Ameaças de Trump para “mudança de regime” no Irã elevam tensão no Oriente Médio
Movimentações militares norte-americanas no Oriente Médio coincidem com declarações incendiárias de Trump e Netanyahu, que endossam a queda do governo iraniano. Filho do ex-xá do Irã também pede o fim da República Islâmica
Publicado 18/06/2025 17:38 | Editado 18/06/2025 18:57

Os Estados Unidos voltam a dar sinais de que podem escalar perigosamente seu envolvimento em uma guerra contra o Irã, acirrando a instabilidade no Oriente Médio e com possíveis repercussões globais. Declarações recentes do ex-presidente Donald Trump e ações concretas das Forças Armadas norte-americanas indicam uma guinada ainda mais agressiva.
Trump sugeriu, de forma direta, que poderia ordenar o assassinato do atual líder iraniano, o aiatolá Ali Khamenei — repetindo a lógica usada em 2020, quando o general Qasem Soleimani foi morto por um drone norte-americano em Bagdá.
Além das palavras, os atos: o Pentágono confirmou o deslocamento de novas baterias antimísseis e navios de guerra rumo ao Golfo Pérsico. A movimentação ocorre em meio a crescentes tensões com Teerã, acusado por Washington de apoiar milícias e grupos de resistência contra Israel e contra a ocupação militar de territórios palestinos.
Apesar de negar o envolvimento, Casa Branca foi avisada dos planos israelenses. Em entrevista à Fox News, na última sexta (13), dia do primeiro ataque de Israel à capital israelense, Trump afirmou que sabia que Israel atacaria o Teerã e ressaltou que o Irã “não pode ter uma bomba nuclear”.
Air Force One
Na terça (17), Donald Trump deu sinais de que os EUA estão prontos para agir contra o Irã. O presidente tentou dar um ultimato ao líder supremo do Irã, o aiatolá Ali Khamenei, e afirmou que não vão matá-lo “por enquanto”, mas que a “paciência está se esgotando”.
“Não estou muito a fim de negociar com o Irã”, disse ele a repórteres a bordo do Air Force One, retornando mais cedo da Cúpula do G7 no Canadá.
Autoridades disseram que Trump abandonou a ideia de enviar altos funcionários para um local mutuamente acordado no Oriente Médio para se reunir com os iranianos e tentar fechar um acordo sobre o programa nuclear. “Espero que o programa deles seja eliminado muito antes disso. Eles não terão uma arma nuclear”, disse Trump.
Em sua rede social, Trump afirmou que não teve nenhuma “conversa de paz” com o Irã. “Isso é apenas mais uma NOTÍCIA FALSA COMPLETAMENTE INVENTADA! Se eles quiserem conversar, sabem como me encontrar. Deveriam ter aceitado o acordo que estava sobre a mesa”, afirmou o presidente norte-americano.
Segundo o New York Times, a proposta pede que o Irã interrompa completamente o enriquecimento de urânio e propõe a criação de um grupo regional para produzir energia nuclear, que incluiria Irã, Arábia Saudita e outros países árabes, além dos Estados Unidos.
Enquanto embarcava de volta aos EUA, Trump afirmou que deseja “um verdadeiro final” para o conflito: “Não estou buscando um cessar-fogo, estamos buscando algo melhor do que um cessar-fogo”. Ele enfatizou que deseja que o Irã “ceda completamente” e que busca um “fim real, não um cessar-fogo”.
“Mudança de regime” volta ao vocabulário ocidental
Em consonância com Trump, o premiê israelense Benjamin Netanyahu tem intensificado o discurso de que a única solução para a estabilidade regional seria a derrubada do governo iraniano. Em recentes entrevistas, Netanyahu foi explícito: “O Irã precisa ser neutralizado, e o regime atual removido. Sem isso, não haverá paz.”
Reforçando esse coro, Reza Pahlavi, filho do último xá iraniano deposto pela Revolução Islâmica de 1979, declarou publicamente que “o regime dos aiatolás deve cair para que o Irã volte ao seio da civilização ocidental.” Pahlavi, que vive no exílio e mantém contato com setores da inteligência norte-americana e israelense, tem ganhado espaço em fóruns e mídias ocidentais como suposta alternativa ao atual governo iraniano.
Risco de expansão do conflito para além do Oriente Médio
O aumento das tensões não se restringe à retórica. Com o cerco militar sendo apertado, cresce o temor de que o Irã responda com ataques diretos ou indiretos, por meio de grupos aliados no Líbano, Síria, Iraque ou Iêmen. Analistas alertam para a possibilidade de um conflito regional escalar rapidamente para uma guerra de dimensões internacionais.
Países europeus têm demonstrado preocupação com a escalada belicista norte-americana, mas até agora mantêm silêncio diante das movimentações que podem violar normas internacionais. A Rússia e a China, por sua vez, vêm reforçando sua aliança com Teerã, o que aumenta o risco de uma confrontação entre potências nucleares em território estratégico.
Interesses geopolíticos por trás do confronto
O endurecimento do discurso contra o Irã não pode ser dissociado da disputa pelo controle das rotas de energia e influência regional. O Estreito de Ormuz, por onde passa cerca de 20% do petróleo mundial, segue sob constante vigilância militar. Qualquer conflito nessa região pode provocar choques nos preços globais do petróleo, agravando crises econômicas em diversas partes do mundo.
Além disso, o Irã faz parte dos BRICS, grupo de países emergentes que passou a desafiar a ordem unipolar liderada pelos Estados Unidos. A retórica contra Teerã também se insere nesse contexto, buscando conter o avanço de projetos multipolares e preservar a hegemonia estratégica norte-americana no Oriente Médio.
Ecos de uma guerra anunciada
A combinação de ameaças explícitas, movimentação militar e articulação discursiva para a “mudança de regime” ecoa os mesmos mecanismos usados na invasão do Iraque em 2003. Naquela ocasião, também foram mobilizadas falsas alegações de ameaça iminente e apelos à “libertação” do povo iraquiano. O saldo, como se sabe, foi a destruição do país, centenas de milhares de mortos e o surgimento de novos grupos radicais.
Diante disso, cresce o alerta entre setores da diplomacia internacional e da sociedade civil: uma nova guerra contra o Irã pode não apenas incendiar o Oriente Médio, mas mergulhar o mundo em mais uma espiral de caos e insegurança global.