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Dia do Saci vai vencer o Halloween, diz biógrafo de Lobato

Leia entrevista com o pesquisador, jornalista e saciólogo (por favor, não confundir com sociólogo) Vladimir Sacchetta, autor de uma biografia do Monteiro Lobato e integrante da Sosaci (Sociedade dos Observadores de Saci). “As bruxas do Bush, que antes est

Sacchetta fez boa parte da campanha que resultou na aprovação do Dia do Saci na cidade de São Paulo e no Estado de São Paulo em oposição ao americano Dia das Bruxas.


 


Agora, por que existe essa rivalidade? Ela existe porque o Saci, depois de perder seu maior patrocinador em 1948, quando morreu Monteiro Lobato, ficou um tanto à mercê das memórias interioranas. Nunca foi esquecido, mas andava meio que abandonado numas florestas ainda não desmatadas por aí.


 


Até que ele arrumou um grande articulador: é sério, por trás da instituição do 31 de Outubro como o Dia do Saci não está apenas um deputado federal nacionalista. Está Vladimir Sacchetta. Sacchetta também propôs ao MST que “assaciasse” o Saci à educação infantil organizada nos acampamentos.


 


Ele ainda é o organizador da mostra itinerante do Saci, como sacis antigos e modernos, obra de cartunistas do naipe de Voltolino, Angeli e Paulo Caruso, entre outros, inaugurada em 2005 na Biblioteca Monteiro Lobato, em São Paulo. Atualmente, ela não está em lugar nenhum, mas como ela é itinerante e é do Saci, qualquer hora ela aparece, sem avisar, perto da sua casa, num redemoinho.


 


Por que o Saci é popular no Brasil?


 


Vladimir Sacchetta – Ele encarna o lado mais travesso dos brasileiros, é malandro e tem ginga. Apronta mil e uma brincadeiras mas não faz maldades. Você já ouviu falar de alguém que tenha morrido ou tenha se machucado com uma “saciagem”?


 


De onde surgiu o saci? Por que ele é identificado com o Brasil?


 


Sacchetta – Nasceu indígena, na parte sul do Brasil, região fronteiriça com o Paraguai. Nessa primeira fase, tinha cor de índio. Com a chegada dos escravos africanos, ele ficou pretinho e ganhou o seu inseparável pito de barro. Mais tarde vestiu o gorro vermelho que chegou na bagagem dos imigrantes europeus e que simboliza, tal qual o piléu dos romanos, sua liberdade. Ou seja, com esses elementos de índio, de negro e de europeu, nosso Saci Pererê representa como ninguém a formação do povo brasileiro.


 


O Saci é uma espécie de malandro, que sempre apronta e se safa?


 


Sacchetta – Por causa dessa ginga, da arte da capoeira, do jogo de cintura e até do “molejo dialético”. O Saci faz das suas e cai fora pra morrer de rir dos resultados das suas travessuras. É debochado, cômico e protagonista das mais variadas façanhas. Mas é sempre um mito “do bem”, protetor das florestas e do meio ambiente.


 


Como você definiria o Saci?


 


Sacchetta – O perneta é o mais conhecido entre os nossos mitos e puxa a fila das demais crituras fantásticas que ocorrem no país. Tem Saci no Brasil inteiro e em cada região ele aparece de uma forma. Por isso fica difícil defini-lo. Quando Monteiro Lobato fez a pesquisa que resultou no livro “O Saci Pererê: resultado de um inquérito”, as controvérsias sobre ele eram tantas que o próprio Saci veio a público explicar como era. E isso aconteceu em 1917 (o livro foi publicado em 1918).


 


Com tantos persoangens da mitologia brasileira, por que o povo não se identifica mais com o Boitatá ou a Mula-sem-Cabeça, por exemplo?


 


Sacchetta – Você já se imaginou identificado com mitos horripilantes como esses? O Saci é só alegria, um negrinho simpático, divertido e com cara de sapeca. Pelas razões já expostas lá em cima, ele congrega os elementos formadores da nossa identidade e isso faz com que o povo identifique-se com ele.


 


Você encontra-se regularmente com o Saci? Como são as conversas?


 


Sacchetta – Como um legítimo observador de Sacis, topei com ele em duas ocasiões, no Vale do Paraíba. Mas não deu pra conversar, foi tudo muito rápido, o Saci sumiu de vista aos pulos e se embrenhou na mata.


 


Qual a diferença entre um observador e um criador de Saci?


