Religiosos mobilizam para retirada de pontos avançados do PME

Grupos religiosos estão em uma cruzada nas câmaras municipais brasileiras para evitar que as questões relacionadas à formação da sexualidade e identidade de gênero passem a fazer parte dos planos municipais de educação (PME), o conjunto de metas que as prefeituras terão que adotar pelos próximos dez anos e que estão sendo votadas em vários pontos do país neste ano.

Gênero

Na capital paulista, na manhã do dia 10 de junho, dezenas de pessoas se aglomeravam em frente à porta de uma das salas de audiência da Câmara de Vereadores de São Paulo, na esperança de entrar ao plenário, já ocupado em sua capacidade máxima. Representantes de grupos cristãos, munidos de bíblias, terços e crucifixos, misturavam-se, disputando espaço, com ativistas pelos direitos das mulheres e da comunidade de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transgêneros (LGBTT), vestidos de violeta, com bandeiras coloridas e cartazes nas mãos. 

No plenário, prevaleceu a polarização entre os dois grupos que, de tempos em tempos, interrompiam a fala dos vereadores e, entre as exposições, gritando palavras de ordem. Em pauta, a discussão da Comissão de Finanças e Orçamento sobre o Plano Municipal de Educação de São Paulo, já em sua terceira audiência. O debate sobre o financiamento da educação paulistana, porém, foi coadjuvante.

Fortaleza

Após três sessões seguidas que terminaram no começo da noite desta terça-feira (23), a Câmara Municipal de Fortaleza aprovou o Plano Municipal de Educação, mas com modificações que geraram polêmica entre vereadores da chamada bancada religiosa e defensores dos direitos da população LGBTT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais). Por 25 votos a 10, os vereadores aprovaram um recurso liberando duas emendas que modificam o texto original do plano.

A primeira emenda aprovada mudou parte do Artigo 4º do texto original, trocando os termos “diversidade” e “respeito à diversidade” por “contra o preconceito” e “difusão do princípio da equidade”. A segunda, trata-se de uma emenda que retirou do plano quatro metas que propunham incluir na formação continuada dos professores “conteúdos que contribuam para a pacificação de diálogos, a superação de preconceitos, discriminações, violências sexistas e homofóbicas no ambiente escolar” e criar “diretrizes para o ensino público e privado no reconhecimento positivo e respeito à identidade de gênero.”

Na galeria da Câmara, as pessoas que acompanhavam as sessões também se dividiam entre apoiadores das mudanças na proposta do Plano Municipal de Educação e defensores da manutenção do texto com os pontos que tratam sobre diversidade sexual e combate à homofobia. De um lado placas que diziam: “Menino já nasce menino” e “Ideologia de gênero não”. De outro, faixas reivindicando “Pela diversidade na educação, da creche ao ensino superior” e “Em defesa da igualdade de gênero e da diversidade sexual: por uma educação laica”.

Porto Alegre 

Marcada nesta quarta-feira quarta-feira (24) na Câmara de Vereadores de Porto Alegre, a votação do Plano Municipal de Educação (PME) levantou uma polêmica. A última das metas descritas no documento, que traça estratégias para os próximos 10 anos, trata das políticas curriculares para combater o preconceito e garantir o direito à diversidade de gênero. Questão que não agrada à Igreja Católica.

Por meio de uma carta do arcebispo metropolitano, Dom Jaime Spengler, a Arquidiocese de Porto Alegre sugere que, com o intuito de superar discriminações, desconsiderem-se as diferenças. Nesse sentido, o texto diz que “o respeito às minorias não pode impor a todo o custo a desconstrução de valores consagrados no âmbito familiar” e que a “ideologia de gênero representa uma distorção completa ao conceito de homem e mulher”.

Campo Grande 

Com prazo no limite e risco de perder recurso, o Plano Municipal de Educação deve enfrentar nova polêmica na Câmara Municipal de Campo Grande. Movimentos religiosos pressionam vereadores a vetar pontos do projeto voltados à promoção de políticas públicas de diversidade de gênero nas escolas.

O presidente da Comissão Permanente de Legislação, Justiça e Redação Final, Airton Saraiva, confirmou que católicos e evangélicos solicitam a retirada de pontos polêmicos que incluem avaliar e estimular a confecção de cartilhas sobre diversidade, orientação sexual e identidade de gênero.

Defesa da meta 27

O Coletivo Feminista Maria Maria, em conjunto com outros grupos ligados aos movimentos de defesa da mulher e da comunidade LGBT, divulgou carta de apoio à permanência da meta 27 que trata da diversidade sexual e de gênero no PME.

“Entendemos que a exclusão da temática de gênero e da diversidade sexual na educação se mostra absolutamente problemática e nociva à formação das cidadãs e cidadãos, onde o machismo, a homofobia, a transfobia, lesbofobia e a intolerância remetem diretamente à violência – seja ela simbólica ou física – dentro e fora das escolas”, diz o texto da carta.

De acordo com a carta, nos últimos 20 anos o ensino foi massificado, a escola se tornou um espaço de todos e como tal tem obrigação de tratar de temas “mais mundanos que possam ultrapassar as realidades artificiais e preparar seus alunos e alunas para a vida real”. Dessa forma, eles serão preparados para o mundo.

O grupo afirma que a escola não pode e não deve reproduzir “a desigualdade, o machismo, a homofobia, a transfobia, a lesbofobia, o racismo, nem tão pouco abusar do seu poder não podendo ser cooptada por aqueles que querem manter o status quo”. A escola não deve expressar dogmas religiosas e preconceitos e sim respeitar a diversidade existente na sala de aula.