Juliana Diniz: A esquerda renovada, com a benção do pai

“O PT aposta alto, apresentando Fernando Haddad e Manuela D'Ávila como um par de líderes que se unem em prol de um projeto comum, sem que o protagonismo de um ofusque o potencial de articulação do outro. Certo de que não pode forjar artificialmente um líder popular da magnitude carismática do seu fundador, o partido redimensiona a dinâmica do presidencialismo, optando pela candidatura de um par".

Por Juliana Diniz*

Manuela e Haddad Lula Livre - Ricardo Stuckert

Dias após o início oficial da campanha, a incógnita da candidatura petista parece resolvida e o panorama da disputa presidencial desenhado. Lula, registrado como candidato do PT, deve, após ser declarado inelegível pela justiça eleitoral, ceder lugar à dupla Haddad-D'Ávila para que participem da disputa como candidatos reais ao pleito.

A estratégia do PT explora a capacidade de transmissão de votos de Lula, que incorpora o símbolo do mártir, líder popular impedido de disputar as eleições por questões mais políticas que jurídicas, tese corroborada pela recomendação do Comitê de Direitos Humanos da ONU em favor do petista. Nesse panorama, a dupla Haddad-D'Ávila desempenha o papel de herdeiros e continuadores de seu legado.

Desde a pré-campanha suas imagens têm sido cuidadosamente trabalhadas: o rosto de Lula onipresente entre os dois candidatos, como uma benção e uma autorização.

Uma certeza paira sobre as forças em disputa, confirmada pelo resultado das pesquisas já divulgadas: inexiste no cenário brasileiro um líder elegível cujo carisma e capacidade de mobilização se equiparem aos de Lula, defenda-se ou não o petista. Mesmo Haddad e D'Ávila não têm, isoladamente, capital político para disputar a eleição com chances de êxito.

Por isso o PT aposta alto, apresentando Fernando Haddad e Manuela D'Ávila como um par de líderes que se unem em prol de um projeto comum, sem que o protagonismo de um ofusque o potencial de articulação do outro. Certo de que não pode forjar artificialmente um líder popular da magnitude carismática do seu fundador, o partido redimensiona a dinâmica do presidencialismo, optando pela candidatura de um par. Fernando e Manuela têm construído um discurso conjunto, fora do modelo tradicional de chapa composta por cabeça e vice e focado na horizontalidade de forças, um caminho promissor para resgatar a paixão de sua militância cada vez mais arredia ao personalismo da velha política.

Aí desponta o potencial eleitoral de Manuela. Mulher, com postura altiva e admirável capacidade de diálogo com as novas mídias, é no que Manuela D'Ávila pode agregar ao discreto Haddad que parece estar a chave das chances do PT. Resta saber se a dupla de candidatos, amadurecida, terá a força para, também no plano simbólico, matar o pai, recebendo sua benção (e seus votos) para assumir de vez um efetivo lugar no debate e na disputa.

*Juliana Diniz é jornalista, escritora e professora.

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