Cardozo: Relatório de Anastasia mostra intenção de condenar sem provas

O advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, rebateu o relatório do senador tucano Antonio Anastasia (PSDB-MG), que recomendou a abertura do processo de afastamento da presidenta Dilma Rousseff pelo Senado.

José Eduardo Cardozo - Agência Câmara

O ministro reafirmou que Anastasia deveria ser declarado suspeito por ser do PSDB, partido ao qual é filiado um dos autores do pedido de impeachment, Miguel Reale Júnior. Cardozo também salientou que o relatório revelou que Anastasia se deixou levar por “paixões partidárias”.

Ele identificou o “ânimo condenatório” no texto de Anastasia, isto é, a intenção de condenar sem ver as provas. E, ao considerar que “todos somos humanos”, usou esta avaliação para explicar o motivo da defesa de Dilma ter insistido – desde o primeiro dia – na suspeição do nome de Anastasia para a relatoria do processo, considerando que um advogado do PSDB foi subscritor do pedido originário do impeachment.

O primeiro ponto do relatório atacado pelo chefe da AGU, foi o caráter exclusivamente político do julgamento do impedimento. E voltou a defender que o impeachment é um processo político-jurídico e precisa considerar as garantias previstas no processo penal.

“Incide garantias do processo penal, sim. Não é apenas político. Vossa Excelência quer aproximar de algo que permite que a vontade política se expresse. É o desejo político fazendo com que a Constituição não prevaleça. O direito penal se aplica, sim, ao processo. É claro que tem componente político, mas não podemos afastar absolutamente ninguém sem os princípios do direito penal”, afirmou.

E acrescentou: “Nós não podemos afastar nenhum presidente da República sem que sejam aplicadas todas as garantias do processo penal, senão estaríamos fazendo afastamento indevido da presidente da República”, disse.

Cardozo anunciou que vai apresentar novos recursos para reverter as fases do processo. Para ele, o direito de defesa de Dilma está sendo comprometido. Alegou, por exemplo, a falta de acesso a documentos que foram analisados e considerados no parecer do colegiado, lido ontem por Anastásia. Entre eles, as planilhas apresentadas pelo procurador do Tribunal de Contas da União junto ao Ministério Público que apresentam a evolução das dívidas acumuladas pelo Tesouro junto a bancos públicos.

O ministro também destacou que apresentará recursos para tratar de procedimento formais que não estão completos. Segundo ele, o Regimento Interno da Câmara exigia que a votação do último dia 17 fosse publicada em resolução e que a falta desta fase seria suficiente para anular o início da tramitação no Senado. “Dirigimos uma petição ao presidente da Câmara sobre a resolução. O Senado também expediu ofício, mas, ao que sei, até agora, a Câmara não respondeu. A decisão teria que ser suspensa até que a Câmara se posicionasse”, afirmou.

O ministro reafirmou que a denúncia elaborada pelos juristas é inepta, porque “não há ato da presidente da República” nas chamadas “pedaladas fiscais” com relação ao Plano Safra.

“Nós dissemos que os autores não disseram qual era o ato da presidente da República. É um ato? Qual é o ato? Ela conversava com o secretário do Tesouro [Nacional, Arno Augustin]. Esse é o ato? Conversar com o secretário do Tesouro”, lembrou o ministro.

E completa: “O que causou surpresa é que o ato era conversar com secretario do Tesouro [Nacional, na época, Arno Augustin, segundo o pedido de impeachment]. Só que Arno foi exonerado em janeiro de 2015. O ato que atribuiu é a conversa de alguém em 2014? E que ato é este? Já ouvi falar de funcionário fantasma, agora ato fantasma?”, questionou.

Anastasia defendeu, no parecer, que a existência do ato deve ser objeto de exame na fase probatória do processo. “Quer dizer não sei qual o ato. Eu afasto a presidente e depois discuto qual foi o ato dela? Não há ato algum da presidente em relação às pedaladas. Quem gerenciava o Plano Safra era o ministro da Fazenda”, afirmou.

Cardozo também rechaçou o argumento de que, mesmo não sendo competência da Presidência, Dilma não poderia ter se omitido em relação aos atrasos no repasse de recursos usados para equalização de taxas de crédito agrícola. “Talvez ela não pudesse ignorar a divida, mas ela não praticou o ato que gerou a divida. A decisão de retardar pagamentos não foi da presidenta”, afirmou.

Sobre o afastamento do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), Cardozo lembrou o papel do parlamentar desde a aceitação do pedido de impeachment de Dilma. “Se alguém tinha alguma dúvida sobre o desvio de poder do senhor Eduardo Cunha, hoje perdeu a dúvida com a decisão do Supremo Tribunal Federal. Por que foi ele afastado? Porque usava seu cargo para impedir e obstacularizar investigações. Por desvio de poder. Para que investigações contra ele não avançassem”, afirmou.

Cardozo reforçou que a votação na Câmara não poderia ter tido orientação de votação das bancadas. Isso, segundo ele, levaria à nulidade do processo. O AGU também criticou as justificativas dadas para o voto no momento da votação de autorização do processo na Câmara, que, segundo ele, escandalizaram o mundo. "Será que o Brasil não consegue ver que as suas próprias leis devem ser cumpridas?", questionou