Celular pré-pago e conexão ruim são restrições ao acesso de adolescentes 

Pesquisa do CGI.br revela limites de acesso da maioria dos estudantes à internet, assim como habilidades frente ao ambiente de desinformação e segurança da privacidade.

O maior gargalo do acesso à internet por adolescentes ocorre justamente na escola, onde pode ser usada para efeitos pedagógicos.

A qualidade da conexão e a disponibilidade de dispositivos adequados para o acesso à Internet limita a participação de crianças e adolescentes no ambiente digital. A pesquisa TIC Kids Online Brasil 2022 foi lançada, nesta quarta-feira (3), pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br).

O levantamento apresenta tendências quanto ao acesso e o uso de tecnologias de informação e comunicação (TIC) por crianças e adolescentes, revelando que apenas oferecer a internet não é suficiente. A pesquisa também mostra o nível de habilidade da maioria dos adolescentes, assim como sua suscetibilidade à desinformação.

A pesquisa mostrou que a baixa velocidade e a falta de créditos no celular são condições percebidas com frequência por parte dos entrevistados para o uso da Internet. Mesmo crianças de famílias mais abastadas de algumas localidades também percebem que a conexão de internet oferecida é ruim. São 940 mil crianças que nunca acessaram a internet e 1,2 milhão que não acessam a meses.

Renata Mielli, coordenadora do CGI.br, observa que é preciso pensar políticas públicas que melhorem a qualidade de conexão dessas crianças. Ela também destaca o fato de um percentual muito alto de adolescentes terem perfis nas redes sociais, mesmo não sendo ambientes adequados para essa faixa etária.

“A pesquisa contribui, no momento em que a sociedade está debatendo a regulação das plataformas digitais, como olhar para a questão da infância e adolescência com dados de qualidade como esses, que podem ajudar a ter pistas de como contribuir para um debate de políticas públicas mais adequadas”, afirmou Renata.

Entre as crianças e adolescentes usuários de Internet, 39% daqueles pertencentes às classes D e E, 30% da C e 18% das A e B reportaram que “sempre ou quase sempre” sentem a velocidade da conexão ficar ruim. 

Já 22% disseram que “sempre ou quase sempre” ficam sem internet porque os créditos do celular acabaram. Além disso, 25% dos usuários de menor renda familiar alegaram ter deixado de fazer alguma atividade online com medo de os créditos terminarem.

A pesquisa mostrou ainda que 11% do total de crianças e adolescentes que são usuárias de Internet reportaram ter ficado sem celular ou computador para acesso à rede “sempre ou quase sempre”.

“A questão central não é apenas ter acesso à Internet ou não, mas que crianças e adolescentes brasileiros tenham condições de acesso apropriadas para uma conectividade significativa, que lhes permita desenvolverem habilidades digitais e se beneficiarem da participação online. O limite no acesso pode restringir direitos fundamentais dessa população na sociedade da informação”, analisa o gerente do Cetic.br|NIC.br, Alexandre Barbosa, que conduziu a pesquisa.

Foi o que destacou Fábio Senne, do Cetic.Br, ao dizer que, mesmo com a expansão de fibra ótica até para áreas rurais, há um gargalo entre o acesso residencial e nas escolas para uso pedagógico mais intensivo. “os dados mostram que as escolas já têm algum tipo de acesso à rede, mas um acesso que permita que toda a comunidade escolar use a internet com qualidade”, diz Senne, citando a necessidade de políticas de inclusão digital.

Habilidades digitais

Dos cerca de 24 milhões (92%) de crianças e adolescentes brasileiros de 9 a 17 anos usuários de Internet, 86% reportaram possuir perfil em redes sociais (o que representa aproximadamente 21 milhões). Em relação ao bem-estar online de crianças e adolescentes, 19% da população de 9 a 17 anos reportaram que “sempre ou quase sempre” ficam chateados ou incomodados com coisas que acontecem na Internet.

A pesquisa também investigou a percepção de crianças e adolescentes sobre suas habilidades digitais. Em geral, os usuários de Internet de 11 a 17 anos se mostram confiantes quanto a habilidades consideradas operacionais – como baixar aplicativos (94%), e se conectar a uma rede Wi-Fi (90%).

Entre as habilidades informacionais, a proporção dos usuários de 11 a 17 anos que relataram saber escolher que palavras usar para encontrar algo na Internet foi de 77%. O percentual daqueles que reportaram que sabiam verificar se uma informação encontrada na rede estava correta foi menor (57%), assim como dos que afirmaram saber checar se um site era confiável (62%). Para 43% deles o primeiro resultado da pesquisa é sempre a melhor fonte de informação.

Senne ponderou que a abordagem da pesquisa para medir a intensidade do impacto da desinformação entre adolescentes, é limitada. Ele explica que este é um desafio internacional das pesquisas. “O que investigamos, e considero relevante, foram as habilidades e percepções quanto a capacidade de checar informações e entender a lógica das plataformas, que nem sempre a busca que se faz é a melhor”, relatou.

Ainda conforme o levantamento, 60% nessa faixa etária concordaram que curtir ou compartilhar uma publicação pode ter um impacto negativo em outras pessoas. Já 74% concordaram que empresas pagam pessoas para usar seus produtos nos vídeos e conteúdos publicados na rede.

“Nesta edição, houve maior detalhamento na coleta de indicadores sobre as habilidades digitais, que são fundamentais para compreender a participação de crianças e adolescentes no ambiente online. De modo geral, a pesquisa indica uma maior prevalência de habilidades operacionais em comparação às habilidades informacionais, que são aquelas que possibilitam maior resiliência dos usuários frente ao fenômeno da desinformação”, destaca Barbosa.

Privacidade

Em 2022, a pesquisa verificou que a percepção dos entrevistados sobre atitudes e estratégias para a proteção de sua privacidade no uso da rede ultrapassa 70% dos usuários na faixa etária. De acordo com a pesquisa, 79% dos usuários de Internet de 11 a 17 anos concordaram que são cuidadosos com informações pessoais que postam. Os números são próximos entre os atentos aos convites de amizade que aceitam na Internet, que só utilizam aplicativos ou sites em que confiam, e que são cuidadosos com os links de vídeos em que clicam.

Um percentual menor de entrevistados reportou que fornecem apenas o mínimo de informações pessoais possível ao se registrarem online (58%).

Quanto às estratégias adotadas para proteger a sua privacidade, mais da metade dos usuários de 11 a 17 anos reportou ter bloqueado mensagens de alguém com quem não queriam conversar (63%); ter usado de senhas seguras (58%) e alterado as configurações de privacidade para que menos pessoas pudessem ver o seu perfil (52%).

“A TIC Kids Online Brasil cumpre um importante papel ao gerar evidências sobre o uso da Internet por crianças e adolescentes no país, incluindo a percepção delas sobre temas como a privacidade no uso da rede, tão relevante neste momento”, ressalta Renata Mielli, coordenadora do CGI.br.

A 9ª edição da pesquisa TIC Kids Online Brasil entrevistou presencialmente 2.604 crianças e adolescentes com idades entre 9 e 17 anos, assim como seus pais ou responsáveis, em todo o território nacional. As entrevistas aconteceram entre junho de 2022 a outubro de 2022. A TIC Kids Online Brasil está alinhada com o referencial metodológico do projeto Global Kids Online, coordenado pelo Unicef e com a rede Kids Online América Latina.

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