Victor Farinelli: Ex-chefe da segurança de Pinochet é preso no Chile

O ex-militar Cristián Labbé, que chegou ao cargo de chefe da segurança pessoal do ex-ditador Augusto Pinochet, foi preso na manhã desta segunda-feira (20) em Santiago. A detenção, ainda que provisória, é considerada simbólica por militantes de direitos humanos, já que ele é conhecido no país como último exemplo de impunidade aos crimes da ditadura.

Por Victor Farinelli, de Santiago para a Opera Mundi

pinochet

Durante as últimas três décadas, o coronel também exerceu intensa atividade política.

A ordem de prisão, determinada pela juíza Marianela Cifuentes, afirma que “as declarações emitidas pelo próprio réu e as testemunhas apresentadas pelo Ministério Público comprovam a participação do então coronel Labbé, na qualidade de autor, no delito de associação ilícita, durante operações da Dina (Departamento Nacional de Informações, um dos serviços secretos de Pinochet) no Quartel de Tejas Verdes, no ano de 1974”. Pela decisão, ele deve ficar preso até o julgamento final do caso, previsto para acontecer em 2015.

O advogado Cristián Espejo, que defende o ex-militar, reagiu com indignação à sentença. “Essa decisão é um atentado à Justiça. O argumento usado para comprovar a suposta associação ilícita é somente o fato do coronel Labbé ter pertencido ao Exército, e algumas declarações, que são contestáveis. Não há um documento, nada concreto que a justifique”, disse. Ele afirma que vai ingressar com um pedido de habeas corpus, que só deverá ser apreciada no final desta semana.

Quem é Cristián Labbé

Cristián Labbé começou carreira como oficial do Exército do Chile em 1963. Quatro anos depois, quando era tenente, foi enviado ao Brasil, já governada pro militares, para um curso na Escola de Educação Física de Exército (Esfex).

Em 1972, já como capitão, foi designado para o Quartel de Tejas Verdes, um setor rural a cerca de 100 km a oeste de Santiago, para comandar operações especiais. Segundo o livro “El Despertar de los Cuervos”, do jornalista Javier Rebolledo, naquele ano o quartel foi usado para experimentos de tortura, e não necessariamente com pessoas ligadas ao governo de Allende. “Podia ser um vagabundo dormindo na praça, qualquer pessoa que não tivesse quem a fosse reivindicar depois, ideal para ser usada num experimento sem gerar nenhuma consequência legal posterior”, conta.

Rebolledo relata que Labbé era figura importante em Tejas Verdes já nos primeiros meses, mas, principalmente, no começo da ditadura. “Quem organizou a tortura em Tejas Verdes foi Manuel Contreras [general que logo seria o primeiro diretor-chefe da Dina], e Labbé era o segundo em mando, e provavelmente ascendeu por seu conhecimento de português, adquirido no seu tempo na Esefex. Grupos de direitos humanos questionam as reais atividades de Labbé no Brasil. Elas devem ser investigadas pela Justiça.

Logo após o golpe de 1973, a ditadura brasileira foi a primeira a oferecer ajuda aos militares chilenos, e vários oficiais estiveram no país andino ensinando técnicas de tortura, começando por Tejas Verdes e o Estádio Nacional, onde opositores de Pinochet foram torturados e mortos.
“Vários dos testemunhos do meu livro asseguram ter ouvido gente falando em português [em Tejas Verdes], inclusive nas sessões de tortura”, conta o jornalista.

Porém, em Tejas Verdes, Labbé era um subalterno. Ele somente surge como figura a nível nacional nos anos 80, quando se tornou membro da Central Nacional de Informações (CNI), órgão criado para substituir a Dina) foi e designado chefe da segurança pessoal de Pinochet. No dia 7 de setembro de 1986, ele liderou a equipe de emergência durante o atentado contra o ditador, quando um veículo oficial foi atacado a tiros pelo grupo armado Frente Patriótica Manuel Rodríguez (FPMR).

O ex-militar também supostamente manteve um caso amoroso com Jacqueline Pinochet, filha mais nova do ditador.

Após a ditadura, Labbé iniciou uma carreira política, que se destacou pelos quatro mandatos consecutivos como prefeito da comuna de Providencia. Sua gestão esteve marcada por polêmicas homenagens realizadas a militares chilenos presos por crimes de direitos humanos, como Manuel Contreras (em 2007) e Miguel Krassnoff (em 2011). Em 2012, na corrida pelo quinto mandato, perdeu o pleito para a atual prefeita, Josefa Errázuriz, em campanha que se caracterizou pela maneira como ele a menosprezava, chamando-a reiteradas vezes de “dona de casa” e “aventureira”.

O partido União Democrata Independente (UDI), onde Cristián Labbé militou depois da ditadura, emitiu declaração na qual evitou defender o ex-prefeito, e apenas enviou um “apoio humano” a ele e à família.