliseu Gabriel (PSB).

Instalada em 14 de abril de 2012, a comissão formada por sete vereadores, tinha como objetivo investigar possíveis irregularidades no processo de tombamento do prédio em que funcionava o Cine Belas Artes. O relatório final da CPI foi entregue apenas oito meses depois do início de trabalho das investigações e concluiu, entre outros fatores, que era necessário requalificar a área urbana próxima ao cinema e declarar de utilidade pública o imóvel em que funciona o Belas Artes.

O vereador, pré-candidato a deputado federal por São Paulo, reafirmou a importância do Movimento Belas Artes para a abertura do cinema, mas disse que temia o esfriamento da pressão social com o passar do tempo. “Se não tivesse acontecido a CPI teria uma boa chance do movimento se esgotar, não ter mais o que fazer e a gente não teria mais mobilização para manter viva a luta. De um lado foi muito importante o movimento Belas Artes, popular e cultural, do outro lado foi importante também a ação da Câmara Legislativa, dos setores do Executivo”.

Eliseu Gabriel é apontado pelo prefeito Haddad como o principal mediador no diálogo entre André Sturm e o proprietário do imóvel do cinema. À época, o vereador atuava como o secretário municipal de Desenvolvimento Trabalho e Empreendedorismo de São Paulo, cargo que deixou em março de 2014.