 


Sacchetta – Sou, como todos os companheiros da Sosaci – Sociedade e Observadores de Saci – um observador. Somos contra a captura, prisão ou confinamento de Sacis. Nem que seja em criatórios. A liberdade é o bem maior do Saci, um mito essencialmente libertário. E isso é o que distingue os saciólogos militantes da Sosaci dos “criadores” de Botucatu, membros da ANCS – Associação Nacional dos Criadores de Sacis. Quem cria confina…


 


E há diferenças comportamentais significativas entre o Saci de Sorocaba (oeste paulista) e o de São Luís do Paraitinga (Vale do Paraíba)?


 


Sacchetta – Cada Saci é um Saci… Eles são diferentes uns dos outros e assumem características próprias das regiões onde ocorrem.


 


Quem é (ou quem são) o(s) maior(es) inimigo do Saci? Por quê?


 


Sacchetta – Os maiores inimigos dos Sacis são aqueles que abrem mão da sua identidade em nome do que é “moderno” e do que vem de fora, especialmente das lojas de departamentos de Maiami (assim mesmo, Maiami… ). São os que preferem festejar o dia do Halloween em vez de celebrar o Saci em 31 de outubro. Os que assistem Pokemóns e outras criaturas esquisitas e enlatadas no lugar dos Sítio do Picapau Amarelo. Em suma, os adoradores das bruxas – e da geopolítica – do Bush!


 


No país do futebol, um dos seus principais símbolos é perneta! Não há uma contradição aí?


 


Sacchetta – Quando se fala em acabar com preconceitos de raça, cor ou qualquer outro, especialmente contra os deficientes físicos, não há nada nem ninguém melhor do que o Saci, para representar o Brasil e os brasileiros. E é por isso que defendemos o Saci como mascote da Copa do Mundo de 2014, que será realizada aqui.


 


Em tempos do politicamente incorreto, como ainda deixam o Saci andar com aquele cachimbo na boca?


 


Sacchetta – E qual o problema do Saci fumar? O tabaco faz mal à saúde dos seres humanos, disso não há dúvida. Mas não faz mal para os mitos. E tem mais, os mitos, como o Saci, não tem que ser politicamente corretos.


 


O Saci não deveria ser mais popular no Brasil? Tipo o Astérix na França, o Superman nos Estados Unidos ou o uísque na Escócia? O que falta para ele ficar mais conhecido?


 


Sacchetta – Ele é muito popular no Brasil, de norte a sul. Não há quem não o conheça, tenha ouvido falar dele e até visto um. Mas a briga com os mitos importados, como a bruxabóbora do Halloween, é uma briga difícil. Para se ter uma idéia da correlação de forças, as bruxas do Bush, que antes estavam circunscritas às escolas de língua inglesa, invadiram até a rede pública de ensino. Mas a vitória do Saci sobre elas virá, disso não tenho dúvida.


 


Mas não há alguma espécie de equivalentes do Saci em outros países? O Halloween não é o “Dia do Saci” dos americanos?


 


Sacchetta – Todos os povos e países tem seus mitos, equivalentes ao saci ou não. No caso do Halloween, trata-se de um mito de origem celta que chegou aos EUA com os imigrantes irlandeses. E tudo que chega lá é apropriado pela máquina comercial estadunidense e vira suco, vira produto de consumo. Para se ter uma idéia do que os “bárbaros imperialista” são capazes, basta lembrar que o Papai Noel – isso mesmo, o Papai Noel – teve sua vestimenta original, que era azul, tingida de vermelho para servir aos propósitos de uma campanha da Coca-Cola na virada para os anos 30 do século passado. E ficou vermelho até hoje.


 


Qual a grande lição que o Brasil tem a aprender com o Saci?


 


Sacchetta – Que o padrão civilizatório não vem de fora, não vem de Maiami, e sim das raízes multiculturais e multiétnicas riquíssimas que temos. Antes, no tempo em que Lobato pesquisou sobre o Saci, o foco era a Europa, era Paris, e o país pensava em francês e falava a língua portuguesa de Portugal. Hoje, pensa em maiamês e a moda são as “Sales 50% Off”, a comida “Delivery”, os “Parkings” e “Valet Services”, numa clara demonstração de invasão cultural e perda de identidade.


 


O Saci já leu Monteiro Lobato? O que ele acha dos livros do Sítio do Picapau Amarelo?


 


Sacchetta – Monteiro Lobato é o maior dos saciólogos que o Brasil já teve. Até o Saci, que vive na escuridão da noite e não é muito chegado a leituras, adora os livros e a turma do Sítio.


 


Fonte: da redação, com informações do UOL Tablóide