Lula leva Caravana Federativa ao RJ e acirra disputa com o bolsonarismo

Após reunir 288 prefeitos da Bahia, a nova edição desembarca em terras fluminenses em 28 e 29 de setembro. A Caravana é uma agenda administrativa e política; uma oportunidade para isolar o bolsonarismo

Lula discursa no evento de lançamento do Novo PAC, em agosto, no Theatro Municipal do Rio

Em 30 de junho passado, a ministra da Mulher, Cida Gonçalves, desembarcou em Japeri (RJ), na Baixada Fluminense, para inaugurar o primeiro Centro de Referência da Mulher do Rio de Janeiro. A primeira-dama do estado, Analine Castro, esposa do governador Cláudio Castro (PL), também estava presente.

A família Castro é do mesmo partido do ex-presidente Jair Bolsonaro, mas o clima na cerimônia de inauguração era de harmonia. O discurso da prefeita de Japeri, Fernanda Ontiveros, deu o tom dessa integração, ao dispensar palavras de reverência às duas visitantes.

À primeira-dama, ela ressaltou a “cortesia” da presença e pediu que levasse uma “mensagem de agradecimento também ao governador”, desejando “mais parcerias para o bem da população japeriense”. À ministra, Fernanda destacou “a generosidade de vir de Brasília” especialmente à solenidade para “representar o governo de reconstrução e esperança do presidente Lula”. E emendou: “Sejam sempre bem-vindos em Japeri, assim como temos sido recebidos sempre com deferência em Brasília!”.

Embora as obras do centro de referência já estivessem avançadas no primeiro semestre, a escolha do Rio para marcar a retomada dessa política pública para as mulheres não foi automática. O campo progressista luta para retomar sua influência no estado-berço do bolsonarismo, onde a direita avançou a partir do golpe de 2016.

Quando Jair Bolsonaro se elegeu presidente, em 2018, o Rio de Janeiro lhe deu uma contundente vantagem, no segundo turno, contra Fernando Haddad (PT): 67,95% a 32,05%. Mesmo com a derrota para Lula na disputa de 2022, Bolsonaro voltou a vencer em seu estado. Mas a diferença no segundo turno (56,53% a 43,47%) caiu de quase 36 pontos percentuais para pouco mais de 13.

Desde a redemocratização, o Rio vinha pendendo mais para a esquerda. Leonel Brizola (PDT), eleito governador em 1982 (ainda sob a ditadura militar) e 1990, ajudou a atrair e formar diversas lideranças sob o guarda-chuva trabalhista. Seus mandatos foram marcados por grandes investimentos em educação e pelo combate à desigualdade.

Da mesma maneira, em quatro das cinco vitórias da esquerda nas últimas eleições presidenciais, os candidatos progressistas foram os campeões de voto nas urnas fluminenses. Foi assim com Lula em 2002 e 2006, bem como com Dilma Rousseff em 2010 e 2014. A onda bolsonarista inverteu essa tendência nos dois últimos pleitos nacionais.

A luta para isolar a extrema-direita e retomar o Rio de Janeiro está em curso – e o Centro de Referência da Mulher não é o único exemplo. Foi no Theatro Municipal da capital fluminense que Lula anunciou, em 11 de agosto, o Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). O Rio será o estado com mais investimentos em todo o Brasil, totalizando R$ 342,6 bilhões em obras e serviços.

Para acirrar de vez a disputa com o bolsonarismo, o governo Lula levará para o Rio a 2ª Caravana Federativa. Após reunir 288 prefeitos da Bahia em agosto, a nova edição desembarca em terras fluminenses em 28 e 29 de setembro, no Expo Mag (antigo Centro de Convenções Sul América). Todos os 92 prefeitos do estado foram convidados.

Há um contraste evidente na escolha das regiões. O PT está à frente do governo da Bahia desde 2007 e elegeu 32 prefeitos nas eleições 2020, além de ter filiado outros posteriormente. O PCdoB também se destaca, com 16 prefeituras baianas.

Os números são mais modestos no Rio de Janeiro, onde o PT tem apenas dois prefeitos – Fabiano Horta, de Maricá, e a recém-filiada Fernanda Ontiveros, em Japeri. Lula, porém, conta com aliados importantes em gestões municipais, como os prefeitos do Rio, Eduardo Paes (PSD); de Niterói, Axel Grael (PDT); e de Belford Roxo, Waguinho. O próprio governador Cláudio Castro tem prestigiado eventos com o presidnete, em Brasília e no Rio, alguns deles sob vaias, como no lançamento do Novo PAC.

A Caravana Federativa é, assim, uma agenda administrativa e política. “O principal objetivo é levar os serviços da União diretamente às prefeituras, facilitando a vida dos gestores municipais. Em vez de eles irem a Brasília, Brasília vai até eles”, resumiu ao Valor Econômico André Ceciliano (PT-RJ), secretário de Assuntos Federativos da Presidência da República.

Segundo Ceciliano, haverá “novidades” na caravana: “Uma delas é a criação de uma cartilha com informações detalhadas sobre todos os programas e convênios existentes no governo federal, a fim de facilitar o acesso dos gestores municipais às informações que mais lhe interessam”.

Do ponto de vista administrativo, a proposta do governo Lula é bem-vinda devido às relações institucionais erráticas estabelecidas pelo governo Bolsonaro – a extinção do Ministério das Cidades foi um dos retrocessos mais criticados pelos prefeitos. Os gestores fluminenses têm muito a ganhar com a transição no governo federal, assim como Lula e a esquerda precisam aproveitar a oportunidade para isolar ainda mais Bolsonaro em seu estado.

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