Colômbia: O que Uribe quer ao libertar presos das Farc?
A decisão do governo colombiano de libertar unilateralmente centenas de guerrilheiros abriu um debate no país sobre os reais motivos da iniciativa e sobre sua capacidade de convencer o maior grupo armado do país a libertar reféns, alguns deles capturados
Publicado 07/06/2007 10:25
O presidente Álvaro Uribe anunciou na semana retrasada que soltará um grupo de prisioneiros das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). Se cumprida, será a primeira iniciativa unilateral desse porte de seu governo. A primeira justificativa para a decisão é que ela poderia ser interpretada como gesto de boa vontade, levando os guerrilheiros a soltarem cerca de 60 reféns, entre eles a ex-candidata à Presidência, a franco-colombiana Ingrid Betancourt e três cidadãos americanos.
Mas por que Uribe – um linha-dura que baixou os níveis de violência intensificando os ataques à guerrilha – decidiu agora pela libertação de prisioneiros?
“Ninguém entende muito bem por que o presidente Uribe decidiu improvisadamente ordenar a soltura de várias centenas de presos das Farc”, diz o articulista da revista A Semana, Antonio Caballero.
Algumas hipóteses circulam na Colômbia. Uma tem a ver com a França. O novo presidente, Nicolas Sarkozy, colocou a situação de Ingrid, capturada em 2002 pelas Farc, como prioridade. Citou a refém em seu discurso de posse e pressionou Uribe a libertar Rodrigo Granda, guerrilheiro que atuava como um ministro das Relações Exteriores das Farc, para que ajudasse nas negociações.
As pressões da França se intensificaram depois que um soldado colombiano, que fugiu do cativeiro no mês passado, disse que Ingrid estava viva. Essa revelação teria precipitado a oferta de Uribe e mostrar à França seu empenho.
Mas, para alguns, a pressão da França não seria suficiente para uma soltura expressiva de guerrilheiros sem nada em troca. “Esta decisão não é produto apenas da influência da França, mas pode ser uma tentativa de justificar antecipadamente a libertação de paramilitares de direita e também de para-políticos [políticos ligados ao governo presos por laços clandestinos com os paramilitares]”, disse ao Valor a professora de Relações Internacionais da Universidad de Los Andes, Arlene Tickner. Segundo ela, Uribe indicou na semana passada que tanto paramilitares quanto os políticos implicados poderão ser libertados. A libertação de guerrilheiros das Farc evitaria inevitáveis acusações de favorecimento aos paramilitares e a seus parceiros políticos, envolvidos num escândalo que manchou a imagem do governo.
Uribe busca ainda a aprovação pelo Congresso dos EUA do acordo de livre comércio entre os dois países, mas os democratas americanos criticam a infiltração dos paramilitares no governo colombiano.
As Farc já descartaram soltar os reféns como resposta a Uribe. Ontem, Granda disse por meio de um comunicado que agradece às gestões de Sarkozy para sua libertação. Mas acusa o governo de ter usado a situação para “dividir as Farc, soltando desertores” e “obscuros personagens que se auto-proclamam comandantes de guerrilheiros e tropas inexistentes”. Trocar esses presos por reféns não faz sentido para a guerrilha, que exige uma negociação com nomes e datas e, principalmente, na desmilitarização de dois municípios, Florida e Pradera, que seria campo neutro de conversações. Uribe rejeita.
A soltura desses presos, de qualquer forma, renderia um efeito de imagem para Uribe: a de que ele faz o que está ao seu alcance livrar inocentes. O problema, para Caballero, é que o presidente não entende as Farc, cujo objetivo, seria ser reconhecida oficialmente como força beligerante e assim exigir que o Estado se abra para negociações formais.