Povos indígenas se levantam por direitos, terra e pela natureza
O principal objetivo do Levante pela Terra é “fazer com que a sociedade se engaje na luta pela proteção dos povos indígenas, contra a invasão de seus territórios por mineradoras, madeireiras, latifundiários, grileiros e pelo garimpo ilegal” afirma Antônio Eduardo de Oliveira, secretário-executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi)
Publicado 28/06/2021 21:58
A mobilização de centenas de representantes dos 305 povos indígenas do Brasil, com mais de 900 mil indivíduos, está em Brasília, desde o dia 8 de junho, no Levante pela Terra. O principal objetivo é “fazer com que a sociedade se engaje na luta pela proteção dos povos indígenas, contra a invasão de seus territórios por mineradoras, madeireiras, latifundiários, grileiros e pelo garimpo ilegal”, afirma Antônio Eduardo de Oliveira, secretário-executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi).
Os indígenas se levantam para defender suas terras, alvo de constantes invasões. A manifestação acontece agora porque tramita no Congresso o Projeto de Lei 490/2007, que visa passar para o Parlamento a decisão sobre a demarcação das Terras Indígenas, ainda com a limitação do chamado marco temporal, onde têm direito às suas terras, os povos que as tenham ocupado antes da promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988. E o Supremo Tribunal Federal (STF) rediscute na quarta-feira (30) a constitucionalidade do chamado marco temporal.
“Essa tese é inconstitucional e os poderes Executivo e Legislativo querem empurrar goela abaixo a supressão dos direitos dos povos indígenas no Brasil”, diz Oliveira. Para ele, “os povos indígenas têm grande esperança e permanecem mobilizados para dar apoio ao STF para que nesse julgamento essa tese seja sepultada definitivamente”.
Os indígenas querem que seja respeitada a Constituição que determina à União demarcar, proteger e fazer respeitar os bens das Terras Indígenas. “Mesmo assim, desde a sua posse em 2019, o presidente Jair Bolsonaro não demarcou nenhum território dos indígenas”, afirma Vânia Marques Pinto, secretária de Políticas Sociais da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB).
E para piorar, “a bancada ruralista mantém o olho grande nessas terras com o objetivo de desmatar, explorar o solo e o subsolo e criar pastagens para gado”, num “total desrespeito à Constituição e aos direitos dos povos originários”.
Para Márcio Santilli, sócio fundador do Instituto Socioambiental (ISA), “o Levante pela Terra é a revolta que transborda das aldeias, como resposta às sucessivas intervenções do próprio presidente Bolsonaro para dividir os índios e atropelar os seus direitos. Num contexto em que ataques do governo federal ameaçam os direitos indígenas e, no Legislativo, projetos e bancadas contrários aos povos indígenas se sobressaem, os olhares e as esperanças de garantir que os direitos constitucionais dos povos originários não sejam desfigurados se voltam ao STF”.
De acordo com Vânia, a tese do marco temporal visa dar “legitimidade aos ataques às terras indígenas, insuflando a violência contra esses povos, que antes da Constituição eram tutelados pelo Estado” e, portanto, “não tinham autonomia plena para defender judicialmente seus territórios”. Contra essa perversidade, os indígenas dizem que a história deles “não começa em 1988”. Aliás, começa muito antes de 1500, quando os portugueses tomaram essas terras.
Segundo a Fundação Nacional do Índio (Funai), existem no Brasil 441 terras indígenas regularizadas, 9 homologadas, 74 declaradas e 43 delimitadas, mas existem 119 em estudo. Ainda segundo a Funai, as terras indígenas abrangem 13% do território nacional.
O governo Bolsonaro parte da tese preconceituosa, alega Oliveira, de que “os territórios não são produtivos nas mãos dos indígenas”, mas ocorre justamente o contrário, “os indígenas produzem para a sua sobrevivência”, além de “preservar a natureza, ao contrário dos não indígenas”, portanto, “as terras indígenas pertencem a todo o povo brasileiro porque significa respeito à nossa soberania”.
Com Bolsonaro acontece o inverso. “No atual governo as terras indígenas têm sido fruto de constantes conflitos porque estão abertas à exploração pelas mineradoras e pelo agronegócio”, realça Vânia. Inclusive, “grandes empresas querem se apossar dos recursos hídricos nessas áreas, porque querem privatizar a água para lucrarem com esse líquido vital para a humanidade”.
Além de todas essas ameaças, os povos indígenas foram largados à própria sorte no combate à pandemia. Até o momento, de acordo com a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), 163 povos indígenas foram atingidos pela covid-19 com 56.174 casos confirmados e 1.126 óbitos.
Isso acontece porque os indígenas foram prejudicados duplamente no atual governo, diz Oliveira. “Foram prejudicados com a invasão de suas terras e consequentemente com a infecção pelo coronavírus”. Soma-se a isso à determinação de grupos evangélicos para que os indígenas se recusem a ser vacinados.
“Espera-se que o STF tenha a sapiência de barrar as invasões das terras indígenas, pondo fim aos conflitos, acabando com a tese do marco temporal e exigindo que a Funai demarque de vez todas as terras indígenas”, destaca Vânia.
“Sem dúvidas, o primeiro passo é respeitar e garantir os direitos e a autonomia dos povos indígenas. Por isso, é também necessário repensar o modelo de exploração de recursos naturais, que, desde a colonização, é predatório. Essa exploração está na base das violências que sofremos, o garimpo nas terras Munduruku e Yanomami é um exemplo”, relata a assessoria de comunicação da Apib.
Fonte: CTB