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Leia na íntegra 'Rumo a uma central classista e democrática'

Aprovado neste sábado (29) pelos delegados do 7º Encontro Nacional da CSC, o documento “Rumo a uma central classista e democrática” a conjuntura política, econômica e sindical no Brasil e no mundo, detalhando as razões para a construção de uma central. Le

Rumo a uma central classista e democrática


 


1- A mudança do cenário político propiciado pelas vitórias eleitorais da esquerda e centro esquerda no Brasil e em vários países da América Latina, em disputas abertas e acirradas contra a direita neoliberal, trouxe novas perspectivas e desafios para a luta do sindicalismo classista e das forças progressistas contra o neoliberalismo e por um novo projeto nacional de desenvolvimento, fundado na democracia, na soberania nacional e na valorização do trabalho, que também deve nos apontar o caminho para o socialismo.


 


2- A classe trabalhadora brasileira tem sido submetida a uma forte ofensiva contra os direitos e benefícios que conquistou durante o século XX, previstos na CLT e na Constituição promulgada em 1988. Seja por conseqüência da ação política das forças conservadoras a serviço do capital financeiro ou de mudanças objetivas no interior do sistema capitalista, verificou-se uma dramática regressão social, depreciação da força de trabalho e degradação ambiental ao longo das últimas décadas. Indicadores disto são, entre outros, a elevada taxa de desemprego, que ainda hoje está em torno de 16% da População Economicamente Ativa (PEA) nas regiões metropolitanas e a crescente precarização das relações trabalhistas, evidenciada no fato de que apenas um terço da PEA integra o mercado formal como celetista ou estatutário, o que dificulta a unidade e obscurece a identidade de classe dos trabalhadores e trabalhadoras. Tudo isto agrava sobremaneira a crise social, estando associado ao aumento da violência, que atinge principalmente os jovens e negros, e do caos urbano. Embora este processo tenha sido parcialmente interrompido com a derrota das forças neoliberais em 2002 e 2006, a ameaça de novos e maiores retrocessos ainda persiste. Pairam sérias ameaças e pressões por um retrocesso maior, através de mudanças na legislação (por vezes sutis e matreiras como a famosa Emenda 3) e de reformas (trabalhista e previdenciária) orientadas pela flexibilização e redução de direitos.


 


3- Nessas condições, cabe destacar a necessidade de um protagonismo maior dos movimentos sociais e, em particular, dos trabalhadores e trabalhadoras nas lutas políticas e no processo de mudanças em curso. Sem uma participação maior dos movimentos sociais nas batalhas políticas nacionais, para além dos pronunciamentos eleitorais e em consonância com eles, o processo de mudanças pode ser frustrado e abrir caminho ao retrocesso neoliberal.


 


SITUAÇÃO DO MOVIMENTO SINDICAL


 


4- Vivemos um momento de recomposição no meio sindical brasileiro, que coincide com redefinições no sindicalismo em âmbito mundial. São exemplos disto a fusão entre a Ciols e a CMT – que resultaram na criação da Confederação Sindical Internacional (CSI) no final do ano passado, bem como, de outro lado, as iniciativas objetivando a refundação da Federação Sindical Mundial (FSM), à qual a CSC decidiu se filiar no Encontro de Aracajú (2006).


 


5- Por aqui, vimos a fusão da CGT, CAT e SDS e criação da União Geral dos Trabalhadores (UGT). Adiantando-se à perspectiva de reforma sindical, dirigentes de confederações e federações, criaram a chamada Nova Central; o PSTU fundou o Conlutas e sindicalistas que compunham a antiga CUT Pela Base e Alternativa Sindical Socialista (ASS), ex-petistas, além do P-Sol, constituíram a Intersindical. Notam-se igualmente redefinições de posicionamentos políticos. Criada em 1991, a Força Sindical busca se recompor politicamente e procura se afastar das posições mais conservadoras com que estava identificada até recentemente. A época de polarização entre esquerda (CUT) e direita (Força Sindical) no sindicalismo nacional ficou para trás e deu lugar a uma nova realidade.


 


6- A recomposição do movimento sindical não ocorre no vazio e nem se explica por si só. Está associada ao quadro político em mutação, assim como à perspectiva de mudanças na organização sindical, começando pela legalização das centrais. Registra-se o avanço político de partidos e forças progressistas, fenômeno que por sua vez reflete uma evolução positiva da consciência social do povo brasileiro.


 


7- Os ventos políticos que sopram na América Latina apontam a necessidade objetiva de mudanças mais profundas e radicais. Os povos reclamam a superação da miséria neoliberal e respaldam a luta por novos projetos de desenvolvimento nacional, com caráter antiimperialista, fundados na soberania e na valorização dos trabalhadores e trabalhadoras. Para consolidar esta perspectiva é indispensável fortalecer o sindicalismo classista e unitário.


