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Kossovo e Cuba são alvo de análise de secretário do PCdoB

Dois fatos sacudiram a agenda internacional nos últimos dias e levantaram dúvidas sobre seus desdobramentos no cenário mundial: a declaração de emancipação de Kossovo e a decisão de Fidel Castro de não mais concorrer à presidência. Na análise da mídia

Um assessor do presidente palestino Mahmoud Abbas, influenciado pela declaração de independência de Kossovo, disse que os palestinos poderiam fazer o mesmo se não evoluíssem as conversas com Israel. O que difere a situação de Kossovo da situação palestina?
A luta do povo palestino pela sua libertação e pela constituição de um Estado autodeterminado e independente não precisa do exemplo de Kossovo para se legitimar. A libertação da Palestina é uma luta legitimada pela própria história da ocupação de seu território, onde há 60 anos seu povo é martirizado pelo imperialismo norte-americano e pelo sionismo israelense. Sua independência se explica em si mesma pelo sagrado e legítimo direito dos povos a resistir e proclamar sua independência por todos os meios que estejam ao seu alcance, principalmente quando se trata de um povo oprimido e ocupado. 


 


O que diferencia a situação de Kossovo?
A questão do Kossovo poderia ser resolvida nos marcos de um Estado multinacional que assegure autonomia e direito às comunidades étnicas que existem em seu território através de uma constituição aceita por todas as comunidades, de leis justas e de práticas políticas corretas do poder central. O que se pode discutir em favor dos albaneses de Kossovo – e é legítimo que se discuta – é que nem sempre os seus direitos foram respeitados. Foram cometidos atos contrários à própria existência do povo do Kossovo. E admitir isso significa tentar corrigir erros que tenham sido cometidos nesse terreno. Questões como essas podem ser resolvidas no âmbito de uma constituição de um país multinacional e de políticas justas.


 


 


Como fica, então, a questão do direito internacional neste episódio?
O direito internacional repele a forma arbitrária, discricionária e unilateral como foi proclamada a independência do Kossovo. Mas a questão principal é que a independência do Kossovo foi instrumentalizada pelo imperialismo norte-americano e por países europeus imperialistas ocidentais que ocuparam a Sérvia a partir da guerra de 1999 e transformaram a região do Kossovo numa base de operações da Otan, uma base a serviço dos interesses do imperialismo norte-americano. A independência do Kossovo é uma farsa porque, prevalecendo esta situação, o território nunca será independente; será, sim, um Estado joguete nas mãos do imperialismo estadunidense e das potências européias. A independência do Kossovo, tendo sido instrumentalizada, cria uma situação grave em que o imperialismo norte-americano continua fomentando, através do intervencionismo, a militarização de regiões nevrálgicas. A chamada independência do Kossovo, portanto, aumenta as tensões internacionais e é por isso que alguns países resistem em reconhecer essa independência.


 


 


Neste sentido, a posição brasileira foi acertada…
A posição que o governo brasileiro adotou é uma posição legalista, formalmente correta, de dizer o seguinte: o Brasil só se pronuncia a partir de um posicionamento da ONU. É uma postura correta do ponto de vista do direito internacional. Mas, sem polemizar, é preciso acrescentar o seguinte: os países que têm governos progressistas devem travar, a partir desse exemplo, a luta contra a instrumentalização das Nações Unidas. Infelizmente, nas últimas décadas, as Nações Unidas têm sido usadas pelo imperialismo norte-americano. É preciso que os países democráticos lutem contra essa instrumentalização, sob pena de termos de aceitar as coisas em nome de uma falsa legalidade. E muitas decisões erradas já foram tomadas neste sentido. As Nações Unidas, por exemplo, não deram aval ao Bush para a guerra do Iraque, mas, posteriormente, adotaram resolução legitimando a ocupação. O PCdoB, como uma força que tem responsabilidades em nosso país, não pode aceitar decisões falsas que a ONU venha a tomar. Uma decisão sobre Kossovo, para ser correta, deveria ser o não reconhecimento da  independência.


 


 


Outro fato que marcou o cenário mundial nestes últimos dias foi a decisão de Fidel de não se candidatar à reeleição. Que avaliação faz deste episódio?
O gesto de Fidel, que ele mesmo vem tratando em suas últimas reflexões, revela que foi uma decisão muito refletida. Do ponto de vista dos amigos de Cuba e da experiência daquele país, essa decisão indica que a opção do comandante foi a de continuar a serviço da revolução até o seu último suspiro. Não se trata de uma renúncia. Pelo contrário: é a assunção de um novo compromisso, com as condições pessoais de sua saúde e de sua idade. Fidel escolheu dedicar à revolução todas as suas energias e sua grande capacidade intelectual em outra trincheira. Vejo nisso o valor de sua consciência revolucionária .


 


 


E a mídia hegemônica festejou a decisão como sendo uma renúncia…
Temos uma mídia ignorante e pobre no Brasil e no mundo. Toda vez que se trata de noticiar ou opinar sobre os processos de revolução, nomeadamente sobre Cuba, essa mídia falsifica, tergiversa, engana e mente. Por isso fez esse carnaval com a suposta “renúncia” de Fidel. Mas, a realidade fala por si e esses veículos vão se desapontar porque Fidel escolheu outra trincheira, a da luta de idéias. E a luta de idéias é o terreno onde nós, revolucionários – e Fidel à frente de todos os revolucionários – mais têm razão e onde não assiste nenhuma razão aos inimigos que não têm ética, defendem idéias falsas e um sistema condenado, que é o capitalismo. O sistema capitalista defende a guerra e vilipendia os direitos dos povos. Fidel e os revolucionários querem a conquista de um mundo novo, socialista. Na verdade, Fidel vai continuar atuando nesta área porque sempre foi um comandante da luta de idéias. O mundo vai agradecer a Fidel por mais este serviço que dedica à tarefa de ajudar na libertação da humanidade. Pela importância de Fidel nos séculos 20 e 21, a mídia foi obrigada a se dedicar ao tema, mesmo mentindo, porque Cuba atrai as atenções de todo o mundo. E isso acontece não porque a ilha seja uma potência geopolítica, mas pela força de suas idéias. O pronunciamento do presidente norte-americano, por sua vez, demonstra que Bush é um homem desmoralizado. Segundo ele, este era o momento de asfixiar Cuba. Os pronunciamentos dos  pré-candidatos à presidência dos EUA mostram que, no que diz respeito a Cuba, todos adotam posições hostis. Acho que qualquer um desses que for eleito vai ser mais um chefe de Estado a ser derrotado pela revolução cubana. Todos tentaram acabar com ela e não conseguiram. 


 


 



Na sua avaliação, o que demonstra a eleição de Raúl Castro para a presidência do país?
Acho que o inimigo vai também se desapontar porque eles estão apostando que a eleição do novo presidente vai abrir um outro capítulo de transição para a chamada democracia ocidental, nos moldes estadunidenses, transformando Cuba no paraíso do capital estrangeiro. São ilusões que vão se esboroar diante da realidade de que os cubanos tiveram a capacidade de preparar a transição geracional da revolução. E com a capacidade que tiveram de fazer a transição através das gerações, tendo educado o povo dentro do espírito de unidade e de apoio à revolução e de luta contra o inimigo, o que os cubanos estão fazendo é garantir a continuidade da revolução. Obviamente, corrigindo os defeitos porque isso também faz parte do processo, abrindo novas perspectivas, percorrendo novos caminhos, mas sempre no rumo revolucionário. Temos a convicção de que o que está acontecendo em Cuba não é outra coisa senão a transição para se consolidar e aprofundar sua revolução.