Papa Francisco: Perdão aos indígenas e capitalismo como ditadura

Antes de partir em direção ao Paraguai, última etapa da viagem à América Latina, o papa Francisco esteve na Bolívia reunido com cerca de 1.500 representantes de movimentos sociais de mais de 40 países. O pontífice fez na sexta-feira (10) um discurso contra o sistema capitalista, o qual chamou de “ditadura sutil”, e pediu desculpas pelos crimes da Igreja contra indígenas na região. 

Papa Francisco e Evo Morales

No segundo Encontro Mundial de Movimentos Sociais, Francisco, após ouvir, por quase uma hora, depoimentos de grupos de excluídos (indígenas, catadores de papel, trabalhadores precários do mundo rural e das periferias das cidades), afirmou que eles “têm um papel essencial, não apenas exigindo e reclamando, mas fundamentalmente criando".

"Vós sois poetas sociais: criadores de trabalho, construtores de casas, produtores de alimentos, sobretudo para os descartados pelo mercado global", disse Francisco.

Com o tema “terra, teto e trabalho”, papa reconheceu “que as coisas não andam bem num mundo onde há tantos camponeses sem terra, tantas famílias sem teto, tantos trabalhadores sem direitos, tantas pessoas feridas na sua dignidade”.

Para o líder da Igreja Católica, o atual sistema global “que impôs a lógica do lucro a todo o custo, sem pensar na exclusão social nem na destruição da natureza (…) é insuportável: não o suportam os camponeses, não o suportam os trabalhadores, não o suportam as comunidades, não o suportam os povos…. E nem sequer o suporta a Terra, a irmã Mãe Terra, como dizia São Francisco”.

“Quando o capital se converte em ídolo e dirige as opções dos seres humanos, quando a avidez pelo dinheiro tutela todo o sistema socioeconômico, arruína a sociedade, condena o homem, transforma-o em escravo, destrói a fraternidade inter-humana, coloca povo contra povo e, como vemos, até põe em risco esta nossa casa comum”, disse o sacerdote.

Francisco considerou ainda que atual sistema é uma “ditadura sutil” e chamou os mais pobres e excluídos à ação: “vós, os mais humildes, os explorados, os pobres e excluídos, podeis e fazeis muito. Atrevo-me a dizer que o futuro da humanidade está, em grande medida, nas vossas mãos, na vossa capacidade de vos organizar e promover alternativas criativas na busca diária dos ‘3 T’ (trabalho, teto, terra), e também na vossa participação como protagonistas nos grandes processos de mudança nacionais, regionais e mundiais. Não se acanhem!”.

O papa propôs aos movimentos sociais três tarefas:

• Colocar a economia a serviço dos povos: “Esta economia é não apenas desejável e necessária, mas também possível. Não é uma utopia, nem uma fantasia. É uma perspectiva extremamente realista. Podemos consegui-la”;

• Unir os nossos povos no caminho da paz e da justiça: nenhum poder efetivamente constituído tem direito de privar os países pobres do pleno exercício da sua soberania e, quando o fazem, vemos novas formas de colonialismo que afetam seriamente as possibilidades de paz e justiça;

• Defender a Mãe Terra: “a casa comum de todos nós está sendo saqueada, devastada, vexada impunemente. A covardia em defendê-la é um pecado grave. Vemos, com crescente decepção, sucederem-se uma após outra cúpulas internacionais sem qualquer resultado importante.
 

“Digamos juntos do fundo do coração: nenhuma família sem teto, nenhum camponês sem-terra, nenhum trabalhador sem direitos, nenhum povo sem soberania, nenhuma pessoa sem dignidade, nenhuma criança sem infância, nenhum jovem sem possibilidades, nenhum idoso sem uma veneranda velhice. Continuai com a vossa luta e, por favor, cuidai bem da Mãe Terra”, concluiu.

Desculpas ao indígenas

No país onde mais da metade da população se autodeclara indígena, Francisco pediu desculpas pelos crimes cometidos pela Igreja. “Eu quero dizer-vos, quero ser muito claro, como foi São João Paulo II: Peço humildemente perdão, não só para as ofensas da própria Igreja, mas também para os crimes contra os povos nativos durante a chamada conquista da América”.

Com agências