Delmiro Gouveia, pioneiro da luta contra a concorrência estrangeira

A memória de Delmiro Gouveia merece ser lembrada sempre, mesmo que o pretexto sejam seus 155 anos de nascimento, que ocorreu em 5 de junho de 1863

Por José Carlos Ruy

Delmiro Gouveia

Este brasileiro de Ipu, Ceará, notabilizou-se pelo enfrentamento, no começo exitoso e ao fim trágico, contra a Machine Cotton, a multinacional britânica que dominava, com as linhas Corrente, o mercado brasileiro e latino americano de linhas de costura.

Era ainda criança quando sua família se mudou para Goiana (PE), em 1872. Ali começou a trabalhar aos 15 anos de idade; tinha 20 quando, desde o interior de Pernambuco, dedicou-se, com sucesso, ao comércio de peles de cabras e de ovelhas e, poucos anos depois fornecia para, entre outros comerciantes, o sueco Herman T. Lundgren (estabelecido em Paulista, PE), criador da Casas Pernambucanas.

Em 1903, por desavenças com a oligarquia liderada pelo Conselheiro Rosa e Silva, mudou-se para Pedra, no interior de Aagoas. Ele havia se apaixonado – e raptado – uma filha do então governador Sigismundo Gonçalves, apoiado por aquela oligarquia. Temendo por sua vida, deixou Recife e foi para o sertão do São Francisco, na fronteira entre Pernambuco, Sergipe e Bahia – Pedra, hoje, é, em sua homenagem, a cidade de Delmiro Gouveia (Alagoas). Em sua fazenda, que ficava às margens da Ferrovia Paulo Affonso, construiu – em 1912, inaugurada em 1914 – sua fábrica de linhas de costura, com a marca Estrela, e 200 casas para os trabalhadores. Teve forte apoio do governo de Alagoas, que construiu 520 km de estradas para facilitar a circulação da produção da fábrica de Pedra. Seu sucesso foi enorme. Em pouco tempo desalojou a concorrência inglesa do mercado brasileiro e se tornou um grande concorrente dela na América Latina.Foi um empreendedor voltado para o aproveitamento dos recursos naturais e hidrelétricos de rios como o São Francisco, em benefício do bem estar do povo e da criação de empregos.


Vila Operária

A energia elétrica para a fábrica vinha do aproveitamento da queda de Angiquinho, na cachoeira de Paulo Afonso, inaugurada em 1913, considerada uma das primeiras usinas hidroelétricas do Brasil.

Enfrentou forte concorrência da Machine Cotton, que criou grandes obstáculos para a marca Estrela, pressionou, tentou comprar a fábrica e por ai afora.

As mudanças que Delmiro Gouveia promovia no sertão, com sua fábrica e as mudanças nas relações de produção que ela gerava, despertaram forte oposição entre a oligarquia latifundiária, que se sente ameaçada pelo progresso, principalmente o progresso industrial. Delmiro Gouveia colecionou adversários e inimigos entre os coronéis do sertão. Foi uma coalizão fatal para ele e seu empreendimento. A conseqüência foi seu assassinato, em 10 de outubro de 1917, que – passados mais de cem anos – ainda não está esclarecido.

Seus herdeiros cederam às pressões da Machine Cotton, a quem venderam a fábrica. Os britânicos a desmontaram – inclusive destruindo seus prédios – e jogaram os escombros no Rio São Francisco.

A epopéia de Delmiro Gouveia é o exemplo notável da luta daqueles que almejam o desenvolvimento do Brasil. Primeiro, do sucesso de sua audácia e criatividade. Depois, da luta, que se dá em duas frentes: de um lado, o imperialismo e a concorrência estrangeira; de outro lado, a oligarquia, latifundiária e, hoje, financeira, que – aliada do imperialismo – rejeita o desenvolvimento que, alterando em profundidade as relações de produção, fere a fonte de seu domínio e privilégios. Os brasileiros enfrentam hoje uma luta semelhante, contra os mesmos adversários – o imperialismo e seus aliados dentro do país – que precisam derrotar para que o Brasil possa se desenvolver, com garantia de emprego, renda e bem estar social a todos os brasileiros.