 


INDEPENDÊNCIA CLASSISTA


 


8- Ao longo de sua história, sem perder de vista seus princípios e objetivos, a CSC sempre se orientou por uma tática de alianças ampla e flexível dentro do movimento sindical brasileiro, ciente da importância da unidade da classe trabalhadora para o êxito das lutas. Criada em 1988, por lideranças sindicais que tinham saído da CGT (fundada em 1986), a Corrente Sindical Classista permaneceu durante certo tempo como uma força independente e só depois decidiu pela filiação à CUT, compreendendo que a luta pela unidade passava pela CUT.


 


9- O ingresso na CUT ocorreu em 1991, no 4º Congresso Nacional da Central, que naquela época estava identificada com a bandeira do sindicalismo combativo e constituía o pólo mais avançado do sindicalismo brasileiro. A CSC nunca abriu mão dos princípios e concepções do sindicalismo classista. Embora minoritária, tratou de manter uma fisionomia própria, defendendo com firmeza a democracia e a unicidade sindical, opondo-se às concepções liberais divisionistas e às práticas antidemocráticas.


 


10- No mesmo congresso em que sacramentou seu ingresso, a CSC se destacou, junto com outras forças, na defesa de maior democracia no interior da CUT, com ênfase na proporcionalidade qualificada. Em 1996, a CSC repudiou publicamente o malfadado acordo da Previdência que a cúpula da CUT chegou a negociar com FHC. Mais recentemente, a Corrente liderou uma vitoriosa campanha nacional contra a proposta de reforma sindical encaminhada pelo Ministério do Trabalho ao Congresso Nacional e respaldada pela maioria da CUT – a famosa PEC 369.


 


11- À luz dos resultados obtidos ao longo dos últimos 15 anos, a entrada na CUT revelou-se uma tática correta de acumulação de forças num período de defensismo histórico, derrota e crise da perspectiva socialista e forte ofensiva neoliberal. A CSC se transformou num pólo de referência dentro e fora da CUT, além de se consolidar como segunda força dentro da Central.


 


A INVOLUÇÃO DA CUT


 


12- A CUT nasceu, em 1983, como uma central combativa, que apostava na luta, propugnava o socialismo e defendia propostas radicais, a exemplo do que então ocorria com o Partido dos Trabalhadores (PT). Aos poucos, foi mudando de comportamento, evoluindo para posições mais moderadas, afastando-se das posições de classe e assumindo cada vez mais uma feição social-democrata. O “acordo da Previdência”, em 1996, pode ser considerado um marco deste movimento, no qual a Central perdeu a combatividade e no terreno das concepções sindicais passou a defender o chamado sindicato cidadão, dando ênfase ao tripartismo, câmaras setoriais e à negociação, deixando em segundo plano a mobilização e a luta.


 


13- Ao mesmo tempo, acentuou-se o hegemonismo da força majoritária. Isto reforçou a partidarização da CUT. As concepções liberais acerca da organização sindical, dominantes na direção, em especial a proposta de sindicato orgânico, convergem no mesmo sentido. Esta trajetória não pode ser dissociada da forte pressão ideológica do capitalismo neoliberal em âmbito mundial, traduzida no chamado pensamento único, que se tornou amplamente hegemônico após a derrota do socialismo no leste europeu.


 


14- Após a eleição de Lula, ao invés de se abrir e ampliar sua influência entre os trabalhadores, a CUT reforçou o hegemonismo e a tendência à institucionalização, comprometendo a sua autonomia. Acabou perdendo bases, principalmente entre as correntes não petistas. A luta sempre foi travada dentro da CUT, porém as idéias mais avançadas nunca prevaleceram em função das concepções exclusivistas e antidemocráticas da força majoritária. O exclusivismo impediu que a Central se transformasse num instrumento aglutinador de todas as forças que atuam no movimento e de unificação do sindicalismo nacional..


 


UM NOVO CAMINHO


 


15- Nessas condições é que se coloca a necessidade de repensar a relação CSC/CUT. A luta por maior democratização da CUT teve um ponto alto no 9º Concut, quando a CSC lançou a Chapa 2 com as bandeiras por uma Central democrática, plural, autônoma e de luta. Naquele congresso, o núcleo duro da força majoritária demonstrou que não está disposto a compartilhar os espaços de poder e despreza as correntes minoritárias, monopolizando todas as posições de comando. O congresso foi marcado por manobras desleais para afastar a Corrente da direção da CUT/Bahia e a tentativa de retirar inclusive a vice-presidência (devolvida depois de protestos, mas já significativamente esvaziada). A tudo isto se deve acrescentar a manipulação fraudulenta de eleições sindicais no Rio de Janeiro, contra a CSC, em entidades dirigidas pela força cutista majoritária.


