Governo francês sofre novo revés nas eleições para o Senado

As eleições parciais do Senado da França resultaram outro revés para o presidente François Hollande, que perdeu a maioria na câmara alta e enfrentará novos obstáculos na segunda metade do mandato.

Por Amílcar Morais*

François Hollande

Esse órgão legislativo está composto por 348 membros e a cada três anos renova-se a metade deles por meio de eleições indiretas, onde participam delegados das prefeituras, dos conselhos regionais e de parlamentares, bem como os deputados.

Durante as eleições do 2011 o Partido Socialista (PS), aliado com outras forças de esquerda, conquistou a maioria do senado pela primeira vez na história da denominada 5ª República, iniciada em 1958.

Essa vitória foi considerada como um bom augúrio face às presidenciais do 2012 quando, efetivamente, Hollande derrotou o então presidente e candidato à reeleição, Nicolás Sarkozy, da conservadora União por um Movimento Popular (UMP).

A noite da segunda e definitiva rodada nas urnas uma multidão aclamou ao novo governante em sua natal cidade de Tulle, capital do departamento de Corréze, e a multidão repetiu-se, amplificada, na cidade capital na Praça da Bastilla.

A partir de ali o contato entre o chefe de Estado e a população começou a diluir-se, na medida em que se acumulavam os problemas e as soluções demoravam em chegar.

Entre os temas mais sensíveis figura o constante incremento do desemprego, que rompeu todas as marcas anteriores, e afeta na atualidade perto de 3,4 milhões de pessoas em idade trabalhadora.

Nos dois anos e meio do atual governo só em dois meses, novembro do 2013 e agosto do 2014, teve uma queda temporária na taxa de desemprego.

Enquanto, a economia mal cresceu em três décimos do ponto no ano anterior e nos primeiros seis meses do atual permaneceu estancada.

Além do mais, Hollande em lugar de renegociar o tratado europeu de austeridade, como prometeu durante a campanha, se somou a essa política e aplicou no país os orçamentos mais restritivos desde a Segunda Guerra Mundial.

Isso provocou em março passado, na ocasião das eleições municipais, que o PS sofresse um severo revés e perdesse o governo em umas 155 cidades, passando ao segundo lugar por trás da UMP.

A derrota provocou a renúncia do então premiê, Jean-Marc Ayrault, quem foi substituído por Manuel Valls.

A mudança foi insuficiente para evitar uma nova queda nas eleições ao Parlamento Europeu de maio, quando o partido do governo passou ao terceiro lugar pelo número de cadeiras.

A história repetiu-se no fim de semana nas eleições para senadores, onde a direita recuperou a maioria, depois de um parêntese de três anos.

Este resultado é, por uma parte, uma reprodução automática das eleições municipais, porque a imensa maioria de quem votam pelos senadores são representantes das comunas e, após março, a maioria delas pertencem à UMP.

Por outro lado, é uma mostra do crescente divórcio entre o governo, a população e as autoridades locais e uma prova disso é que o PS perdeu as duas cadeiras em disputa em Corréze, até pouco tempo um feudo incondicional de Hollande.

Na nova configuração do Senado francês, a UMP e seus aliados da União de Democratas Independentes somarão 189 cadeiras, bastante acima da maioria absoluta codificada em 175.

Por sua vez, o PS, os ecologistas e o Partido Comunista Francês somam em conjunto 157 postos, e o extremista Frente Nacional ingressou pela primeira vez neste recinto, com dois representantes.

Em termos concretos este novo revés ocasionará ao governo maiores dificuldades na aprovação de leis, porém não o impedirá por completo.

A diferença de outros países, aqui a última palavra em matéria legislativa é da Assembléia Nacional, mas um Senado com maioria da oposição provocará lacerações e emendas aos textos submetidos a sua consideração.

Uma prova de fogo será a discussão sobre duas iniciativas já em curso, a lei de reforma energética e o orçamento do Estado para o 2015, as quais devem passar pela câmera alta nas próximas semanas.

Ademais, a UMP terá a possibilidade de eleger ao novo presidente para substituir a Jean-Pierre Bell, quem decidiu abandonar seu assento e não se apresentou às eleições.

Segundo a Carta Magna, em caso de ausência imprevista do chefe de Estado, o líder do senado substitui-o até a celebração de novas eleições.

Para além das tarefas parlamentares, esta terceira derrota consecutiva do partido de governo é uma severa advertência para as autoridades face às presidenciais de 2017.

Ainda faltam dois anos e meio para esse encontro com as urnas, mas os tempos de campanha se encurtaram quando o expresidente Sarkozy (2007-2012) anunciou sua volta à política e se postuló para dirigir a UMP quando se celebre o congresso da organização,antes do final do ano.

A volta do dirigente conservador significa uma pressão a mais, que se soma à complexa conjuntura econômica, o abultado desemprego e os baixos níveis de popularidade do presidente e de seu premiê, Manuel Valls.

Nestas circunstâncias, o trajeto até o final do mandato será para Hollande parecido a uma carreira de obstáculos, em procura de soluções a cada vez mais longínquas e esquivas.

*Correspondente da Prensa Latina na França.