Ecoando Trump, com atraso, Bolsonaro diz que quer sair da OMS

Assim como o presidente dos EUA, que fracassou no combate à pandemia, Bolsonaro faz críticas ao trabalho da organização que recomendou isolamento social contra o contágio.

Isolado em sua omissão diante do número crescente de mortes, Bolsonaro vai tentar colocar a culpa em bodes expiatórios.

O presidente Jair Bolsonaro fez críticas ao trabalho da Organização Mundial da Saúde (OMS) na pandemia e disse que o governo pode deixar a organização, que atuaria, segundo ele, “com viés ideológico”. A manifestação de Bolsonaro ocorre uma semana após Trump ter anunciado o rompimento dos EUA com a OMS, acusando a organização de atuar para favorecer a China, congelando repasses que o governo norte-americano faria à entidade.

“E adianto aqui, os Estados Unidos saíram da OMS, e a gente estuda, no futuro, ou a OMS trabalha sem viés ideológico, ou vamos estar fora também. Não precisamos de ninguém de lá de fora para dar palpite na saúde aqui dentro”, disse Bolsonaro a jornalistas na portaria do Palácio da Alvorada, na noite desta sexta-feira (5).

Desde que a OMS reconheceu a pandemia do novo coronavírus, Bolsonaro desrespeita as orientações da organização sobre a forma de prevenção. Os países que seguiram com rigor as recomendações contiveram o avanço da doença e estão conseguindo sair mais cedo da quarentena para recuperar suas economias. O Brasil, por outro lado, apresenta os piores números do mundo conforme se aproxima do tempo de pandemia de países como EUA e Reino Unido.

O presidente fez referência à controvérsia causada pelas pesquisas que a OMS conduzia sobre a hidroxicloroquina no tratamento do novo coronavírus. “Para que serve essa OMS? A OMS recomendou há poucos dias não prosseguir mais com os estudos sobre a hidroxicloroquina, e agora voltou atrás. É só tirar a grana deles que eles começam pensar de maneira diferente”, disse Bolsonaro.

A OMS retomou esta semana os estudos com o medicamento, após aplicar uma suspensão dos testes por 10 dias, depois da revisão de um estudo publicado pela revista médico-científica The Lancet.

Assim como Trump, Bolsonaro começa a preparar o terreno para culpar bodes expiatórios pelo seu fracasso e omissão. Desde que os números de mortos e doentes explodiram, ele culpa governadores e prefeitos que seguiram a recomendação da OMS de impor quarentena. Demitiu dois ministros da Saúde, seguidos, por defenderem o isolamento social e não recomendarem o uso de cloroquina no tratamento da covid-19, outra cortina de fumaça usada por Bolsonaro, que também papagaiou de Trump. Enquanto a OMS, especialistas e o próprio Ministério da Saúde orientam o isolamento social, Bolsonaro vai a manifestações pró-governo e cumprimenta apoiadores. A OMS recomenda o uso de máscara como forma de prevenção e Bolsonaro não usa quando vai aos atos ou põe e tira.

A Organização Mundial da Saúde é uma agência internacional especializada em saúde, fundada em 7 de abril de 1948 e subordinada à Organização das Nações Unidas (ONU). Sua sede é em Genebra, na Suíça. A OMS é composta por 194 Estados-Membros e dois membros associados. No caso do Brasil, para aderir à organização, o país ratificou internamente um tratado internacional de criação da agência. Uma eventual saída desse tratado teria que passar pelo Congresso Nacional.

‘Mau exemplo’

Apesar de seguir à risca a estratégia do norte-americano, Trump citou o Brasil como exemplo de país com dificuldades para lidar com a pandemia. O presidente dos EUA havia dito que o Brasil está seguindo o mesmo caminho da Suécia, país que não impôs quarentenas e decidiu se basear principalmente em medidas voluntárias de distanciamento social e higiene pessoal, mantendo a maioria das escolas, restaurantes e empresas abertas. Como resultado, a Suécia tem um número muito maior de casos de coronavírus do que seus vizinhos nórdicos.

Na entrevista, o presidente não respondeu diretamente à fala de Trump e, interrompendo o repórter, mandou um “abraço” ao presidente dos Estados Unidos e disse que o Brasil quer cada vez mais aprofundar o relacionamento com os norte-americanos. “Torço para que seja reeleito”, disse.

Divulgação de balanço

Durante a entrevista, o presidente Jair Bolsonaro também comentou a mudança de horário na divulgação do balanço das infecções e mortes por covid-19, atualizado diariamente pelo Ministério da Saúde. Desde a última quarta-feira (3), a pasta só envia os dados consolidados do dia por volta das 22h. Antes, esse balanço era enviado por volta das 19h.

Como Bolsonaro citou a Rede Globo ao dizer que não ia correr para atender a emissora (e, em reservado, disse “acabou o Jornal Nacional”), o âncora William Bonner capitaneou uma reportagem atacando a estratégia de manipulação das estatísticas da pandemia, com repercussão de especialistas. A Globo fez levantamento próprio de casos e óbitos e mostrou que a Câmara dos Deputados ameaça montar estrutura para isso, também. Em editorial, disse ainda que o Jornal Nacional “vai correr para atender aos brasileiros”. Quando o Ministério da Saúde divulgou os números às 22h, o JN interrompeu a novela para um plantão.

“É para pegar os resultados mais consolidados e tem que divulgar os mortos do dia. Ontem, os mortos eram de dias anteriores. Se quiser, faz um consolidado para trás, mas tem que mostrar os mortos do dia”, justificou Bolsonaro, sobre a metodologia de divulgação adotada pelo Ministério da Saúde, o que não esclareceu nada.

Em comunicado à imprensa, o ministério informou que os números de casos de covid-19 e de mortes causadas pela doença são repassados à pasta pelas secretarias estaduais e municipais de Saúde. O ministério acrescenta que analisa e consolida os dados e que em alguns casos “há necessidade de checagem junto aos gestores locais”. “Desta forma, o Ministério da Saúde tem buscado ajustar a divulgação dos dados, que são publicados diariamente na plataforma covid.saude.gov.br“, destaca o texto.

Com informações da Agência Brasil.

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