Rosemberg Cariry: O povo Xavante – Um exemplo de luta

"O genocídio contra o índio, um processo que já dura 500 anos, precisa parar. Afinal, a arma que mata o índio também mira o nosso coração”.

Por *Rosemberg Cariry

Criança Indígena - EBC

Há poucos dias, eu tive a oportunidade de conviver com o povo Xavante. Indo de Cuiabá até a Aldeia, viajei por mais de 300 quilômetros de soja, milho transgênico, gado e capim para engorda de bois. Nos céus, podia ver aviões borrifando agrotóxico, responsável por cânceres nos homens e mortandade na flora e fauna. A floresta nativa, o rico bioma do cerrado (um tesouro do Brasil e da humanidade), está sendo sofregamente devastada pela ganância agroindustrial.

Distante da grande imprensa e dos seus aplausos para o novo “progresso”, nas margens das rodovias, estão os barracos miseráveis do sem-terra, dos expulsos do campo, dos excluídos (daqui a pouco serão também expulsos das margens). Todo o processo é mecanizado. A produção escoa para os grandes portos e engorda de porcos na Europa e China. O Brasil volta à condição colonial de produtor de monoculturas, promovendo mais um desastre ecológico, num processo brutal e concentracionário de riquezas, com consequências terríveis para o nosso meio ambiente.

O futuro do País está comprometido. Não satisfeito, o Governo atual está mudando as leis ambientais e possibilitando o avanço das motosserras e tratores sobre as reservas indígenas e florestas ainda preservadas.

Os índios e as suas sabedorias colhidas de remotos ancestrais poderiam nos dar preciosos ensinamentos para a vida social e a nossa convivência com a mãe terra. No entanto, nas últimas fronteiras agrícolas do País, há matança de índios e aos sobreviventes oferecem bebidas alcoólicas e drogas, que podem minar suas resistências. Em face do desmonte de suas práticas alimentares provocado por essa economia agroindustrial, distribuem açúcares em produtos por eles consumidos, o que tem levado a adoecimentos (30% a 40% dos índios da região sofrem de diabetes); tomam-lhes as terras, espancam-nos, perseguem-nos, dificultam-lhes o cultivo da língua, das crenças e dos costumes; os roçados, caças e coletas, minando pouco a pouco suas tradições culturais.

O que o agronegócio, as mineradoras, os madeireiros e as igrejas neopentecostais (que lhes demonizam a religião original), cada um da forma mais perversa, estão fazendo com os índios e com a natureza é crime contra a humanidade.

Lembro-me de Caetano cantando: “Um índio descerá de uma estrela colorida, brilhante/ (…)/ E pousará no coração do hemisfério sul/ Na América, num claro instante/ Depois de exterminada a última nação indígena/ E o espírito dos pássaros das fontes de água límpida/ Mais avançado que a mais avançada das mais avançadas das tecnologias”.

Os homens e mulheres de boa vontade, em todo o mundo, esperam que a loucura da nossa civilização necrófila, baseada no lucro e na violência, não consiga exterminar as “últimas nações indígenas” e destruir o planeta azul. Um mundo mais justo e igualitário precisa ser reconstruído sobre as ruínas, com equilíbrio entre o homem, a fauna e a flora.

O genocídio contra o índio, um processo que já dura 500 anos, precisa parar. Afinal, a arma que mata o índio também mira o nosso coração.

*Rosemberg Cariry é cineasta e escritor

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