China defende ação urgente em Gaza e BRICS condenam “crimes de guerra”

A cúpula com países árabes e com os parceiros BRICS reforçou o papel mediador da China, com seus laços fortes com Israel, confiança dos palestinos e peso no sistema internacional.

O ministro das Relações Exteriores da China, Wang Yi, aperta a mão de Riyad al-Maliki, ministro das Relações Exteriores da Autoridade Palestina, de gravata vermelha, em uma reunião em Pequim na segunda-feira.

Nas últimas horas, a China se declarou mais assertivamente que nunca sobre o conflito Israel-Palestina em duas cúpulas importantes, além da atuação que já mantém na Presidência rotativa do Conselho de Segurança da ONU. Recebeu, nesta segunda (20), autoridades árabes e muçulmanas em Pequim para discutir o assunto, e, nesta terça-feira (21), os líderes do grupo BRICS, composto por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, condenaram veementemente a guerra de Israel em Gaza durante uma cúpula virtual presidida pelo presidente sul-africano Cyril Ramaphosa.

Em uma iniciativa para desempenhar um papel ativo na busca por um cessar-fogo na guerra de Israel em Gaza, o ministro das Relações Exteriores da China, Wang Yi, instou a comunidade internacional a “agir urgentemente” durante uma reunião em Pequim nesta segunda-feira (20). Autoridades da Arábia Saudita, Jordânia, Egito, Autoridade Palestina e Indonésia, além do chefe da Organização de Cooperação Islâmica (OCI), participaram do encontro de dois dias.

“A China acredita que a consolidação da solução de dois Estados é a melhor forma de alcançar a justiça e a equidade neste conflito”, afirmou Wang aos líderes visitantes. Ele enfatizou que a China defende “firmemente a justiça e a imparcialidade” na questão.

O chefe da diplomacia chinesa sugeriu uma ação conjunta entre países asiáticos para avançar na solução de dois Estados, com a consolidação do Estado palestino. Wang ressaltou que “a China estará sempre do lado da justa causa dos direitos dos povos”.

Os ministros visitantes expressaram fortes apelos pelo fim do conflito, com o ministro de Relações Exteriores da Arábia Saudita, Faisal bin Farhan Al Saud, declarando que “a guerra deve parar imediatamente”. Eles manifestaram a intenção de cooperar com a China e “todos os países responsáveis” para enfrentar a gravidade da situação.

Riyad al-Maliki, chanceler da Autoridade Palestina, enfatizou a urgência de medidas concretas para mudar o cenário do conflito e salvar vidas em Gaza. “Propostas que estamos avaliando devem ser adotadas o quanto antes”, afirmou al-Maliki, destacando a ameaça à vida dos palestinos.

A reunião ocorre em meio a informações de que um possível acordo para libertar alguns reféns e pausar os combates pode estar próximo, após semanas de negociações mediadas pelo Catar entre Estados Unidos, Israel e o grupo militante. Wang criticou a retaliação de Israel, pedindo o fim da punição coletiva e a abertura de um corredor humanitário.

Contraponto entre as potências

A China tem buscado desempenhar um papel ativo na resolução do conflito, contrastando com a abordagem dos Estados Unidos, tradicional mediador na região. Pequim enviou um enviado de paz à região no mês passado e pressionou por um cessar-fogo nas Nações Unidas, durante esta sua presidência rotativa do CS em novembro.

Na semana passada, o Conselho de Segurança aprovou sua primeira resolução sobre o conflito, apelando à libertação imediata de reféns e à criação de corredores humanitários em Gaza. A China, que presidiu a sessão, elogiou a decisão, enquanto EUA e Reino Unido se abstiveram.

O conflito oferece à China uma oportunidade de fortalecer laços com países árabes. Wang destacou o apoio chinês aos direitos e interesses legítimos dos países árabes e muçulmanos, respaldando os esforços palestinos para restaurar seus direitos e interesses nacionais legítimos.

