Geopolítica, Fascismo verde e amarelo e golpe de Estado

 

Sérgio Negri

 Muito enganados estão aqueles que acreditam que grandes protestos de rua são, necessariamente, 

 
sinônimos de democracia ou de avanço para os trabalhadores. Nem sempre é assim! Ao contrário, nos 
 
últimos anos grandes manifestações de rua estão ligadas a retrocessos igualmente gigantescos. 
 
Recordemos da chamada “Primavera Árabe” em países do norte da África – Egito, Líbia, Síria e 
 
Tunísia – por exemplo. Com exceção deste último, onde uma coalizão tem mantido um Estado 
 
relativamente democrático, nos demais se viu a instalação ou volta ao poder de ditaduras teocentristas 
 
e guerras civis com a dissolução total de alguns Estados, como no caso líbio.
 
Na Grécia e na Espanha, em 2011, grandes protestos de grupos de extrema esquerda “contra tudo que 
 
está aí” resultaram em vitórias de governos ultradireitistas e neoliberais que levaram esses países à 
 
bancarrota (1). Em 2013, na Ucrânia, grandes manifestações conduzidas pela extrema direita 
 
resultaram num golpe de Estado que destituiu um presidente eleito democraticamente.  O novo 
 
governo, presidido por um magnata aliado a grupos neonazistas, aterroriza segmentos da população 
 
com facções paramilitares, ao mesmo tempo em que funciona como um títere contra a Rússia a serviço 
 
da OTAN, sob o comando americano. Esse governo reacionário é diretamente responsável pelos 
 
conflitos armados e consequente aumento da miséria, com mais de 1,5 milhões de ucranianos famintos 
 
(2).
 
Em comum, entre os exemplos citados, temos a presença mais ou menos explícita dos EUA nestas 
 
“revoluções democráticas” (3). Seja por meio de seu Departamento de Estado ou da CIA, seja por 
 
meio de suas embaixadas ou fundações, financiam grupos opositores reacionários com dinheiro, 
 
incluindo o fornecimento de armas, logística, e também mercenários para o trabalho sujo de atentados, 
 
assassinatos e torturas.
 
No novo arranjo geopolítico mundial, os EUA tentam isolar a Rússia, a China e, em certa medida 
 
também a Índia, principais países membros do BRICs, grupo também composto pela África do Sul e 
 
Brasil. Neste contexto é fundamental o controle do Oriente Médio, Ásia e Leste Europeu. Daí o 
 
treinamento e financiamento de grupos terroristas na Síria, por exemplo, ou o cerco à Coréia do Norte. 
 
Lógico que o petróleo também continua sendo um motivo primordial. Tudo isso com cobertura da 
 
mídia, idolatrando a política americana, ao tempo em que sataniza os países sob sua agressão.
 
Na América Latina, os regimes neoliberais que substituíram as ditaduras civil-militares do continente, 
 
sobretudo, na década de 90, foram todos derrotados por projetos progressistas de cunho 
 
neodesenvolvimentistas e nacionalistas na tentativa de recuperar a soberania destes Estados Nacionais, 
 
incluindo a integração latino-americana. Em pouco mais de uma década, Venezuela, Argentina, 
 
Equador, Bolívia, Uruguai e Brasil, apresentaram grandes transformações econômicas, sociais e 
 
políticas. Houve o fortalecimento da democracia, com eleições livres e ampla participação popular, 
 
integração entre os países, incluindo a formação e/ou fortalecimento de blocos regionais, como 
 
MERCOSUL, UNASUL e CELAC, além de inédita distribuição de renda, geração de empregos, com 
 
diminuição da miséria e erradicação da fome. Nesse processo, o Brasil foi alçado à condição de 
 
potência mundial, sobretudo após a descoberta do Pré-Sal pela Petrobrás e de sua adesão ao BRICs 
 
(4).
 
Como esperado, esse processo inédito de avanço latino-americano não passaria incólume. O 
 
imperialismo norte-americano, incluindo os abutres de Wall Street, não suportaria a ideia de uma 
 
América Latina independente, progressista e integrada. Sua soberania não poderia ser solidificada 
 
nestes tempos de globalização. Assim, desde sempre a mídia nativa hegemônica, aliada às elites 
 
conservadoras e ao capital financeiro internacional, lançou todas as armas, para primeiro tentar 
 
impedir a eleição de líderes progressistas. Na sequência atuou e atua cotidianamente para desqualificar 
 
e derrubar essa nova configuração geopolítica regional.
 
Nesse contexto, os EUA estão avançando no desmantelamento dessa nova ordem regional, iniciada 
 
por Chávez em 1998. Na própria Venezuela, a direita conservadora e antinacional ganhou a maioria do 
 
Parlamento, enquanto na Argentina, o poder executivo foi ocupado por neoliberais a serviço de 
 
Washington. Além destes, Equador e Bolívia também estão sofrendo com as tentativas de 
 
desestabilização política (5). 
 
