China pode assumir mediação entre Irã e Israel após escalada do conflito

Condenando o ataque israelense ao Irã e apelando por diálogo, Pequim procura se afirmar como alternativa diplomática aos EUA

Pequim mantêm parcerias estratégicas tanto com Israel, como Irã, o que favorece a mediação do conflito

O ataque aéreo israelense ao Irã, na sexta-feira (13), acendeu o alerta de uma possível guerra regional. Diante da gravidade da crise, a China se apresentou como uma voz alternativa aos Estados Unidos e ofereceu mediar as tensões entre os dois inimigos históricos. No fim de semana, o chanceler chinês Wang Yi conversou por telefone com seus homólogos iraniano e israelense, condenou a ação de Israel e declarou que Pequim está pronta para “desempenhar um papel construtivo” na busca por uma solução pacífica.

“A China condena explicitamente a violação por Israel da soberania, segurança e integridade territorial do Irã”, afirmou Wang Yi ao ministro das Relações Exteriores iraniano, Seyed Abbas Araghchi, no sábado (14). A posição de Pequim marca um contraste com sua neutralidade em outras crises internacionais, como a guerra na Ucrânia, e evidencia a crescente disputa geopolítica com os EUA, mergulhado em crises internas e com aliados comerciais.

Uma nova disputa de protagonismo diplomático

A ofensiva de Israel – que atingiu complexos militares e nucleares iranianos – foi justificada pelo premiê Benjamin Netanyahu como uma tentativa de “reverter uma ameaça existencial”, embora o Irã não tenha sinalizado nenhum ataque até então. A partir da agressão “preventiva” israelense, os dois países têm trocado ataques, aumentando o número de vítimas e o risco de um conflito regional mais amplo.

Nesse cenário, a China busca se posicionar como mediadora, apostando em sua crescente presença econômica e diplomática no Oriente Médio. “A China insta os países que têm influência sobre Israel a fazerem esforços concretos para restaurar a paz”, disse Wang. Em conversa com o ministro israelense Gideon Sa’ar, Wang pediu que as partes “resolvam suas diferenças por meio do diálogo”.

Relações complexas com os dois lados

Pequim mantém laços estratégicos tanto com o Irã quanto com Israel. Desde 2021, tem um acordo de cooperação de 25 anos com Teerã, incluindo investimentos chineses de US$ 400 bilhões em infraestrutura em troca de petróleo iraniano. Também tem se oposto sistematicamente às sanções norte-americanas contra o Irã.

Por outro lado, Israel e China colaboram em setores como defesa e tecnologia, com histórico de parcerias no desenvolvimento de aviões e mísseis. Apesar disso, os vínculos entre Washington e Tel Aviv são incomparavelmente mais estreitos do que os de Pequim com Teerã ou Jerusalém.

Segundo analistas afirmaram nas agências internacionais, a influência da China sobre o Irã é real, mas limitada, e dificilmente será decisiva sem o envolvimento direto dos EUA – ainda considerado o principal ator de segurança regional. Mesmo assim, a tentativa de mediação reforça a narrativa chinesa de oferecer uma ordem internacional “mais equilibrada”, sobretudo diante de países do Sul Global, críticos da ofensiva israelense em Gaza e de sua escalada contra o Irã.

Rivalidade com os EUA e disputa pela legitimidade internacional

A China acusa Washington de ser “fonte de instabilidade” no Oriente Médio e de adotar padrões duplos em relação a soberania e segurança. Em sua fala mais contundente até agora, o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores chinês, Lin Jian, disse na sexta-feira (13) que “a China se opõe a qualquer violação da soberania, segurança e integridade territorial do Irã” e alertou para o risco de escalada.

Questionado sobre uma possível retaliação iraniana com o fechamento do estratégico Estreito de Ormuz – por onde passa um quarto do petróleo mundial –, Lin recusou-se a comentar cenários hipotéticos. O país asiático, maior comprador de petróleo iraniano, tem forte interesse na estabilidade da região.

Entre a paz e a geopolítica

Pequim já teve sucesso inesperado na mediação entre Irã e Arábia Saudita em 2023, o que fortaleceu sua intenção de atuar como potência diplomática global. Agora, tenta repetir a fórmula entre Teerã e Tel Aviv. Mas a complexidade do conflito e os laços ocidentais com Israel tornam o desafio muito maior.

Nos EUA, o presidente Donald Trump disse no domingo (16) estar “trabalhando para apaziguar o conflito” e sugeriu até a possibilidade de o presidente russo Vladimir Putin atuar como mediador. “Eu estaria aberto a isso. Ele está pronto”, afirmou o republicano, sinalizando uma reaproximação com Moscou, que também condenou o ataque israelense.

Mesmo com seu papel ainda incerto, a iniciativa chinesa reforça uma nova dinâmica internacional: em um mundo multipolar, mais potências buscam disputar os rumos da diplomacia global — e a paz, quando possível, também se torna terreno de disputa estratégica.

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