Ato de Bolsonaro evidencia esvaziamento político e público em meio a julgamento no STF
Com apenas 12,4 mil presentes, manifestação em defesa do ex-presidente reúne menos lideranças, expõe fadiga da militância e ocorre sob sombra da ação penal por tentativa de golpe
Publicado 29/06/2025 17:24 | Editado 30/06/2025 13:10

O ato em defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), realizado neste domingo (29) na Avenida Paulista, revelou um cenário de esvaziamento significativo tanto do ponto de vista popular quanto político. Segundo levantamento do Monitor do Debate Político da USP e do Cebrap, apenas 12,4 mil pessoas participaram da manifestação — uma queda expressiva em relação às 44,9 mil registradas em abril e aos 185 mil de fevereiro de 2024.
No palanque, o número de lideranças também foi menor. Apenas quatro governadores compareceram: Tarcísio de Freitas (SP), Cláudio Castro (RJ), Romeu Zema (MG) e Jorginho Mello (SC). Ausências notáveis, como Michelle Bolsonaro, Nikolas Ferreira e outros expoentes do bolsonarismo, ampliaram a percepção de desgaste.
Tentativa de mostrar força em meio ao julgamento no STF
Organizado pelo pastor Silas Malafaia, o ato foi convocado sob o lema “Justiça Já”, em meio ao avanço da ação penal no Supremo Tribunal Federal que julga Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado. A manifestação também criticou o STF e, especialmente, o ministro Alexandre de Moraes, relator do caso.
Em seu discurso, Bolsonaro negou ter tentado um golpe em 2022, afirmou ter feito uma “transição pacífica” e voltou a atacar o Supremo. Em tom messiânico, disse que “com 50% da Câmara e do Senado” mudaria “o destino do Brasil”, mesmo sem ser presidente.
Crise de mobilização: desgaste e rejeição à anistia
O ato acontece num momento em que a pauta da anistia aos golpistas de 8 de janeiro perdeu força no Congresso, e a base bolsonarista dá sinais de cansaço. Mesmo com tentativas de mobilização pelas redes, a convocação teve menor alcance, segundo especialistas. O Dia Mundial do Skate, comemorado por jovens na Praça Roosevelt, próxima ao local, acabou por gerar até confrontos pontuais com os manifestantes.
Para o professor Pablo Ortellado, da USP, a diferença entre o ato de hoje e o de abril é tão expressiva que não pode ser atribuída apenas a variáveis de calendário ou clima político. “É difícil especular que a pauta da anistia tenha esfriado junto com a militância, mas o recuo foi visível”, avaliou.
Tarcísio e Malafaia assumem protagonismo
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, foi o nome mais celebrado entre os presentes. Fez um discurso em nome dos demais governadores, pedindo “anistia, justiça e a volta de Bolsonaro”. Ao lado de Malafaia, liderou os ataques ao STF e ao governo Lula. Tarcísio enfrenta o desgaste arriscando agregar o voto bolsonarista numa eventual disputa presidencial.
Malafaia, por sua vez, tentou minimizar a baixa adesão: “É menos importante o número [de participantes] do que o que vou dizer aqui”, disse, antecipando-se às críticas. Ele atacou os xingamentos de jovens skatistas qualificando-os de “esquerda hipócrita”.
Futuro eleitoral nebuloso para Bolsonaro
Além da ação no STF, Bolsonaro enfrenta duas condenações no Tribunal Superior Eleitoral e está inelegível até 2030. A aposta em uma eventual aprovação de anistia no Congresso esbarra na impopularidade da proposta: segundo pesquisa Genial/Quaest, 56% dos brasileiros rejeitam a anistia aos golpistas.
Mesmo entre seus eleitores de 2022, o apoio à anistia integral é minoritário: apenas 36% acham que os presos não deveriam ter sido detidos, enquanto outros 57% defendem que continuem presos ou que já cumpriram pena suficiente.
Congresso do PL e dilema da candidatura
O ato também expôs divisões internas no PL. Sem a presença de Michelle Bolsonaro e outras figuras estratégicas, e com pouco respaldo de prefeitos e deputados federais, a manifestação reforçou as dúvidas sobre quem será o nome da direita em 2026. Bolsonaro tenta manter-se no centro da cena, mas esbarra em limitações jurídicas e políticas crescentes.
A tentativa de pressão popular sobre o Supremo e o Congresso esbarra hoje em uma militância menos mobilizada, um desgaste de imagem e um cenário jurídico adverso. A foto da Paulista, neste domingo, é emblemática: menos bandeiras, menos vozes e mais silêncio em torno de um líder agora no banco dos réus.