No Brasil, o projeto de cunho trabalhista e neodesenvolvimentista, iniciado em 2003 encontra-se 
 
seriamente ameaçado pelo consórcio jurídico-midiático-parlamentar. Sob o manto de uma narrativa 
 
moral-hipócrita conservadora, as forças reacionárias ampliaram sua ofensiva um dia após o pleito 
 
eleitoral de 2014, na tentativa de inviabilizar o novo mandato da Presidenta Dilma, fenômeno que se 
 
acirrou com a tentativa de impedimento da mandatária do executivo nacional hora em curso. Ao 
 
“estilo paraguaio”, um golpe de Estado caminha a passos largos no Brasil; nada de tanques, 
 
metralhadoras e baionetas, modernamente, o também chamado “golpe branco” é uma atualização que 
 
dispensa militares para a mesma finalidade: golpear a vontade popular, destituindo governantes eleitos 
 
e substituindo-os por vassalos a serviço de Washington!
 
Também importa ressaltar nesse conluio do caso brasileiro o papel de grupos neofascistas como MBL 
 
(Movimento Brasil Livre), Vem Pra Rua e Revoltados Online, que financiados por grupos 
 
estadunidenses (6), somam-se ao consórcio já citado. Esses grupos tem seu DNA vinculado às 
 
chamadas “Jornadas de Junho”, gigantescas passeatas inicialmente convocadas pela extrema esquerda, 
 
sob o comando do grupo estudantil “Passe Livre”, que reivindicava melhorias na mobilidade urbana e 
 
gratuidade dos transportes em São Paulo. Rapidamente a revolta se tornou nacional e foi apropriada e 
 
hegemonizada pela extrema direita. Atualmente estes três grupos são os principais organizadores dos 
 
protestos de rua em todo o país. Assim, o que parecia ser uma rebelião espontânea das massas se 
 
metamorfoseou em hordas Nazifascistas verde-amarelas amplificadas pela mídia hegemônica, que 
 
atua na destruição moral, ética e pessoal dos líderes do projeto progressista no país e na maioria do 
 
campo da esquerda, contribuindo para a ressuscitação do anticomunismo, discurso e prática muito 
 
eficiente durante a guerra fria. Percebe-se que para além das vias judiciais e parlamentares e suas 
 
extravagâncias, para se efetivar, o golpe de Estado nesta nova roupagem, precisa conquistar corações e 
 
mentes, causar revolta e comoção popular (7).
 
Os referidos grupos – que contam com variantes similares em nível local e regional – atuam na 
 
criminalização da política, em sua negação enquanto mecanismo primaz para a convivência social 
 
democrática. Parece que o jarro de Pandora foi aberto e dele saem esqueletos que já se imaginavam 
 
mortos. Os ovos da serpente do Nazifascismo, chocados pelo projeto golpista nos últimos anos agora 
 
parecem ter eclodido repentinamente e de forma incontrolável. Por isso, jargões do tipo: “fora todos, 
 
ninguém me representa, são todos farinha do mesmo saco, militares no poder”, etc., são vistos e 
 
ouvidos com frequência cada vez maior. 
 
No roteiro golpista a radicalização de extrema direita surge como certo imprevisto para o consórcio 
 
jurídico-midiático-parlamentar. Possivelmente resultante de uma dose excessiva na receita do golpe, 
 
perdeu-se o controle das hordas teleguiadas nas ruas. Fenômeno que parece estar deixando atônitos os 
 
que se julgavam pilotos da boiada, pois os torpedos despejados diuturnamente contra as forças 
 
progressistas brasileiras, tal qual bumerangues, podem cair sobre suas cabeças também. 
 
O fato concreto é que o Estado de Direito Democrático garantido pela Constituição Federal está 
 
seriamente ameaçado. Já sabemos quem são os culpados diretos por esse ocaso. O que ainda nos falta 
 
são prognósticos realistas sobre o que nos aguarda num futuro próximo. Se a história pode nos 
 
fornecer exemplos, lembremo-nos de ocasiões similares, com o surgimento de “Salvadores da Pátria” 
 
e de Ditadores que a situação possibilita; no Brasil já tivemos Collor de Mello ilustrando o primeiro 
 
caso, no que tange ao segundo, alguém se lembrará de um senhor austríaco, de bigode esquisito, que 
 
sonhava ser pintor quando jovem… Ao mesmo tempo, teremos sempre o exemplo dos soviéticos 
 
resistindo heroicamente e vencendo a batalha mais sangrenta da história contra os nazistas em 
 
Stalingrado!
 
1 – Eduardo Guimarães. Se Brasil não quiser mesmo fim de Grécia e Espanha, fuja do PSDB. 
 
http://www.blogdacidadania.com.br/2015/06
 
2 – ONU: Ucrânia Oriental tem mais de 1,5 milhão de pessoas famintas. 
 
http://www.vermelho.org.br/noticia/278760-9
 
3 – Luis Nassif e Patricia Faermann. Entrevista. Da Primavera Árabe ao Brasil, como os EUA atuam na 
 
geopolítica. http://jornalggn.com.br/noticia.
 
4- Idem.
 
5 – Idem.
 
6 – MBL recebe financiamento de petrolíferas americanas dos irmãos Koch. 
 
http://www.plantaobrasil.net/news.asp?nID=93624
 
7 – Mídia continua o massacre: o alvo é depor Dilma e destruir a esquerda. http://ujs.org.br/index.php/noticias
 
*Professor da UFMT- Campus de Rondonópolis – Doutor em Geografia Humana; Presidente 
 
Municipal do PCdoB e Membro da Coordenação do Fórum Popular em Defesa da Democracia de 
 
Rondonópolis – e-mail: [email protected]