Contra Record, Globo ignora a própria 'cartilha' monopolista
O jornalista Eliakim Araujo, em sua coluna no site Direto da Redação, ataca a discurseira da TV Globo contra práticas da Record. “Novo paladino da moral e dos bons costumes, a emissora da família Marinho prefere ignorar que o Jornal Nacional
Publicado 04/10/2007 19:25
Interesses particulares e inconfessáveis
Por Eliakim Araujo
Estive em São Paulo semana passada para a inauguração do Record News, o primeiro canal de notícias 24 horas em TV aberta. O sucesso do evento foi tão grande quanto a repercussão que causou o discurso do presidente do Grupo Record, Edir Macedo, ao afirmar que “durante muito tempo fomos reféns de um grupo que mantém o monopólio da informação. Nós queremos acabar com esse monopólio”. Não citou a Globo, nem precisava.
A partir daí e de uma informação do jornalista Josias de Souza, da Folha, sobre manobras de um executivo da Globo em Brasília que tentou impedir a presença do presidente Lula no evento, denunciando uma suposta ilegalidade do novo canal, a guerra estava deflagrada, com acusações de parte a parte.
Chamou-me a atenção nesse tiroteio de notas e editoriais a da Central Globo de Comunicação que acusa a Record de usar “suposto espaço jornalístico para a defesa de interesses particulares e inconfessáveis”. Novo paladino da moral e dos bons costumes, a emissora da família Marinho prefere ignorar que o Jornal Nacional já foi usado inúmeras vezes com o mesmo objetivo.
Os que têm boa memória hão de se lembrar da campanha cerrada do Jornal Nacional contra o então ministro da Justiça do governo Figueiredo, Ibrahim Abi-Ackel, que ousou impedir a liberação de uma carga de equipamentos destinados à TV Globo. Durante várias edições, o JN acusou o ministro de envolvimento no contrabando de pedras preciosas, no qual Abi-Ackel não teve, comprovou-se depois, nenhuma participação. Mas pouca gente lembra disso. É provável até que os jovens executivos da Globo “desconheçam” o episódio. O próprio Abi-Ackel o omite em sua biografia.
Também o governador Leonel Brizola foi vítima de imensos editoriais no Jornal Nacional. Este escriba mesmo, em seus tempos de substituição dos titulares do JN, nos fins de semana e feriados, teve a oportunidade de ler alguns desses editoriais, que eram publicados no domingo no jornal O Globo e antecipados aos sábados na TV.
Ou seja , essa história de acusar a concorrente de usar o principal telejornal da casa para defender “interesses particulares e inconfessáveis” é velha, faz parte dos usos e costumes da mídia brasileira, e foi a própria Globo quem editou e ensinou a cartilha aos demais interessados.
Falar desse assunto não era o objetivo da coluna de hoje, mas não podia deixar passar em branco a oportunidade de resgatar a influência da Globo em momentos históricos do Brasil.
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