Publicado 30/11/2015 12:08 | Editado 04/03/2020 17:16
Um senador da republica foi preso “em flagrante” por ordem do STF e o plenário do Senado covardemente manteve a prisão. Não que o tal senador não mereça ser banido da vida pública, processado e eventualmente preso, mas isso deve ocorrer nos termos da lei e não “por que o STF quer”. Não vou nem discutir se a circunstância que o levou à prisão do parlamentar seria de flagrante ou não, qualquer estudante de direito sabe que na prisão em flagrante não há sequer expedição de mandado de prisão, seria um paradoxo, para dizer pouco.
Relembremos outro fato e comparemos os desdobramentos. Recentemente ocorreu uma reunião entre o Presidente da Câmara dos Deputados, do Ministro do STF Gilmar Mendes e do Deputado Paulinho da Força, cuja pauta foi: (i) o impeachment da presidente da república, (ii) a votação de suas contas eleitorais no Tribunal Superior Eleitoral e (iii) as contas então pendentes de decisão no Tribunal de Contas da União. Um verdadeiro flagrante (no conceito do próprio STF) do golpismo e da conspiração, mas ninguém foi preso, talvez porque não houvesse um petista presente…
Esse fato é exemplo da verdadeira esculhambação dos valores republicanos e, por favor, não me censurem pelo uso do substantivo feminino “esculhambação”, pois ele representa precisamente a natureza daquela reunião.
E essa esculhambação dos valores republicanos ocorreu no padrão contemporâneo de fazer política, com “pê” minúsculo, usando a mídia para dar contornos de fato positivo, negativo ou naturalidade, conforme a conveniência. Tanto que a manchete do jornal da família Frias foi reveladora “Cunha discute impeachment com ministro do Supremo.”.
Por esse fato deveria Eduardo Cunha ser preso em flagrante também, juntamente com Gilmar Mendes e o Deputado Paulinho? Pela regra de que “pau que bate em Chico, bate em Francisco” sim, mas os ontem indignados Ministros do STF receberam a manchete da FOLHA com naturalidade, donde se conclui que o verniz civilizado e civilizatório rompe-se com facilidade em nossa sociedade quando interesses são contrariados, basta observarmos o que está acontecendo hoje no país, onde o moralismo publicado [esconde] interesses impublicáveis.
O conteúdo das conversas gravadas e amplamente divulgadas, ocorridas entre um senador da republica, um advogado e o filho de um corrupto condenado merecem punição exemplar, assim como mereceria punição a conspiração relembrada acima, pois a nação que desejamos para nossos filhos e netos é uma nação de ações honradas, comprometidas com o desenvolvimento social, econômico e com uma cultura de paz.
Mas em tempos de odiosa ditadura do poder judiciário um senador, que não poderia ser preso, exceto em situação flagrante de crime inafiançável, conforme estabelece o artigo 53, parágrafo 2º, da Constituição federal, essa é a regra, está preso, e o Senado da República, casa dos decanos, colocou-se de joelhos covardemente.
Tratar-se-ia de novo arranjo institucional, necessário às peculiaridades de um tempo de enorme tensão institucional? Os arranjos institucionais não se fazem no Poder Judiciário e, a meu juízo, a prisão do senador Delcídio do Amaral representa o fim da dissimulação do verdadeiro Estado de exceção que estamos vivendo, com odioso apoio da mídia, com silêncio perturbador do Legislativo e do Executivo. Fato é que, com base nessa hipótese constitucional citada podemos afirmar que o STF não apenas inovou, mas exacerbou seus poderes e o Senado covardemente calou-se.
Mas o que esperar de um Judiciário que inexplicavelmente mantem soltas a mulher e a filha de Eduardo Cunha (que é advogada do BTG Pactual), as quais sequer possuem qualquer imunidade parlamentar? Talvez mais esse fato demonstre que “Lava Jato” parece empenhada em combater a corrupção apenas quando os envolvidos pertencem ao PT, distanciando-se do que desejamos de fato que é o combate aos corruptos e corruptores independentemente de partidos, o necessário combate ao não menos odioso patrimonialismo, erva daninha do nosso país.
Pedro Benedito Maciel Neto é advogado e escritor.