Inflação na Argentina alcança 276,2%, maior índice desde 1991

Governo Milei celebra índice sazonal menor, mas a ameaça de nova aceleração em março é considerada certa pelo mercado.

A inflação na Argentina atingiu 276,2% em fevereiro, marcando o índice mais alto desde maio de 1991, revelou o Instituto Nacional de Estatística e Censos (Indec) nesta terça-feira. Este aumento representa um desafio significativo para o governo do presidente Javier Milei, que celebrou o índice mensal mais baixo em fevereiro em comparação com janeiro, apesar das previsões de novos aumentos em março.

Em janeiro, a inflação anualizada estava em 254,2%, mas subiu para 276,2% em fevereiro. Apesar disso, o índice mensal caiu para 13,2%, em comparação com os 20,6% registrados em janeiro. Em fevereiro de 2023, no entanto, o índice havia subido metade deste ano – 6,6%. O governo de Milei interpretou esse declínio mensal como um sinal de sucesso em suas políticas fiscais, destacando a importância de uma forte disciplina fiscal para combater a inflação.

Entre as medidas promovidas por Milei, desde janeiro, está a desvalorização do peso: US$ 1 passou a valer 800 pesos (valia 365 pesos). Houve aumento de imposto de importações e suspendeu novos editais de obras públicas e cancelou licitações que ainda não começaram. A redução do subsídio a energia e transporte aumentou contas de luz e gás, assim como tarifas de trens e ônibus. Houve ainda redução de recursos para as províncias, suspensão de publicidade de governo e contratações de servidores, assim como cortes na estrutura de governo. Os cortes em programas sociais geridos por intermediários foram abandonados e as importações foram incentivadas.

Após o anúncio do dado do Indec, Milei expressou satisfação com o progresso na contenção da inflação, mas reconheceu que ainda há desafios pela frente. “Estamos verdadeiramente muito satisfeitos com as nossas conquistas. Ninguém esperava que alcançássemos um processo de desinflação tão rápido”, afirmou Milei. Ele enfatizou que, apesar dos números ainda elevados, o governo está comprometido em continuar trabalhando para conter a inflação.

Controlar a inflação é fundamental para os planos do governo de Milei, especialmente no contexto da oferta de troca de títulos da dívida que está sendo promovida pela equipe econômica. Esta operação, destinada a substituir bônus que vencem este ano por títulos com vencimentos entre 2025 e 2028, é a maior troca de títulos da história do país e deve movimentar o equivalente a US$ 65 bilhões.

Aceleração inflacionária continua

No entanto, analistas argentinos alertaram que março provavelmente testemunhará uma nova aceleração na taxa de inflação. Eles apontam para dois fatores sazonais importantes: fevereiro, sendo um mês mais curto, historicamente tem inflações mais baixas, enquanto março geralmente enfrenta aumentos de preços devido ao aumento do custo de materiais e às mensalidades escolares. Os primeiros indicadores de março já apontam uma possível aceleração dos preços.

No entanto, especialistas alertam que o alto índice de inflação continua a representar um risco para a economia argentina. Os setores mais afetados pelos aumentos de preços em fevereiro foram comunicação, transporte e habitação, especialmente devido ao corte de subsídios do governo, enquanto recreação e cultura, e vestuário e calçados, registraram as menores variações.

Apesar das medidas tomadas pelo governo para aliviar as pressões inflacionárias, como a facilitação na importação de itens da cesta básica, os analistas ainda preveem desafios pela frente. Milei enfatizou a importância de abrir o mercado para concorrência, visando acelerar o processo de desinflação, algo que pode levar à destruição do setor produtivo nacional. A economia argentina enfrenta uma forte recessão este ano, e os salários ajustados pela inflação estão no nível mais baixo desde 2003.

Milei busca conter os aumentos de preços para manter o apoio da população. Controlar a inflação é crucial para o sucesso dos planos governamentais. No entanto, apesar dessas medidas, há preocupações sobre a inflação de março, influenciada pelos reajustes das pensões e outros fatores sazonais complicados.

O presidente do Banco Central, Santiago Bausili, justificou um recente corte de juros de 100% para 80%, citando uma expectativa de desaceleração dos preços. No entanto, reconheceu que o nível de inflação ainda é alarmante e continua a corroer a renda da população.

Mergulho na recessão

Embora a flexibilização monetária possa indicar uma desaceleração da inflação, o país enfrenta uma forte recessão este ano, resultante das medidas de austeridade implementadas para conter os gastos sociais. O ex-presidente, Alberto Fernández, lançou duras críticas à gestão econômica de seu sucessor, alertando para as graves consequências sociais decorrentes das políticas implementadas pelo governo.

Nas redes sociais, Fernández expressou sua preocupação, comparando números de sua gestão com a de Milei. Ele destacou as consequências negativas do atual cenário econômico, incluindo aumento descontrolado dos preços, crescimento do desemprego, elevação da pobreza e estagnação econômica.

“Menos produção, menos emprego, menos consumo e mais marginalização são as consequências diretas das políticas implementadas pelo governo nacional”, afirmou Fernández. “Esses dados nos remetem aos momentos mais críticos da nossa história, exigindo uma mudança imediata de rumo por parte do governo”, completou.

Por outro lado, o porta-voz da Presidência, Adorni, rebateu as críticas de Fernández, culpando-o pela condição econômica atual, um jogo de empurra-empurra que o argentino não suporta mais. O governo de Maurício Macri, anterior ao de Fernández, era acusado pelos empréstimos que enterraram a economia argentina.

“Aqueles que professaram apatia, empobrecendo e hipotecando o futuro de tantos, devem finalmente compreender que nós, argentinos, optamos por seguir em frente, deixando para trás o populismo e o engano”, afirmou Adorni. “Foi decidido ter um futuro digno e próspero: para isso, informo que algumas questões não farão mais parte do caminho”, concluiu. Com isso, deixa claro que as medidas deverão desagradar principalmente a maioria mais pobre.

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