No Uruguai, Brasil retoma o ritmo da integração do Mercosul
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva assumiu nesta segunda-feira (26/2) o papel de irmão mais velho no Mercosul e visitou seu colega do Uruguai, Tabaré Vázquez, com uma única missão: atender o crescente descontentamento deste país com o bloco regional.
Publicado 27/02/2007 14:47
“O Brasil tem de assumir suas responsabilidades por ser a maior economia do Mercado Comum do Sul e, portanto, realizar o esforço para que o comércio (dentro do bloco) seja o mais equilibrado possível”, disse o mandatário brasileiro aos jornalistas após assinar uma série de acordos bilaterais.
O presidente Lula destacou a necessidade de se chegar a entendimentos acima das diferenças sobre tamanho entre as nações que integram o Mercosul, buscando os equilíbrios e benefícios, “para que todos os países igualmente sejam contemplados em suas aspirações”. Por sua vez, Vázquez disse que encontrou em seu colega a melhor compreensão para superar os desequilíbrios entre as duas nações nos campos econômico, geográfico e populacional, a favor das necessidades reclamadas e requeridas pelos países menores do bloco, também integrado por Argentina, Paraguai e Venezuela. O Uruguai tem 3,2 milhões de habitantes e o Brasil 188 milhões.
Balança comercial
No ano passado, o Brasil voltou a ser o principal comprador do Uruguai – como havia sido em meados da década de 90 – respondendo por 14,7% das exportações uruguaias, no valor aproximado de US$ 583 milhões, e com aumento de 27% em relação a 2005. por outro lado, as compras uruguaias no Brasil somaram US$ 1,080 bilhão, marcando um déficit na balança comercial superior a US$ 495 milhões, segundo dados divulgados na sexta-feira pelo Banco Central.
“Não queremos uma dádiva ou um ato de caridade dos sócios maiores, mas uma estrita justiça com os sócios menores, para que realmente todos os países que integram este processo observem nos fatos concretos os frutos da integração”, afirmou Tabaré Vázquez. A preocupação brasileira com o Uruguai era evidente. O presidente Lula chegou à residência oficial de Anchorena, no departamento de Colônia, apenas duas semanas antes da visita de George W. Bush, no contexto de uma aproximação histórica entre Washington e Montevidéu.
O encontro entre Lula e Vázquez havia sido adiado várias vezes, o que distanciou os dois governos. O mandatário brasileiro foi o grande ausente da última Cúpula Ibero-americana realizada na capital uruguaia, alegando “cansaço” após a campanha eleitoral que lhe deu a reeleição. Depois, suspendeu outras duas visitas. Por sua vez, Vázquez evitou os encontros protocolares na última Cúpula do Mercosul, realizada em janeiro no Rio de Janeiro. Nessa oportunidade, as autoridades uruguaias pediram maior flexibilidade para se chegar a acordos comerciais fora do bloco, como forma de os países menores poderem enfrentar os desequilíbrios internos. Porém, suas reclamações foram inúteis.
Por outro lado, Montevidéu avançava nas negociações com os Estados Unidos pelo Acordo Marco sobre Comércio e Investimentos (Tifa, na sigla em inglês), assinado em janeiro. Washington parece ter aproveitado, em sua aproximação com o governo uruguaio, dos problemas do Mercosul, que também está em expansão com a recente incorporação da Venezuela e o pedido da Bolívia para converter-se em membro pleno. O bloco se viu prejudicado pela disputa de dois anos entre Argentina e Uruguai pela instalação de fábrica de celulose no rio Uruguai que é compartilhado por ambos, e, ainda, pelos bloqueios de estradas internacionais como protesto de moradores e ambientalistas argentinos, sem que Buenos Aires tomasse medidas para evitar essa situação.
Oportunidades iguais
Além disso, também pesam no processo de integração a falta de atenção dos “grandes” para as desvantagens e fraquezas relativas de Paraguai e Uruguai que caracterizam o bloco desde sua criação em 1991. “Temos de facilitar as condições para os sócios menores para que tenham as mesmas oportunidades e para que todos sejam beneficiados dentro do bloco”, destacou Lula, para acalmar os ânimos. Por sua vez, Vázquez assinalou que “dizemos com enorme modéstia e humildade que nesta visita do senhor presidente do Brasil e de sua tão prestigiosa delegação, o reconhecimento aos reclamos que fazemos dentro das reuniões do Mercosul encontraram um enorme eco”, disse o presidente uruguaio.
Durante o encontro, ministros dos dois países assinaram cinco acordos sobre promoção de comércio e investimento, cooperação para o desenvolvimento de biocombustíveis e para a criação de uma comissão permanente em matéria de energia e mineração. Os chanceleres também acertaram a restauração da antiga ponte Barão de Mauá que cruza o rio Yaguarón, unindo a cidade brasileira de Jaguarão com a uruguaia Rio Branco, e a construção de outra sobre esse mesmo rio.
Enquanto ocorriam estas reuniões, chegava do Brasil outro sinal alentador. A policia deteve nesta segunda-feira o coronel da reserva uruguaio Manuel Cordero, desde 2004 foragido da justiça do Uruguai, que o buscava para julgá-lo por violações dos direitos humanos durante a última ditadura militar (1973-1985). Mas apesar das demonstrações de alegria, as declarações dos ministros a continuação da reunião privada entre Lula e Vázquez durante o restante do dia denotam que as diferenças de enfoque sobre o Mercosul ainda são fortes.
Relação com os EUA
O ministro da Economia do Uruguai, Danilo Astori, voltou a defender a intenção de Montevidéu em negociar acordos comerciais extra-regionais. Astori disse que o governo ainda não descarta a possibilidade de assinar um tratado de livre comércio com os Estados Unidos, motivo pelo qual insistiu perante o Presidente Lula na necessidade de “ter maior flexibilidade na aplicação das normas” do Mercosul. O ministro informou que na reunião desta segunda-feira o governo uruguaio deu ênfase a que o bloco permita aos países menores ter acesso ao mercado internacional e progredir na busca de acordos fora da região.
Por sua vez, o chanceler Celso Amorim negou-se a opinar sobre a possibilidade de um acordo bilateral de livre comércio entre Montevidéu e Washington, e disse que “o mais importante é respeitar as decisões dos países. Todos queremos mais e melhor no Mercosul, como disse o presidente Tabaré, e foi nisso que trabalhamos hoje”, afirmou Amorim.
Fonte: IPS
Com substítulos do Vermelho