Guadalupe Carniel: (No la) toco y me voy

No último domingo a Argentina perdeu para o Chile. Pela segunda vez consecutiva para o Chile numa Copa América. Pela terceira vez seguida uma final (contando com a Copa de 2014). Tem uma seleção com nomes de dar inveja. Mas não parecia nem de longe que estava jogando uma final ou tentando algo maior: tirar a maldição de pecho frío e dos 23 agoniantes anos sem títulos.

Por Guadalupe Carniel*

Lionel Messi

Messi jogou sua melhor partida final pela seleção, isso é fato. Um jogador contra todo o time do Chile, carregou a equipe nos ombros, correu mais que todos, não havia bola perdida… pergunte a Diaz que até agora está desconcertado com o tanto que Messi corria, driblava, deitava e rolava até causar a expulsão do chileno.

Leo jogou bem durante todo o campeonato: em 255 minutos em campo antes da final fez 5 gols e deu 4 lindas assistências, além de se tornar o maior artilheiro da seleção com uma belíssima cobrança de falta contra os Estados Unidos, superando Batistuta com 55 gols. O que significa que metade dos gols da Argentina passaram pelos seus pés.

O futebol é um esporte coletivo e o Chile entendeu bem e se sobressaiu graças a isso, pressionando, marcando e mantendo boa posse de bola e neutralizando a Argentina. Mas tudo que já se podia falar sobre a partida já foi falado. Esqueçamos por um momento o personagem central, Messi. O futebol latino americano está desmoronando há tempos. Pipocam todos os dias notícias de escândalos nas federações. A AFA, por exemplo, passa por um momento crítico, e como o futebol imita a vida, está caótico como o resto do país.

A pedido de uma juíza, Macri tentou intervir na AFA, alegando evitar uma crise financeira e institucional ainda maior. Com isso, quase a Argentina fica fora da Copa América, já que não pode haver interferência de governo nas federações. Para se ter uma noção do que acontece, a associação está tão quebrada que o técnico Tata Martino não recebe há oito meses.

Na sexta-feira passada (24), a FIFA anunciou um comitê para regularizar e administrar a associação já que o presidente Luís Segura foi acusado de gestão fraudulenta dos recursos públicos recebidos pela entidade das transmissões na TV do campeonato argentino. Damián Dupiellet, ex –secretário da AFA, assumirá a função de presidente até junho de 2017, já que é bem quisto pela FIFA.

Agora voltamos ao Messi, que sempre foi tímido, falou antes do jogo e quem gosta de futebol entendeu bem o recado, que ia bem além das reclamações do avião com “são muitíssimas coisas. Chegou a hora de mudar e fazer as coisas bem", e completou com "Isso não é de agora, faz muito tempo que coisas acontecem e não falamos nada. Eu falei naquele momento porque eu senti que estava na hora”. Leo pode não sair, pode ter falado de cabeça quente e ceder aos encantos e caprichos e retornar à seleção. Mas, se o camisa 10 se aposentar, a situação pode se agravar já que Mascherano, Agüero, Lavezzi, Di María, Banega e Biglia devem segui-lo.

Leo para mim sempre se comportou mais como Riquelme do que como Maradona, que sempre é a referência para comparações. Há alguns dias, Diego falou que o camisa 10 não era um líder e se a seleção não ganhasse, nem voltasse ao país. E claro, o povo concordou com a frase dele. Em compensação, Juan Roman no último mês ressaltou o quanto era preciso cuidar de La Pulga, já que não há outro como ele. E realmente, quem o substituiria à altura?

Maradona e Messi, não devem ser comparados. Um é de outro planeta, o outro fora de série. Cada qual teve sua época. Messi não era o líder em campo que Maradona era? Não. Mas, era uma referência e sem ele a Argentina perde seu norte.

Messi perdeu a alegria de jogar. A coisa que dá mais prazer a qualquer jogador que se preze. E ele não tem um pingo de tesão de jogar. O melhor jogador do mundo não consegue ter reconhecimento de seu povo, visto como um espanhol pecho frío, que não canta o hino e não conquista nada. Mas vejas as lágrimas dele, o desabafo. Aquilo é algo de alguém que se identifica que daria tudo para ser campeão com aquela camisa e que sabe que aquela é uma de suas últimas oportunidades. Dói ver que o melhor do mundo esteve tão perto de conseguir a glória. Para ser mais exata, doze passos e uma bola a alguns centímetros. Vendo assim a coisa parece ainda mais cruel. O que fica dessa partida? Uma das maiores injustiças do futebol: uma geração brilhante que não ganha absolutamente nada.

Dizem que ouro vale mais, mas o peso de carregar a prata é ainda maior e dói. Se Messi continuará na seleção, não sei, pode ser que ele aprenda a lidar com essa dor e a supere. Enquanto todos falam sobre Leo, se esquecem de ir além e ver que a AFA desmorona e parece não ter uma solução. Em suma, não temos que discutir apenas se Leo segue ou não com a albiceleste. É tempo de discutir a raiz do problema e tentarmos salvar o futebol, não só o argentino, mas também o sul americano.