Pequim, em desacordo com Washington sobre um cessar-fogo imediato, continua a se posicionar como um ator importante na busca por uma solução justa e duradoura para o conflito em Gaza.

Alerta dos BRICS ao Norte Global

Em uma ação notável, o BRICS, que historicamente focava em questões econômicas, pediu o fim dos “crimes de guerra” e instou ambas as partes a cessarem as hostilidades para aliviar a crise humanitária na região.

A denúncia veio em resposta aos ataques a civis tanto na Palestina quanto em Israel. O grupo expressou preocupação com o deslocamento forçado de palestinos, classificando-a como “crimes de guerra”. O presidente sul-africano destacou que as ações de Israel violam o direito internacional, classificando a punição coletiva de civis palestinos como equivalente a um crime de guerra e genocídio.

Embora o grupo BRICS não tenha emitido uma declaração conjunta, o “resumo do presidente” refletiu a crescente assertividade do Sul Global ao abordar questões geopolíticas sensíveis. A reunião contou com a participação de líderes de países recém-adicionados ao BRICS: Egito, Etiópia, Argentina, Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Irã.

O secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, também esteve presente, destacando o crescente apelo global para encerrar o conflito em Gaza. A posição do Sul Global se destaca, criticando a postura dos Estados Unidos, Reino Unido e União Europeia, que, apesar de se autodenominarem defensores da democracia e dos direitos humanos, apoiam a guerra de Israel.

Embora a Índia tenha adotado uma posição mais moderada, apelando à contenção e ao apoio humanitário imediato, outros países como Rússia e Brasil já haviam criticado os ataques de Israel, enquanto a China reforçou seus posicionamentos ao receber a delegação de países muçulmanos, buscando um cessar-fogo.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse que os Brics precisam atuar para evitar que a guerra se espalhe para outros países. Ainda de acordo com o presidente brasileiro, o conflito no Oriente Médio é fruto de décadas de frustração e injustiça, representada pela ausência de um lar seguro para o povo palestino. “É fundamental acompanhar com atenção a situação na Cisjordânia, onde os assentamentos ilegais israelenses continuam a ameaçar a viabilidade de um Estado palestino”, enfatizou o presidente.

A África do Sul, com uma história marcada pelo apartheid, tem sido um dos mais veementes defensores de um cessar-fogo, mesmo sendo o maior parceiro comercial de Israel no continente africano. Na terça-feira, o Parlamento sul-africano votou pelo encerramento da embaixada de Israel em Pretória, sinalizando uma mudança significativa na relação bilateral. Israel, em resposta à crescente hostilidade, chamou de volta seu embaixador na África do Sul.

A postura dos BRICS, tradicionalmente evitando questões políticas e de segurança, marca uma mudança significativa. Combinados, esses países representam 40% da população mundial e um quarto da economia global. O grupo tem buscado uma voz mais proeminente na ordem global, desafiando a hegemonia ocidental liderada pelos Estados Unidos.

Enquanto a África do Sul, em particular, tem influenciado a postura do grupo em relação ao conflito em Gaza, o impacto real na direção da guerra de Israel permanece incerto. No entanto, os BRICS estão se tornando um bloco mais assertivo, buscando uma ordem mundial mais equitativa e diversificada.

As reuniões são um sinal de que a China, o país mais rico do bloco, está intensificando o seu papel internacional, preenchendo o vazio de poder deixado pelos EUA, segundo o analista político Ibrahim Fraihat, em análise feita para a Aljazira. “Os EUA deram um tiro no próprio pé ao lançar todo o seu peso ao lado de Israel e, ao fazê-lo, diminuíram o seu papel como intervenientes terceiros credíveis”, disse Fraihat, do Instituto de Pós-Graduação de Doha.

“As autoridades chinesas estão muito interessados ​​neste papel – têm laços fortes com Israel, têm a confiança dos palestinos e peso no sistema internacional”, acrescentou, referindo-se ao poder de veto da China no Conselho de Segurança da ONU.

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