Publicado 06/05/2016 10:18 | Editado 04/03/2020 16:24

O afastamento de Eduardo Cunha da Câmara, além de extirpar momentaneamente um câncer do Legislativo brasileiro, responsável por boa parte da atual crise política, serviu para compreender um pouco mais a lógica de funcionamento do STF. Quem pensa que a principal Corte do País age sempre em sintonia com o interesse coletivo e está atenta a eventuais urgências jurídicas, pode começar a rever seus conceitos. O episódio revela uma briga de egos que compromete a seriedade do Supremo. Difícil explicar como um caso fica cinco meses nas mãos de um ministro e o mesmo resolve antecipar uma liminar logo depois de um colega decidir colocar em votação uma outra ação envolvendo o polêmico personagem que, quase diariamente, agia para desmoralizar o Parlamento.
Por mais de um ano, Cunha deitou e rolou. Fez as manobras que quis, liderou um questionável processo de impeachment, encaminhou pautas-bomba e projetos retrógrados, prejudicou investigações contra ele no Conselho de Ética, tripudiou das instituições. Junte a isso as volumosas denúncias encaminhadas pela PGR. Contudo, nada disso foi suficiente para Teori Zavascki, relator do caso, se convencer. Precisou ser “atropelado” para sair da inércia. Mas, como muita gente falou ontem, antes tarde do que nunca. O que aconteceu é passado, mas precisa virar objeto de uma séria avaliação interna quando toda essa turbulência passar.
As atenções imediatas agora se voltam para Valdir Maranhão (PP-MA), comandante interino da Câmara. Também investigado pela Lava Jato e braço direito de Cunha, pairam dúvidas quanto à capacidade do deputado de garantir estabilidade ao Congresso até que o processo contra o peemedebista seja concluído e um novo presidente eleito. Com certeza, trata-se de um perfil mais maleável, bem diferente de seu aliado. Na própria apreciação do impeachment, surpreendeu ao votar junto com o Governo. Sem protagonismo na Câmara, seria um problema a menos para o provável presidente Michel Temer resolver nos próximos dias. Afinal, não possui a influência que o deputado afastado exercia sobre parcela importante dos colegas. Também não deve virar refém de Cunha, pois recebeu a notificação de afastamento sem nem consultá-lo. Ao mesmo tempo, não é homem de confiança de Temer, que deverá trabalhar para eleger alguém mais identificado com seu projeto. Caberá a Maranhão e aos demais parlamentares a prudência que faltou quando cometeram o desatino de escolher Eduardo Cunha presidente da Câmara. Que o erro tenha servido de lição e engrandeça a forma de atuação política. Derrotar um governo pode também significar derrotar um País. Os efeitos negativos serão sentidos por muito tempo.
*Ítalo Coriolano é jornalista do O Povo
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