Juros altos forçam valorização do câmbio

Por David Fialkow Sobrinho*
De longe, os juros altos são o principal fator de valorização do Real frente ao Dólar. Para desviar do problema verdadeiro, analistas ingênuos ou setores ligados aos banqueiros, usam uma argumentação que tem lógi

Vejamos seu argumento: Afirmam que a valorização do real se deve ao excelente superávit comercial (saldo entre exportações e importações) brasileiro dos últimos anos, especialmente no Governo Lula. Em vista deste superávit, entram muito mais dólares do que saem, provocando excesso de moeda norte-americana sendo vendida em troca de moeda nacional sendo comprada (os exportadores convertendo seus dólares em reais). Pela lei da oferta e procura, aquilo do que as pessoas querem muito se desfazer se desvaloriza e o que é muito procurado se valoriza.


 


O argumento é verdadeiro, apenas em parte


 


Ocorre que o principal excesso de dólares no mercado brasileiro não vem desse dólar físico, isto é, papel oriundo das exportações. Se assim fosse, não teria havido tamanha desvalorização. Nos dois últimos anos, período de mais elevada valorização do real, o ingresso liquido comercial (exportações menos importações) somou cerca de US$ 80 bilhões, enquanto o Banco Central do Brasil comprou cerca de US$ 160 bilhões no mercado, ou seja, a procura foi mais do que o dobro da oferta (números aproximados, com base em dados disponíveis na CVM, Bacen e publicações especializadas).


 


Especialistas do mercado de capitais vêm reiterando que a principal entrada de dólares no Brasil vem se dando no mercado futuro (e não no mercado físico). Ou seja, a grande massa de dólares que inunda o país provém de operações no mercado de derivativos. São moeda estrangeira comprando real para aplicar nas taxas de juros, dadas pela Selic aos títulos públicos, que são as mais altas do Mundo, em termos reais.


 


Seria demasiado aqui descrever os vários caminhos e formas em que esse processo se dá. Um exemplo emblemático é o caso extremo desse afluxo, que se dá sob a denominação de “carry trade”. Esta é uma operação mediante a qual um agente no exterior toma recursos (dólares, principalmente) a taxas que variam de 1% a pouco mais que 5% ao ano, e aplica no Brasil em que, descontados os impostos, etc, rendem 10,737% anuais. O aplicador ganha a diferença (sem pôr um centavo seu). Isto com variação cambial zero. Se, no período, houver uma valorização de 5% do real, o ganho se eleva a 14,737% ao ano, porque, na volta, cada real vai comprar mais dólares (dados do jornal Valor, 14/05/07, pág. C2). O agente no exterior, muitas vezes um fundo internacional, sequer precisa entrar diretamente com seus recursos no Brasil, pois, em muitos casos, tudo se dá via instituições financeiras, através do mercado futuro de dólar, através de carta fiança de um banco na BM&F. Só de janeiro a abril de 2007, o volume destas operações na BM&F subiu 101,4%.


 


Há casos em que os bancos estão comprando dívidas de importadores brasileiros, com desconto, e os reais obtidos pelo importador com a venda de dívida são aplicados nos títulos públicos, com juros dados pela Selic.


 


Na outra ponta, só em abril os ACCs aumentarm mais de 100%. Os exportadores, que têm dólares a receber, podem ter acesso a linhas de empréstimos chamadas Antecipação de Contratos de Câmbio (ACCs). Como os juros desses empréstimos são inferiores aos da aplicação financeira e o prazo encolheu de 1 ano para 6 meses, ficou mais atraente tomar ACCs (que são isentos de imposto de renda). A contratação de “câmbio à vista também tem explodido, pois os exportadores querem converter seus dólares em reais o quanto antes e aplicá-los nos juros prefixados ainda atrativos oferecidos no Brasil” (jornal Valor, 14/05/07, pág. C1).


 


 


Conseqüências danosas para a economia real


 


E as conseqüências são danosas para a economia sob vários aspectos. De um lado, dificultam as exportações, que se tornam mais caras em dólar. De outro lado, facilitam as importações, ameaçando a produção nacional.   Esses dois fenômenos combinados repõem o risco de se vir a perder a grande conquista que foram superavits robustos na balança comercial, podendo o país voltar à condição de vulnerabilidade.


 


 


Vem o recurso especulativo e sai o produtivo


 


Numa ponta, entram enxurradas de recursos especulativos, em busca do juro mais alto do mundo. Noutra, como ficou mais caro o real, dificulta a entrada de recursos voltados à produção, o chamado Investimento Direto Estrangeiro (IED), altamente disputado pelas nações. Além disso, empresas nacionais, como a Marcopolo, estudam deixar de produzir aqui certos componentes e passar a produzi-los em países asiáticos em função do câmbio.


 


Sem baixar os juros, forte e corajosamente, fica difícil ao pais seguir pelo caminho do desenvolvimento, ameaçando o próprio PAC.


 


* Economista