Aécio Neves da Cunha, legítimo herdeiro da UDN

                                                                                            por Pedro Benedito Maciel Neto

“O Sr. Getúlio Vargas senador, não deve ser candidato à presidência.
Candidato, não deve ser eleito.
Eleito, não deve tomar posse.
Empossado, devemos recorrer à revolução para impedi-lo de governar.
(Carlos Lacerda, no jornal Tribuna da Imprensa)

Tenho me referido de maneira recorrente os “herdeiros da UDN” como sendo aqueles que buscam apear a presidente da republica, com ou sem fundamento. Outro dia eu estava falando sobre o tema impeachment a um grupo de alunos de um curso de graduação em Direito e um dos jovens presentes, muito polido, me interrompeu e perguntou: “quem são os tais herdeiros da UDN aos quais você se refere”?

Percebi que a pergunta merecia atenção e me socorri da História.

A UDN é a sigla de um partido político e significa União Democrática Nacional. Esse partido foi criado em 1945 e extinto em 1965. Surgiu como uma frente; o grupo foi arregimentado por políticos e cidadãos, sem uma agenda política específica. A causa primeira e fundamental dos udenistas era fazer oposição ao regime do Estado Novo de Getulio Vargas e toda e qualquer doutrina originária de seu governo. Mas podemos afirma que para uma UDN ortodoxa o fundamental era um alinhamento político e ideológico incondicional com os Estados Unidos.

Os ideólogos da UDN defendiam o capital estrangeiro de forma até constrangedora, como faz o Senador da Mooca José Serra, e se opunham de forma intensa ao monopólio do capital estatal no desenvolvimento de uma política industrial, principalmente no que relacionou a área dos recursos naturais, como foi o caso da implantação de uma política industrial de petróleo na Era Vargas.

Desde sua fundação a UDN perdeu três eleições presidenciais consecutivas (1945, 1950 e 1955, respectivamente), ganhou eleição de 1960 ao apoiar Jânio Quadros, com quem rompeu antes da renuncia deste. A UDN tem em seu currículo a morte de Getulio o apoio ao golpe civil-militar de 1964 e o seu método era atacar incansavelmente a honra de seus adversários.

Fato é que durante sua existência a UDN sustentou-se numa ideia liberal conservadora, flertou com o autoritarismo em vários momentos, mas paradoxalmente a UDN e ficou marcada pela ligação com os militares sempre prontos ao golpe, refletia e influenciava o pensamento da classe média urbana da época, defendia o liberalismo clássico, com forte apego ao moralismo, sendo à época o mais conservador dos três partidos existentes. A UDN defendia o interesse dos proprietários de terra e da indústria ligada ao capital estrangeiro, adotando dessa maneira uma plataforma elitista, uma visão distante dos interesses nacionais, do empresariado nacional e da população.

A UDN na política nacional não tinha plataforma própria, o Brasil não era objeto de atenção e reflexão de seus lideres, bastava a eles a oposição sistemática a Getúlio Vargas, em especial quanto à política social e a intervenção estatal da economia; denunciar a corrupção administrativa, com o fim de atingir a aliança governista PTB-OS apresentar-se como um grupo do anticomunismo radical.

Como todos os demais partidos da época, em 1965, através do Ato Institucional número 2, a UDN foi extinta, mas seguiu viva na ARENA, o partido que dava suporte ao Regime Militar no Congresso Nacional.

Mas voltemos ao período que antecedeu a eleição de Getulio Vargas. Quando da aproximação do pleito presidencial de 1950, havia uma grande movimentação na UDN contra a candidatura do então Senador Getulio Vargas. Ocorriam ataques virulentos, quotidianamente, do jornalista Carlos Lacerda contra Vargas, nos estilo Revista VEJA em relação a Dilma Rousseff hoje.

E Carlos Lacerda se tornou, dentro da UDN e fora dela, a encarnação militante do antigetulismo, nada poupando a figura de Getúlio Vargas, a quem se referia em termos bem distantes da tradicional elegância dos bacharéis udenistas.

Através do jornal Tribuna da Imprensa Carlos Lacerda atacava Getulio e o ameaçava com uma Guerra Civil iminente caso este fosse reeleito: “Uma vitória do Sr. Getúlio Vargas seria […] a divisão do Brasil em duas partes: a parte dos que aclamariam a volta da traição, até que se desenganassem tardiamente, e a parte, também numerosa, dos que não se conformariam com essa situação – e iriam às armas, e impediriam pelas armas se necessário, a volta do Sr. Getúlio Vargas ao poder..”.

Getulio Vargas venceu as eleições em 1954, mas a UDN questionou na Justiça Eleitoral, como fez Aécio Neves da Cunha sessenta anos depois…

E UDN durante todo o governo democrático de Getulio impôs a ele calunias e injurias, até que em 1954 Vargas suicidou-se pelas razões apostas na sua carta-testamento, um dos mais importantes documentos da nossa História. Com esse ato Getulio mudou totalmente o rumo de sua trajetória na história do Brasil e do próprio país.

E a UDN – derrotada por Getulio em 1950 e 1954 – continuou sendo derrotada… Foi derrotada por JK em 1955, mas não deu tréguas nem a ele nem a Jango e apoiou o golpe civil-militar de 1964. Hoje os herdeiros da UDN buscam apear da presidência Dilma Rousseff, desde que ela foi eleita em 2014, pouco importa a razão, o fundamento ou a falta deles… Afinal perderam em 2002, 2006, 2010 e 2014… A eles pouco importa a vontade popular, são patrimonialistas em essência, aristocratas em estrutura e a verdade não lhes importa.

O udenista Carlos Lacerda, como todo bom udenista e seus herdeiros de hoje em dia poucos meses antes das eleições defendia a quebra das regras do jogo constitucional e sentenciava: “O Sr. Getúlio Vargas senador, não deve ser candidato à presidência. Candidato, não deve ser eleito. Eleito, não deve tomar posse. Empossado, devemos recorrer à revolução para impedi-lo de governar.”. Essa frase de Carlos Lacerda da UDN vem sendo repetida e praticada às escancaras por Aécio Neves da Cunha seus herdeiros, tanto do setor público, como do setor privado, num tempo que não se sabe mais quem serve a quem… Saber perder é para pessoas honradas. Falta honradez a Aécio Neves da Cunha. Lula, Serra e Alckmin souberem perder. Já o "eterno neto" não soube e não sabe… E revela que “o fruto não cai longe do pé”, pois é muito mais filho do udenista Aécio Cunha (deputado do período de 1963 a 1979 pela ARENA e de 1983 a 1987 pelo PDS, ambos partidos de apoio ao regime militar), do que neto do moderado Tancredo…

Os herdeiros da UND são todos que defendem a quebra das regras do jogo constitucional e propõe uma ruptura institucional e mais uma fissura na nossa democracia por razões que apenas a ausência de virtudes pode explicar.

Pedro Benedito Maciel Neto é advogado e escritor