 


16- Por tudo isto, cresceu, em nosso meio, a percepção de que a possibilidade de avanço do sindicalismo de classe no interior da CUT se esgotou. Importa também o fato de que a contribuição dos sindicatos à CUT não tem como contrapartida uma ação transparente e eqüidistante da direção da Central em pleitos sindicais onde há disputa entre chapas cutistas. O plano meticuloso da força majoritária para retomar a direção da CUT-Bahia, mesmo com uma maioria artificial forjada através de manipulações da tesouraria nacional, foi um exemplo disto.


 


17- A concepção liberal-divisionista revelou-se de modo especialmente perverso no meio rural, onde lideranças ligadas à força majoritária, respaldados pela cúpula cutista e setores do governo federal, estão empenhadas no desmembramento das bases dos sindicatos e federações associados à Contag, separando os pequenos produtores dos assalariados do campo, a pretexto de organizar a agricultura familiar, que já são representados pelo sistema Contag. Trata-se de uma ofensiva inaceitável, que tem caráter oportunista e reacionário, que divide em vez de unir e sabota a histórica aliança entre assalariados e pequenos produtores.


 


18- Por essas e outras razões, forças que, ao lado da CSC, tinham posições mais à esquerda se desligaram da Central. Com exceção da CSC e de uma fração do PSB, todas as demais tendências que atuam na CUT pertencem, hoje, a uma só força política, que ocupa todas as posições de comando. A CUT não perde bases e filiados à toa.


 


A UNIDADE COMO PRINCÍPIO


 


19- A representatividade da CSC e a união com outras correntes e forças políticas dão base para a construção de uma outra alternativa sindical para os trabalhadores brasileiros. Em aliança com outros setores do movimento sindical, é possível criar uma central de porte apreciável, reunindo centenas de entidades representativas de vários setores econômicos e em âmbito nacional.


 


20- O momento histórico também sugere a busca de um outro rumo. O novo cenário político e sindical criou uma necessidade objetiva de uma alternativa mais avançada, propugnada pelo recém-criado Movimento por uma Central Classista e Democrática. É preciso ressalvar que a central classista deve refutar do ponto de vista prática e teórico a via da partidarização, constituindo-se como organização ampla e unitária da classe trabalhadora, efetivamente democrática e plural, capaz de aglutinar outras forças.


 


21- A luta pela unidade é um princípio que sempre guiou a conduta da CSC e deve ser reafirmada neste momento, pois se trata de uma condição para que a classe trabalhadora tenha um papel mais decisivo para influir nos rumos políticos do país, no embate por um novo projeto de nação, democrático, soberano e fundado na valorização do trabalho. Com esta perspectiva é que a classe trabalhadora, agora mais heterogênea que no passado, vai forjando sua identidade.


 


22- Dirigentes da CUT, incluindo aliados leais, com uma visão idealista, criticam a decisão da Corrente alegando que é uma aposta contra a unidade, mas, ainda que sejam bem intencionados, estão equivocados. É preciso compreender que a unidade, hoje, está colocada em um novo patamar. É um caminho que já não passa apenas pela CUT, que na cidade de São Paulo (para citar um exemplo) não representa categorias importantes como metalúrgicos, comerciários, eletricitários, telefônicos e padeiros, entre outras. Não podemos ignorar a realidade de pluralidade que tomou corpo na cúpula do sindicalismo. Cabe lembrar que as experiências de greve geral no Brasil sempre resultaram de uma união mais ampla do movimento sindical.


 


NOVA CONCLAT


 


23- A unidade através de uma só central hoje não é viável. Todavia, é possível a união mais ampla das centrais na ação concreta, como já vem ocorrendo em relação à redução da jornada de trabalho, valorização do salário mínimo, jornada pelo desenvolvimento com valorização de trabalho e distribuição de renda e outros temas. Defendemos, neste sentido, a coalizão de todas as centrais para avançar a unificação na luta. Para alcançar este objetivo a CSC propõe a realização de uma nova Conferência Nacional da Classe Trabalhadora (Conclat), que deve debater em profundidade o tema, definir as bandeiras mais gerais que unificam o movimento e eleger uma mesa coordenadora para dirigir as lutas conjuntas. Desta forma, nossa eventual saída da CUT e construção de uma central classista e democrática não se contrapõe à unidade e, pelo contrário, será um instrumento para o fortalecimento das iniciativas neste sentido


