“Há espaço para aumentar comércio entre Rússia e América Latina”

Sanções impostas por Europa e EUA estimulam Rússia a buscar aliados na América Latina. Recentemente, os volumes de comércio, investimento e cooperação militar com países latino-americanos aumentaram consideravelmente. Em entrevista à Gazeta Russa, Jose Miguel Insulza, o secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), falou sobre as perspectivas da Rússia na região.

Por Tatiana Rublióva, especial para Gazeta Russa

“Há espaço para aumentar comércio entre a Rússia e a América Latina” - Reuters

Como o senhor avalia o estado atual das relações entre a Rússia e a OEA?

A Rússia assume papel de observador na OEA – e de forma bastante ativa. Temos boas relações e, embora a OEA promova principalmente as relações multilaterais, e não bilaterais, servimos como uma ponte, que ajuda os membros a se manterem bem informados sobre tudo o que acontece nas Américas.

Quais são os caminhos mais promissores na colaboração entre a Rússia e a América Latina?

A América Latina continua a exportar um monte de mercadorias que a Rússia, obviamente, não precisa comprar de nós. No entanto, ainda há espaço para melhorar significativamente o comércio entre a Rússia e os países latino-americanos. Sempre existiu troca comercial no setor agrícola; há também indústrias de transformação bem desenvolvidas no Brasil, no México, na Argentina e no Chile. Os intercâmbios culturais, que durante os tempos soviéticos eram especialmente fortes, estão agora ganhando fôlego novamente.

Qual é o maior concorrente da Rússia nesse mercado?

A China é, naturalmente, um grande comprador, embora isso dependa da região. No caso da América do Sul, apesar de a China exportar uma grande quantidade de manufaturados para lá, importa muito mais em termos de matérias-primas e produtos agrícolas. Na América Central e no México, há provavelmente mais rivalidade, mas isso se refere em grande parte à concorrência entre os produtos locais destinados ao mercado norte-americano.

Se a Rússia entrar com tudo na América Latina, não acho que vá enfrentar uma concorrência muito acirrada. O exemplo chinês, no entanto, mostra quão grandes podem ser as possibilidades no mercado latino-americano. O presidente chinês Xi Jinping anunciou um grande investimento na região, em torno de US$ 250 bilhões ao longo dos próximos dez anos, ou US$ 25 bilhões ao ano. Realmente espero que isso aconteça, mas não há motivo de preocupação – as oportunidades de desenvolvimento na América Latina são enormes.

Como o renascimento dos laços diplomáticos entre os EUA e Cuba pode afetar a situação geopolítica na América Latina?

Essa questão vai, de fato, mudar um pouco a situação geopolítica na região, já que a barreira artificial que deveria ter sido derrubada há muito tempo desaparecerá. Isso aumenta as possibilidades de viagens, trocas comerciais, operações financeiras e atividade cultural. Acredito que Cuba vá mudar o escopo de suas relações diplomáticas.

O senhor acredita que os países latino-americanos vão começar a adotar uma postura mais positiva em relação aos EUA?

Os países latino-americanos estão convencidos de que os EUA é o seu principal parceiro, e todos têm esperança de melhorar as relações comerciais com o país. Claro que existem algumas exceções – uma delas é a Venezuela. No entanto, 90% das suas exportações são de petróleo, e eles têm um acordo comercial muito favorável com os EUA, que lhes permite vender a quantidade de petróleo que quiserem.

Acho natural que a América Latina, que cresceu bastante na última década, esteja mais aberta para os negócios e para o mundo do que nunca. Mas isso não tem que ferir o seu principal parceiro, os EUA – que continua a ser o líder regional em trocas comerciais e investimento.

A América Latina pode se tornar uma região em que Rússia e EUA competirão por influência, assim como acontecia na Guerra Fria?

Não creio que isso possa acontecer. A necessidade de diálogo entre o Ocidente e a Rússia é essencial – há poucas alternativas. Mas, se o diálogo não for para frente, a maioria dos problemas ocorrerão na região euroasiática, e não na América Latina.