Após bronca de Barra Torres, Bolsonaro recua sem deixar de acusar Anvisa

Presidente da Anvisa emitiu nota neste sábado (8) respondendo a uma declaração de Bolsonaro, que questionou suposto interesse da agência relacionado a imunização infantil contra Covid, sugerindo corrupção no órgão.

O presidente Jair Bolsonaro, durante cerimônia no Palácio do Planalto, com o presidente da Anvisa, Antônio Barra Torres, ao fundo

O presidente Jair Bolsonaro afirmou nesta segunda-feira (10) que não acusou a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) de corrupção “em nenhum momento”, mas voltou a levantar suspeitas sobre a atuação do órgão nos processos relacionados à vacinação de crianças contra a Covid-19.

O presidente deu a declaração durante entrevista à Jovem Pan, dois dias depois de o presidente da Anvisa, Antônio Barra Torres, divulgar uma nota em que cobrou uma retratação de Bolsonaro por ataques à agência.

Na última quinta (6), à TV Nova, Bolsonaro havia sugerido que a Anvisa e “pessoas taradas por vacina” poderiam ter interesses ocultos por trás do aval à vacinação de crianças contra a covid-19, que já acontece em países como Chile e Estados Unidos. O presidente, porém, não apresentou provas de suas alegações. Mais tarde, Bolsonaro ainda chamou a agência de “dona da verdade”.

“Acho que a Anvisa… Não faço interferência, é um órgão independente. [Mas] Acredito que o trabalho poderia ser diferente. (…) Não acusei a Anvisa de corrupção, perguntei o que está por trás dessa gana dessa sanha vacinatória [contra a covid-19]”, disse Jair Bolsonaro, a “Os Pingos nos Is” da Jovem Pan.

“Me surpreendi com a carta dele. Carta agressiva. Não tinha motivo para aquilo. Eu falei: ‘o que está por trás do que a Anvisa vem fazendo?’. Ninguém acusou ninguém de corrupto […] O que que está por trás? Quais segundas intenções, quais outras intenções da Anvisa? Não houve da minha parte nenhuma acusação, a palavra corrupção não saiu nenhum momento. E ele [Barra Torres] resolveu fazer uma nota bastante agressiva”, disse Bolsonaro.

Na sequência, sem provas, o presidente afirmou que “tem alguma coisa acontecendo” na Anvisa.

“Eu não quero dizer aqui, acusar a Anvisa de absolutamente nada, agora que tem uma coisa acontecendo, isso não há a menor dúvida que vem acontecendo. Pode ver, pelo que estou sabendo agora, não é segredo pra ninguém, Anvisa vai deliberar sobre a CoronaVac para crianças a partir de 3 anos de idade, eu não sei o que acontecerá no final, mas Anvisa vai tomar sua posição. E, de uma forma ou de outra, vai sofrer críticas também”, disse Bolsonaro.

Em seguida, Bolsonaro avaliou o trabalho da agência e comentou sobre a nomeação de Barra Torres para o cargo, no início do governo. 

“Eu acho que a Anvisa, acredito que o trabalho poderia ser diferente. Eu o nomeei para lá. Depois da nomeação, ele ganhou luz própria. Eu espero que ele acerte na Anvisa. Mas nós não tivemos nenhum atrito a ponto tal de ele falar que eu tinha que indicar qualquer indício de corrupção”, acrescentou. 

Pingos nos Is

Bolsonaro expressa abertamente sua hostilidade a veículos da imprensa e jornalistas. E também deixa bastante claro as suas preferências. A Jovem Pan, por exemplo, está entre as favoritas do presidente – foi o veículo que mais o entrevistou em 2021. Ele costuma fazer dobradinhas da Jovem Pan com suas lives de quinta-feira.

Neste início de 2022, a preferência do presidente produziu uma situação rara nesta segunda-feira (10): duas entrevistas exclusivas ao mesmo canal, uma pela manhã e outra à noite. A primeira gravada, editada e sem confrontos com Zoe Martinez. E a segunda ao vivo com jornalistas próximos de Bolsonaro: Vitor Brown, Augusto Nunes, Ana Paula Henkel, Cristina Graeml e Guilherme Fiuza.

Nota de Barra Torres

O diretor-presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres, emitiu uma nota neste sábado (8) em que responde uma declaração do presidente Jair Bolsonaro, que questionou suposto interesse da agência relacionado a imunização infantil contra Covid.

Barra Torres disse que, caso o presidente tenha informações que “levantem o menor indício de corrupção” contra ele, que “não perca tempo nem prevarique” e que “determine imediata investigação policial”.

Barra Torres também pediu que, caso não tenha indícios, Bolsonaro se retrate da acusação feita contra a agência.

“Agora, se o senhor não possui tais informações ou indícios, exerça a grandeza que o seu cargo demanda e, pelo Deus que o senhor tanto cita, se retrate. Estamos combatendo o mesmo inimigo e ainda há muita guerra pela frente”, disse Barra Torres.

A Anvisa autorizou o uso da vacina Pfizer para vacinação infantil contra a Covid-19 no dia 16 de dezembro. No entanto, as regras para a imunização de crianças foram divulgadas pelo Ministério da Saúde apenas na última quarta-feira (5) após uma consulta pública realizada pela pasta.