 


ALTERNATIVA CLASSISTA


 


24- Associados a este objetivo colocam-se hoje vários desafios emanados da chamada reestruturação produtiva e das mudanças verificadas no sistema capitalista, que a central classista deverá enfrentar. Entre esses, destaca-se a necessidade de ampliar a credibilidade e representatividade efetiva das organizações sindicais, que hoje abrangem apenas (e precariamente) os assalariados do mercado formal de trabalho, que constituem somente um terço da população economicamente ativa. É indispensável inserir a grande massa de trabalhadores informais, sem carteira, terceirizados e precarizados na luta sindical e política. No mesmo sentido, cabe buscar a ampliação da base de representação das categorias profissionais para os ramos econômicos, construir os comitês unitários de base, incluindo desempregados e terceirizados.


 


VALORIZAR A DEMOCRACIA


 


25- A defesa da democracia no interior do movimento sindical revela-se uma questão primordial. Uma central classista tem que estar na linha de frente desta luta, exigindo – nos marcos de uma reforma sindical ou de mudanças na legislação sindical – mecanismos que garantam a lisura dos pleitos sindicais, assim como maior transparência e participação das bases nas gestões, de forma a coibir as fraudes e a burocratização das entidades, assim como evitar e combater o crescente e nocivo divórcio entre direção e base dos sindicatos. Será preciso realçar igualmente a defesa da unicidade dos sindicatos e da integridade da Contag.


 


26- A crítica que ora fazemos à força majoritária da CUT não pode ser só formal, teórica ou retórica. Terá de se traduzir necessariamente na conduta prática, no movimento real. Uma alternativa efetivamente renovada para o sindicalismo brasileiro também não pode repetir velhos vícios. Deve ser orientada pelas concepções classistas, destacando: a crítica sem quartel ao capitalismo e a defesa do socialismo como objetivo maior da classe trabalhadora; o repúdio ao neoliberalismo e a luta por um novo projeto de nação. Deve zelar pela autonomia frente ao governo e aos partidos políticos, evitando a partidarização sem cair no apoliticismo ou no economicismo e levando em conta os equívocos cometidos no passado. Deve igualmente exercitar a democracia interna e lutar pela democratização do movimento sindical, combatendo o burocratismo, a violência e a corrupção, assim como criando um ambiente ao mesmo tempo plural, amplo, aberto e unitário, estimulando a participação das massas nas atividades (e gestões) sindicais e aproximando direção e base. A questão da democracia não pode mais ser considerada um problema menor ou uma mera formalidade, é um princípio fundamental para o presente e o futuro, cuja solução parece ser também a chave para superar a crise de representatividade do sindicalismo moderno.


 


27- Também devemos levantar com mais força as bandeiras do sindicalismo classista no plano econômico e político. Cabe assinalar os seguintes pontos:
a) Avançar na construção de uma unidade mais ampla da classe trabalhadora, o que compreende dois movimentos: 1- buscar uma coordenação mais permanente das centrais sindicais em âmbito nacional e também nos ramos de atividade, assim como nos Estados, procurando viabilizar intervenções conjuntas nas lutas e iniciativas visando uma maior influência na definição de políticas públicas; 2- viabilizar uma interação maior do movimento sindical com outras organizações dos movimentos sociais nas lutas gerais e específicas, fortalecendo a Coordenação dos Movimentos Sociais (CMS).
b) Defender uma politização maior dos movimentos sociais, dos sindicatos e do conjunto da classe trabalhadora, buscando criar um movimento político de massas em defesa de um novo projeto nacional de desenvolvimento, com soberania e valorização do trabalho.
c) Cultivar a solidariedade entre os trabalhadores e suas organizações, não só em âmbito local e nacional; é indispensável desenvolver a solidariedade de classe internacional, o internacionalismo proletário, uma necessidade candente nas condições atuais de globalização neoliberal. Neste sentido, é preciso priorizar a construção de um Fórum Sindical das Américas, com todas as forças e tendências que atuam no movimento sindical americano.
d) A central de orientação classista deve estar alicerçada nos comitês unitários de base, que poderão reunir empregados e desempregados, assim como enraizada nas organizações por local de trabalho.
e) Combater a discriminação no trabalho, exigindo a igualdade de gênero, etnia, bem como o respeito à orientação sexual, a ampliação das oportunidades para a juventude e a incorporação de jovens, mulheres e homossexuais nas batalhas sindicais e políticas.
f) Priorizar a luta pela jornada de 35 horas semanais, sem redução de salários.
g) Levantar as bandeiras do socialismo do século XXI e da luta contra o imperialismo, em defesa da paz mundial e da integração solidária da América Latina.