Ao criticar Lula, Zelensky mostra irritação com falta de apoio sul-americano

Presidente ucraniano criticou Lula, em entrevista, por não estar alinhado com os interesses da OTAN para isolar a Rússia

Foto: Reprodução

O presidente ucraniano Volodymyr Zelensky aproveitou uma entrevista com jornalistas latino-americanos para expressar sua irritação com as tentativas do presidente brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, de colocá-lo na mesma mesa com o presidente russo Vladimir Putin para uma negociação de paz.

Ele disse, neste domingo (6), que achava que Lula, “tivesse uma compreensão mais ampla do mundo”. Ele alegou não entender a posição de Lula, sobre a necessidade de chegar a um acordo que beneficie ambos os países. “Essas são algumas afirmações que não trazem paz de forma alguma”.

Na quarta-feira, em café da manhã com correspondentes estrangeiros, em Brasília, Lula disse que “a gente não tem ouvido nem de Zelensky nem do Putin a ideia de que vamos parar e vamos negociar”. “Por enquanto, os dois estão naquela fase de eu vou ganhar, eu vou ganhar, eu vou ganhar, eu vou ganhar, sabe? Enquanto isso, as pessoas estão morrendo”, afirmou Lula. Seu assessor especial para Assuntos Internacionais, Celso Amorim, disse, no mesmo evento com jornalistas estrangeiros, que as preocupações de segurança da Rússia não podem ser deixadas de lado nas discussões sobre qualquer acordo de paz. “Você não pode deixar de fora as preocupações de segurança da Rússia, elas são reais”, disse Amorim.

O líder ucraniano comentou as declarações considerando “estranho” falar sobre a segurança da Federação Russa. “Só a Rússia, Putin e Lula falam sobre a segurança da Rússia, sobre as garantias que precisam ser dadas para a segurança da Rússia”, disse. 

No entanto, outras lideranças do chamado Sul Global também batem nesta tecla, inclusive se posicionando com neutralidade em relação a resoluções internacionais sobre o conflito. É exatamente este sentimento ecoado entre lideranças de vários países latino-americanos, africanos e asiáticos que tem incomodado Zelensky.

A Ucrânia, como todos os países alinhados da OTAN (a aliança militar europeia e norte-americana), só aceitam pontos de vista que visem o isolamento da Rússia, portanto, não estão abertos a uma mesa de negociação que inclua Putin. 

Reafirmação de posição

O Palácio do Planalto, no entanto, apenas reafirma sua posição em relação à guerra entre Rússia e Ucrânia. Mesmo com a imprensa repercutindo a declaração, o Brasil mantém a postura de insistir num ambiente de pacificação que envolva ambos os lados.

No momento em que Zelensky fazia sua declaração, o assessor especial da Presidência do Brasil para assuntos internacionais, Celso Amorim, participava de uma reunião patrocinada pela Arábia Saudita, com cerca de 40 países, para discutir possibilidades de uma saída política para a crise entre Moscou e Kiev.

“Embora a Ucrânia seja a maior vítima, se realmente quisermos a paz, temos que envolver Moscou neste processo de alguma forma”, reafirmou o assessor de Lula, durante a videoconferência que contou com a participação da China, mas não da Rússia.

Embora, em âmbito diplomático, o Itamaraty tenha condenado a invasão da Ucrânia pela Rússia, politicamente, Lula e Amorim insistem na necessidade de um acordo que, mesmo não agradando a todos, seja capaz de interromper a escalada da guerra.

Pressão e constrangimento

Apesar da consistência da posição brasileira, e do prolongamento irracional do conflito, as declarações hostis de Zelensky parecem querer constranger e pressionar o governo brasileiro em sua posição de neutralidade.

Os esforços do presidente da Ucrânia para realizar uma reunião com os líderes dos países latino-americanos a fim de pedir apoio não têm tido sucesso. Ele tenta o apoio de Lula para organizar essa cúpula regional, onde pretende pedir armas e apoio financeiro de países que estão mergulhados em crises econômicas.

Querer envolver a América do Sul numa guerra também parece ser uma tentativa anacrônica de Zelensky. A região sempre foi, historicamente, mais inclinada à paz. Mais do que isso, o Sul Global tem demonstrado sua impaciência com o desgaste econômico que o conflito causa na cadeia produtiva internacional, dificultando a saída da crise econômica. 

De ator cômico a senhor da guerra

O ator Volodymyr era conhecido em seu país como comediante de uma série de TV, em que se tornava presidente da Ucrânia por acaso. Após um golpe em 2014, o ex-presidente Viktor Yanukovych, aliado do russo Vladimir Putin, foi derrubado e substituído pelo ator de comédia, com apoio dos Estados Unidos.

De lá pra cá, apoiou iniciativas da OTAN para cercar a Rússia com bases militares e incentivou uma política de discriminação dos russos que moram em áreas de fronteira da Ucrânia. Milícias nazistas passaram a hostilizar esses russos do leste, que agora está ocupado pela invasão armada.

As ameaças de ampliar o cerco de bases da OTAN às fronteiras russas foram o estopim para a invasão, já que a Rússia entende esse cerco como hostilidade e ameaça de invasão a seu país. Embora Putin acreditasse que fosse resolver rapidamente o impasse com seu poderio bélico, a OTAN apoiou a aventura ucraniana e deu a largada ao conflito que já dura um ano e meio.

Suas declarações nada diplomáticas contra líderes estrangeiros, inclusive aliados, têm sido toleradas por seu país estar devastado por uma guerra. Mas Zelensky já causou constrangimento ao ministro da Defesa britânico, Ben Wallace, dizendo que ele deveria demonstrar gratidão por poder ajudar. O britânico, por sua vez, disse que se sentia como a Amazon (loja) cada vez que recebia uma lista de armas de Zelensky. 

Antes disso, o presidente ucraniano fez um ataque à OTAN, anunciando que a aliança estava fornecendo à Ucrânia quantidades insuficientes de armas. Em seguida, o chefe do regime de Kiev criticou as autoridades polonesas por terem chamado o embaixador ucraniano no Ministério das Relações Exteriores deste país. Agora, sua irritabilidade chegou ao presidente do Brasil.

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