Homens negros morrem 4 vezes mais por disparos de arma, revela Çarê-IEPS

Entre as vítimas de disparos de arma de fogo no Brasil em vias públicas, 10.764 eram homens negros, contra 2.406 homens brancos

Rio de Janeiro – Mães e familiares de jovens negros mortos por policiais protestam contra a violência com ativistas da Anistia Internacional em frente à Igreja da Candelária (Fernando Frazão/Agência Brasil)

Em 2022, 10.764 homens negros morreram em vias públicas por disparos de arma de fogo no Brasil, enquanto 2.406 homens brancos foram vítimas da mesma causa. Esses dados, que revelam uma taxa de mortalidade quatro vezes maior para negros, são um dos principais achados do Boletim Çarê-IEPS n. 4. A pesquisa analisou taxas de internações e mortalidade por agressões entre 2012 e 2022, evidenciando a profunda desigualdade racial.

Sob o tema Internações e Mortalidade Decorrentes de Agressões Segundo Raça/Cor, a pesquisa é elaborado por pesquisadores da Cátedra Çarê-IEPS, uma parceria entre o Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (IEPS) e o Instituto Çarê.

Desigualdades raciais e mortalidade

Entre 2012 e 2018, as mortes de homens negros por disparos de arma de fogo em vias públicas foram o dobro das de homens brancos. O pico dessa disparidade ocorreu em janeiro de 2017, quando a taxa mensal de óbito para homens negros atingiu 2,79 mortes por 100 mil habitantes, enquanto a taxa para homens brancos foi de 0,9 óbitos. Em termos absolutos, isso representa 1.588 mortes de homens negros contra 399 mortes de homens brancos. Entre 2019 e 2022, houve uma queda na mortalidade total, mas a diferença entre negros e brancos permaneceu significativa.

Rony Coelho, pesquisador do IEPS e integrante da Cátedra Çarê-IEPS, explica que esses dados refletem as desigualdades estruturais do país, revelando uma maior vulnerabilidade da população negra às agressões. “O Boletim apresenta uma dura realidade já conhecida contra a população negra, representada por desigualdades nos dados de segurança pública, saúde, mortalidade e internações hospitalares. O que chama atenção nos dados é que a população negra não sofre somente com a violência letal, mas também é mais atingida por agressões que levam a hospitalizações. Ou seja, enfrenta a violência de forma generalizada”, afirma Coelho.

Violência contra mulheres negras

A desigualdade racial na mortalidade por disparos de arma de fogo também afeta as mulheres negras. Entre 2012 e 2022, as taxas de mortalidade por essa causa para mulheres negras foram significativamente superiores às das mulheres brancas. Em 2018, a taxa mensal de óbito para mulheres negras ultrapassou 0,10 mortes por 100 mil habitantes, enquanto a taxa para mulheres brancas foi abaixo de 0,05 óbitos. Em 2022, foram registradas 629 mortes de mulheres negras comparadas a 207 de mulheres brancas, um número três vezes maior.

Além disso, mulheres negras estão mais vulneráveis a todos os tipos e locais de agressão. Em 2012, houve 814 mortes de mulheres negras em vias públicas, 631 mortes no domicílio e 654 em hospitais. Para mulheres brancas, os números foram 302, 422 e 342, respectivamente.

Mortalidade por agressões no Brasil

O Boletim Çarê-IEPS n. 4 também analisou a mortalidade decorrente de todos os tipos de agressões, incluindo objetos cortantes, agressões físicas e disparos de arma de fogo. Em todos os casos, pessoas negras foram as mais afetadas. Em 2012, morreram em média 1.196 brancos por agressões contra 3.188 negros. Em 2017, o ano com maior média mensal, foram 1.166 registros para brancos e 4.008 para negros. Em 2022, houve 747 mortes de pessoas brancas por agressões contra 2.712 de pessoas negras.

Internações por agressões

Entre 2012 e 2022, os registros de internações de pessoas negras por agressões mais que dobraram, passando de 1.146 para 2.745 na média móvel de 12 meses. As médias móveis das taxas de internação subiram de 0,107 para 0,228 no mesmo período, registrando um aumento de 113%. As taxas de internação para a população branca permaneceram estáveis.

Apesar do aumento registrado, o boletim destaca que a melhora na coleta de dados de raça/cor no Sistema de Informações Hospitalares (SIH) pode contribuir para essa alta, devido à redução na proporção de dados “sem informação” entre 2012 e 2022.

Jovens negros: principais vítimas

Entre 2010 e 2021, jovens negros de 18 a 24 anos apresentaram taxas de mortalidade significativamente mais altas em comparação com jovens brancos. Essa discrepância racial é observada em quase todas as faixas etárias masculinas, reduzindo-se apenas a partir dos 45 anos. As mulheres, embora tenham taxas de mortalidade geral inferiores às dos homens, também mostram desigualdades raciais: mulheres negras possuem taxas ligeiramente maiores de mortalidade em comparação às mulheres brancas, embora as diferenças sejam menos pronunciadas.

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