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Publicado 29/09/2008 18:49 | Editado 13/12/2019 03:29
-Estou num ônibus especial. Noto um povo de cara fechada; ouço o diálogo de dois passageiros, que estão ali, do meu lado:
· E ai Bró?.
· Como é vagaba?.
· Tudo limpo na vida louca!.
· Sabe do mano Brown?.
· Dizem que foi o caveirão que pegou ele!.
· Como foi?
· Foi vacilão!
· E os manos, o quê fizeram?
· Sacumé, macho não chora!.
· Mas devia; ele é da perifa, como nós!.
· Sei!.
· Como foi?
· Vendia farinha e não deu retorno na boca!.
· Quanto ele devia?
· Dizem que era um mil!.
· Qual a idade dele?.
· Quinze!.
· Onde ele está? Na Febem?.
· Não!. No necrotério do H.C.!.
· Vamos lá?
· Não!. Têm umas minas de campana lá!.
· E a família dele?.
· A velha está um trapo!.
· E o velho?.
· Se mandou quando ele era menino. É sangue ruim!.
· Mas ele é menino!.
· É, mas tem filho com uma mina da zona leste!.
· E ela?
· Não sabe de nada!. Ela cheirava a mercadoria dele; estava sempre fora da real!.
· Onde está ela?
· No depósito do Tatuapé; o filho ficou com a velha dela!.
· Oh vida louca, Bró!.
· É isso ai, vagaba!.
· E domingo?
· Vou num hip hop no Capão Redondo, e você?
· Vou no enterro de um truta meu!.
· Quantos anos?
· Dezesseis!.
· Como foi?
· Tomava um goró com uns chegados; meia noite chegou um carro com cinco manos armados. Queimaram todos!.
· Quantos?
· Cinco!. Um deles tinha doze anos!.
· É nóis na fita, né bró!
· Pois é!
· Pois é!.
· Vou nessa, tchau!.
· Tchau; a gente se vê nas quebradas!.
· É, a gente se fala!.
E o ônibus da era globalizada, que vai para lugar nenhum, sacoleja nas estradas da vida, da vila, da capital, da periferia.
Nós todos vemos pela TV: os manos e as minas das periferias e dos guetos espalhados pelo mundo todo descem cada vez mais nas classes sociais e no despreparo para a era atual!. Lá fora há uma discussão acirrada. Olho pela janela o tumulto. Fico parado, olho arregalado, mudo, sem iniciativa. Ali, ao alcance de minha mão, o povo da periferia profere seu grito. Não adianta taparmos os ouvidos, nem nos escondermos.
Não é tão necessário falar de política ou da quebra de bancos americanos. Talvez seja o caso de acreditar que uma guerra está em curso e que é preciso acordar; os políticos e a sociedade!