Milei afunda Argentina e já é rejeitado por 52,8%

De acordo com pesquisa, 46,75% dos argentinos reprovam a Lei Ônibus e 59,4% contestam sua eventual imposição por decretos

O ultradireitista Javier Milei não teve os chamados “cem dias de lua de mel” como presidente. Na realidade, a paciência dos argentinos se esgotou em não mais do que algumas semanas. A Casa Rosada tentou associar a audaciosa greve geral de 24 de janeiro aos “baderneiros” do movimento sindical, mas uma recente pesquisa deixa claro que a rejeição do povo com o governo é crescente e generalizada.

Eleito presidente com contundentes 55,65% dos votos válidos, Milei já perdeu, precocemente, seu capital político. Levantamento do instituto Zuban Córdoba divulgada nesta segunda-feira (29), passados apenas 50 dias do início do mandato, mostra que 52,8% da população “desaprova totalmente” a gestão Milei. Além disso, para 54,4%, a Argentina “caminha na direção errada”, em meio ao “choque” econômico e aos retrocessos anunciados pelo novo presidente.

Na avaliação de Gustavo Córdoba e Ana Paola Zuban, responsáveis do instituto Zuban Córdoba pela pesquisa, Milei é vítima dos “consensos precários” que determinaram a eleição dos últimos presidentes argentinos. Segundo eles, “os governos agem sempre como se esses consensos fossem eternos ou permanentes e abusam deles até se desgastarem, gerando processos agravados de queda da confiança ou de credibilidade, que acabam afetando gravemente o resto do mandato”.

O autoritarismo é outro aspecto que desgasta o governante do sinistro partido A Liberdade Avança. No mesmo dia da greve geral, a Justiça da Argentina atendeu a uma “ação de proteção” da central sindical CGT (Confederação Geral do Trabalho) e anulou seis artigos da reforma trabalhista de Milei. Segundo a juíza trabalhista Liliana Rodríguez Fernández – que assinou a decisão –, não há nenhuma base legal para que essas mudanças na legislação sejam feitas via DNU (Decreto de Necessidade e Urgência), e não por projeto de lei.

O revés influenciou a opinião pública. Embora o governo tenha recuado em vários pontos da Lei Ônibus – que promove uma desregulamentação geral da economia –, os argentinos temem uma investida antidemocrática de Milei para implantar seu pacote ultraliberal. De acordo com a pesquisa, 46,75% reprovam a Lei Ônibus e 59,4% contestam sua eventual imposição por decretos.

O recado está dado: a exemplo do que ocorreu no Brasil durante o governo Jair Bolsonaro (PL), é possível que a breve experiência de Milei no poder já tenha despertado uma reação mais suprapartidária em defesa da democracia.  Com minoria no Congresso, o presidente argentino tinha condições de formar uma base mais ampla, não fossem suas tentações arbitrárias.

Um dos poucos dados favoráveis a Milei na pesquisa é que 45,9% atribuem a crise econômica a seu antecessor, Alberto Fernández. Por ora, somente 39,1% se deram conta de que, se a crise está ainda mais agravada, a responsabilidade é do atual presidente. O problema é que esse suposto trunfo tem validade.

Nesta terça-feira (30), enquanto o governo digeria os amargos índices de impopularidade, o FMI (Fundo Monetário Internacional) revelou que suas previsões para a Argentina pioraram sensivelmente. Em outubro, a instituição estimava um crescimento de 2,8% do PIB argentino em 2024. Agora, com as medidas de Milei, o país deve ter uma contração: -2,8% no ano.

O número é ainda pior que o projetado pelo Banco Central da Argentina, que prevê uma queda de 2,6% na economia. A isso se soma a hiperinflação, que não para de crescer e já é a maior da América Latina. Para muitos analistas argentinos, a dúvida não é mais se Milei vai ou não vai cair antes do fim de seu mandato – mas quando isso ocorrerá, para o bem do povo argentino.

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