Centrais: “Quem pode mais, contribui mais” com reforma tributária

Adilson Araújo, presidente da CTB, esteve na reunião com secretário Bernard Appy e defendeu caráter progressivo da tributação; centrais defendem posição em documento do Dieese

Foto: Reprodução

A reforma tributária deve ser votada no Congresso Nacional no mês de julho e o movimento sindical tem acompanhado de perto os desdobramentos da proposta. Como forma de manter um diálogo próximo com o governo federal e defender os interesses dos trabalhadores, assim como de toda a sociedade, na última quinta-feira (29/7), integrantes das Centrais Sindicais estiveram reunidos com o Secretário Extraordinário da Reforma Tributária, Bernard Appy.

O presidente nacional da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Adilson Araújo, esteve na reunião. Ao Portal Vermelho, ele relatou a posição que marcou no encontro.

“Defendemos uma reforma tributária progressiva, que diminua a carga sobre o consumo e a renda e que tribute a riqueza, a herança, o patrimônio. Como existe no resto do mundo, quanto mais patrimônio, mais herança, mais imposto. Ser rico no Brasil é um privilégio, ser pobre é ser jogado na cracolândia”, disse.

Leia também: Reforma tributária vai corrigir várias distorções na economia

De acordo com Araújo, a reforma tributária precisa abraçar o caráter progressivo, ou seja, “quem ganha mais paga mais, quem ganha menos paga menos e quem não ganha nada não paga nada”.

Nesse ponto, destacou que este é um princípio universal dos países que adotaram o estado de bem-estar social e, nesse sentido, o Brasil como um país rico, mas permeado pela desigualdade, não pode ter mais de 30 milhões de pessoas sem a garantia de ter um prato de comida.

Consumo e Renda

O presidente da CTB explicou que é razoável que o governo esteja priorizando inicialmente a reforma tributária sobre a questão do consumo. No entanto, não é oportuno perder de vista a tributação sobre a renda.

“A carga tributária sobre o consumo é gritante e precisa ser corrigida. Não temos dúvida disso. Mas não é possível seguir taxando o pobre, sobretudo na carga tributária que incide sobre os alimentos. Em São Paulo e outras capitais, 70% do salário mínimo é consumido com a cesta básica. No mesmo passo da importância reforma tributária sobre o consumo temos que aliar a reforma tributária sobre a renda”, afirmou.

Assim, Adílson revela que o movimento sindical e toda a sociedade devem seguir lutando por uma maior isenção do Imposto de Renda e sobre bens dos mais ricos.

“Quem ganha R$5 mil hoje tem subtraído 27,5%, é algo absurdo quando na realidade que temos o rico tem isenção sobre a compra de aeronaves, helicópteros, iates, jet ski. O 1% mais rico do Brasil concentra a metade de toda a riqueza nacional. Não podemos mais conviver com essa condição. Por isso a necessidade de isenção para quem ganha até R$5 mil que é proposta de campanha do Lula, que disse que ia fazer e não fez. Isentou só quem ganha até R$ 2.640.”

Leia também: Estados querem compensar perdas com reforma tributária

Ao cobrar o governo, o sindicalista pondera que a correlação de forças é difícil para que se aprove tais medidas, porém é fundamental conceber uma lógica que se aproxime de uma nação que ambiciona um projeto de desconcentração da riqueza.

“Não basta reduzir o preço do automóvel, reduzir o preço da passagem aérea se não damos atenção a um novo ciclo de desenvolvimento e crescimento econômico com defesa da valorização do trabalho”, entende ao Adilson ao colocar que é preciso melhorar ainda mais os níveis de emprego e salário em consonância com a redução dos “maiores juros do planeta” (13,75% taxa básica de juros e mais de 400% a taxa de juros do cartão de crédito).

Por fim, o presidente da central sindical sinalizou que as mudanças no Brasil promovidas pelo atual governo têm ajudado a criar um ambiente político positivo para que se conquiste os avanços propostos.

“Não há nada que garanta mais previsibilidade do que geração de emprego e renda, fomento da economia, salário mínimo, Bolsa Família, redução de despesas, o que hoje todos países desenvolvidos tem. Inclusive, muitos garantem o seguro-desemprego vitalício, exatamente por isso”, comentou Araújo, como sugestão final.

Quem pode mais, contribui mais

Após o encontro no Ministério da Fazenda, foi elaborado um documento com a sistematização dos principais pontos que o movimento sindical tem apontado na agenda da classe trabalhadora. O documento redigido pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) tem a chancela das Centrais Sindicais e tem como perspectiva a ideia de “quem pode mais, contribui mais”.

O texto destaca que o Brasil “é um dos países mais desiguais do mundo” e que parte disso é causado pelo sistema tributário, classificado como lesivo ao mais pobres, complexo, que permite elevada sonegação e com “alto número de exceções tributárias e excesso de subterfúgios “para não pagamento por parte dos mais ricos”. Além disso, o sistema privilegia a “especulação e não a produção e o assalariamento”, o que impede o financiamento perene de políticas sociais.

Com isso, o movimento sindical reforça o entendimento já exposto ao presidente Lula durante a campanha eleitoral e no governo de transição, que consta na Pauta da Classe Trabalhadora:

“Reformar o sistema tributário e orientá-lo pela capacidade contributiva de cada brasileiro e brasileira; pela progressividade dos impostos; pela revisão dos impostos de consumo e dos impostos sobre renda e patrimônio, aumento da tributação sobre grandes heranças e riquezas, lucros e dividendos.”

Nesse sentido, a reforma tributária, deve se orientar pela simplificação, garantia de financiamento às políticas sociais, estímulo à produção nacional e fim da guerra fiscal.

O documento ainda coloca 10 pontos para uma tributação mais justa para toda a sociedade:

1) Desonerar a cesta básica, avançando sobre os demais impostos, com controle de repasse para os preços, colaborando para redução dos impostos indiretos (previsto na reforma tributária);

2) Tributar lucros de dividendos;

3) Aumentar os impostos sobre a propriedade da terra;

4) Tributação sobre a remessa de lucros das empresas estrangeiras;

5) Instituir o imposto sobre grandes fortunas;

6) Corrigir a tabela do Imposto de Renda, aumentando sua progressividade (a correção da tabela está em andamento, mas é necessário ampliar o número de faixas e alíquotas);

7) Tributar os bens supérfluos e de luxo;

8) Melhorar a cobrança do imposto sobre herança (previsto na Reforma);

9) Cobrar IPVA sobre embarcações e aeronaves (previsto na Reforma);

10) Aumentar a transparência sobre a tributação (previsto na Reforma).

Por fim é visto como positiva a proposta que cria um Imposto sobre Valor Agregado e de um imposto seletivo, que desestimule o consumo de bens e serviços prejudiciais à saúde e ao meio ambiente. Como também a criação imposto sobre herança e a ampliação da base de incidência do IPVA para veículos aquáticos e aéreos.

Mas o texto traz um alerta final: “se o projeto em tramitação tem aspectos positivos e equaciona problemas históricos de nosso sistema tributário, a proposta não ataca diretamente os problemas da injustiça fiscal e da regressividade tributária, que afetam diretamente a população mais pobre e trabalhadores de mais baixa renda.”