Após baixa nas eleições italianas, Renzi se demite do PD
O Partido Democratico (PD) teve um resultado ruim nas eleições do último domingo (4) na Itália: obteve 18,7% dos votos, enquanto o populista Movimento 5 Estrelas obteve 32,7% e a Liga, de extrema-direita, 17,4 (mas conquistando maioria no Senado e na Câmara, graças a coalizão com o conservador Força Itália, de Berlusconi). Agora, Renzi anunciou a abdicação de seu cargo de lider do partido, mas disse que será senador por Firenze, para o qual foi eleito
Publicado 05/03/2018 18:28

“Reconhecemos que se trata de uma derrota clara que nos impõe a abertura de uma nova página no interior do Partido Democrático (PD)”, afirmou Matteo Renzi, na sede da formação de centro-esquerda, em Roma. “É óbvio que como consequência deste resultado eu deixe a liderança do PD”, acrescentou.
Renzi, que tomou de assalto o PD e o Governo no início de 2014 para se demitir de ambos depois de ver a sua reforma constitucional negada em referendo, no fim de 2016, não fez grande autocrítica face ao pior resultado do partido, que ele voltou a liderar. Preferiu deixar claro que, com ou sem ele, o PD nunca entrará em "um governo com os extremistas”.
“Não mudamos de opinião em 48 horas. Há pelo menos três elementos que nos separam de [Matteo] Salvini e de [Luigi] Di Maio: o antieuropeísmo, a antipolítica e o ódio verbal que caracterizou a sua campanha. Que façam governo sem nós”, insistiu, visivelmente irritado com a sugestão de um entendimento com pelo menos parte do PD feita por Di Maio, líder do Movimento 5 Estrelas.
Renzi não sairá do cargo imediatamente: pediu a convocação de uma Assembleia Geral do partido para organizar um Congresso; permanecerá no cargo durante o processo de consultas que se segue à tomada de posse das duas câmaras do Parlamento.
Na análise da derrota, o dirigente preferiu falar de calendário, explicando que o PD deveria ter aproveitado outros momentos para ir às urnas “em uma das duas janelas abertas em 2017, quando teria sido possível impor uma agenda europeia na campanha”, afirmou, numa referência às eleições em França e na Alemanha. Assim, os italianos votaram “no meio de um vento extremista que se anunciava”, disse.
“O outro erro foi termos feito uma campanha muito técnica, não mostramos a alma das coisas feitas e das que queríamos fazer”, concedeu. Nada que se tenha interposto entre ele e os seus eleitores diretos. “Estou muito orgulhoso dos resultados no meu círculo. É a 14ª vez que me apresento a votos em Florença, para a região, para a cidade, e é impressionante como quem me conhece confia sempre em mim”, congratulou-se.
Trajetória
Primeiro-ministro mais jovem na história da Itália, Matteo Renzi mostrou que seu ímpeto e agressividade são capazes de vitórias maiúsculas, mas também de levá-lo a derrotas contundentes.
Nascido em Florença, no dia 11 de janeiro de 1975, Renzi é formado em direito e alcançou o sucesso na vida pública prometendo lutar contra a classe política tradicional, o que lhe rendeu o apelido de "rottamatore", ou "reciclador".
Logo em sua primeira eleição, em 2004, conquistou a presidência da província de Florença, cargo que exerceu até 2009, quando foi eleito prefeito da capital da Toscana. No comando de uma das cidades mais célebres da Itália, ganhou projeção nacional e chegou a ser escolhido o "prefeito mais amado do país".
A administração bem avaliada lhe deu força para disputar a liderança do PD, principal sigla de centro-esquerda na península, em 2012, mas ele acabou derrotado pelo então secretário da legenda, Pier Luigi Bersani. Apesar disso, Renzi continuou fortalecendo seu movimento de "reciclagem" e, nas primárias do ano seguinte, foi eleito para comandar o PD com 67,5% dos votos. Na época, o primeiro-ministro da Itália era seu correligionário Enrico Letta, cujo governo patinava nas chantagens de Silvio Berlusconi. Acusando o colega de não acelerar as reformas necessárias ao país, articulou para o partido retirar seu apoio ao premier e o derrubou. Como consequência, o então presidente Giorgio Napolitano o convocou para formar um novo governo, que tomou posse em fevereiro de 2014.
Renzi tinha 39 anos, tornando-se o mais jovem premier na história da Itália. De lá para cá, aprovou uma série de reformas, como a trabalhista, a da lei eleitoral (depois alterada) e a educacional, apesar do Parlamento fragmentado. Mas não foi sem polêmicas. Em seu percurso, o primeiro-ministro se aliou a Berlusconi e depois o dispensou, brigou com a ala mais à esquerda do PD, desafiou sindicatos e blindou quase todos os seus projetos de lei com o voto de confiança para barrar uma avalanche de emendas que poderia levar a discussões infindáveis no Congresso.
Criticado pela agressividade e acusado de atropelar os trabalhos do Parlamento, Renzi sempre se defendeu com o argumento de que a Itália precisava sair do pântano o mais rapidamente possível e não podia perder anos e anos discutindo uma lei. Foi essa postura que usou para garantir a aprovação da reforma constitucional, o ponto de virada em sua trajetória.
O projeto passou pelo Congresso, mas as feridas ficaram.
Confiante na vitória, Renzi convocou um referendo para garantir o apoio popular à reforma, porém a oposição aproveitou para mostrar à enorme parcela de descontentes com a lenta recuperação do país que a consulta popular era uma oportunidade de derrubar o governo.
O discurso colou e impôs ao premier uma dura derrota e o início de sua derrocada. Renzi passou 2017 tentando forçar a antecipação das eleições, talvez prevendo que seu capital eleitoral podia ser corroído rapidamente, mas parou no presidente Sergio Mattarella, que bancou o "fim natural" da legislatura, em 2018.
O ano fora do governo foi fatal para Renzi. Com menos holofotes, viu seu sucessor, Paolo Gentiloni, se tornar um líder admirado pela discrição e pela moderação; enfrentou batalhas internas no PD que geraram diversas dissidências; perdeu apoio para liderar as forças antipopulistas na Itália.
Com apenas 43 anos, o florentino de improvisos e frases de efeito, ao mesmo tempo arrojado e pragmático, caiu com a mesma velocidade com que atingira o auge na política. Agora, com apenas 20% de apoio, terá de recomeçar, como ele mesmo disse, como um "simples senador".