Opinião: O Brasil e o restabelecimento da diplomacia entre Cuba e EUA

Por *Paulo Sérgio Cordeiro

Pergunto se este fato do qual temos notícias pela mídia é ou não um fato histórico isolado? Claro que poucos de nós esperávamos pelo reatamento das relações diplomáticas entre Cuba e Estados Unidos. A atitude, louvada pela imprensa internacional como o grande fato político do Século do Conhecimento, é usual e estratégica do governo brasileiro, principalmente nos últimos 12 anos. Vamos aqui admitir o desencanto americano com a maior ilha da América Central, que fora tomada em revolução liderada pelos irmãos Fidel e Raul Castro ladeados por Che Guevara, no final da década de 1950. O feito tomou o poder central das mãos do general Fulgêncio Batista, um cubano quase adido militar da América do Norte.

Resgatando um pouco da História cubana, o general Fulgêncio era um ditador nascido na Ilha, aliado dos Estados Unidos segundo relatórios da própria embaixada americana em Havana, entre 1933 e 1958, período em que exerceu sua tirania em alternadas fases. Fulgêncio ordenou a execução sumaria de todos os adversários políticos por enforcamento ou assassinatos com disparos na nuca, tudo em via pública. O destempero do ditador também fez entre 1952 e 1953 o PIB (Produto Interno Bruto) cubano cair 11,41%. Esta era a Cuba encontrada em 1º de janeiro de 1959 pela Revolução na qual 300 homens venceram 20 mil e provocou a fuga do sanguinário gerneral para a República Dominicana. A partir de então o principal parceiro cubano passava a ser a ex-União Soviética que, dissolvida em 1991, impôs ao regime de Castro mergulhar em uma profunda crise econômica agravada pelos os bloqueios comerciais impostos pelos vizinhos norte-americanos, o que já ocorria desde 1961, consequência do rompimento das relações diplomáticas entre os dois países.

O fato de há 53 anos foi provocado pela nacionalização de todas as empresas e terras norte-americanas em Cuba e a negação do governo de Fidel de refinar petróleo para a Texaco e outras distribuidoras do “Tio San”. O “Paredon”, que era a execução de inimigos políticos depois de julgamento por tribunais populares foi menos relevante para a decisão do presidente dos EUA, John Kennedy. O que pesou mesmo foi a nacionalização do capital estrangeiro. Antes disto, os Estados Unidos chegavam a investir até US$1 bilhão em negócios na ilha.

Pois bem. A prática adotada pelas diplomacias norte-americana e cubana, em 17 de dezembro último, visa estreitar as relações comerciais e políticas entre as duas nações. Sem querer rasgar sedas ao Brasil, nosso país fez a política externa certa sem necessitar da benéfica influência do Papa Francisco. As críticas feitas pela mídia amestrada e seguida por consumidores da agenda setting capitalista, de que a nossa relação com Cuba era clara demonstração de que estaríamos fadados a viver a crise cubana em nossa economia, de que os dirigentes cubanos seriam humanos inconfiáveis e sanguinários, começam a cair no vazio.

O que dizer então do investimento de US$ 957 milhões feito no Porto Cubano de Mariel pelo governo brasileiro, via Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, por meio da construtora Odebrecht? Para especialistas e para a maioria dos que fazem a Federação das Indústrias de São Paulo – FIESP, a estratégia antecipou, acertadamente, o fim do isolamento com os Estados Unidos e configura-se em medida acertada no fortalecimento das relações comerciais nossas com o povo cubano, o que, reforço, não são de agora. Segundo afirmou o professor de Relações Institucionais da Fundação Getúlio Vargas, Oliver Stuenkel à Carta Capital "o Porto de Mariel é visto como uma maneira de o Brasil antecipar-se aos investidores americanos". A presidenta Dilma, por sua vez, em entrevista durante sua posse na presidência do Mercosul, mostrou-se “feliz com o acordo entre os Estados Unidos e Cuba porque toda a política do governo brasileiro até agora tem sido enfatizar, e não só do ponto de vista retórico, mas com ações concretas, a forma pela qual Cuba tem de ser integrada”. Disse ainda que “algo que foi tão criticado durante a campanha, o porto de Mariel, mostra hoje mesmo a sua importância para toda a região. E para o Brasil principalmente na medida em que hoje o porto é estratégico pela sua proximidade com os Estados Unidos".

Por fim, considerando as diferenças das histórias de Brasil e Estados Unidos com Cuba, o fato histórico operado por Barack Obama e Raul Castro, na mesa do Papa Francisco, foi antecipado por outro fato histórico que somente ganhou notoriedade durante a campanha presidencial nas críticas da oposição à então candidata à reeleição Dilma Roussef. Considerando as competências das diplomacias cubana e estadunidense, a ida de capital pesado do Brasil para a construção de Mariel não deixou outra opção aos capitalistas centrais senão irem também encontrar as águas quentes e cristalinas e os inigualáveis recifes e enseadas da natureza que privilegia o país que, segundo relatório do Fundo Mundial para a vida Selvagem-WWF, é o único do Mundo que pode declarar-se defensor de uma vida sustentável.

*Paulo Sérgio Cordeiro é jornalista.

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