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Irlanda luta para não se transformar na nova Islândia

Uma piada corre na Europa: Qual a diferença entre Iceland (Islândia) e Ireland (Irlanda)? Uma letra e seis meses. A ideia de que a Irlanda seguirá em breve o caminho da Islândia, cuja economia derreteu num colapso financeiro no final de 2008, vem sendo re

A Irlanda se notabilizou como plataforma de empresas que exportam para a Europa. O crescimento forte e o ambiente favorável aos negócios levaram o país a ser chamado de “tigre celta”. Porém, desde o ano passado, há uma fuga de empresas. Em janeiro, Philips e Dell anunciaram a transferência de fábricas para a Polônia. Ontem, a Ericsson demitiu 300 funcionários de pesquisa e desenvolvimento em Dublin e indicou que também pode levar suas operações para o Leste Europeu. Segundo rumores no meio sindical irlandês, o Citigroup deve fechar suas operações administrativas no país e transferi-las para a Índia, onde os salários são mais baixos. 



“Nossos custos vêm crescendo de forma alarmante nos últimos anos. A subida dos custos com salários na Irlanda foi 50% maior que na média da zona do euro de 2001 a 2008. Para quem não conseguir controlar o aumento de salários, e até mesmo para quem não conseguir abaixá-los, não será possível continuar operando no país”, disse Paul Duffy, vice-presidente da Pfizer na Irlanda e em Cingapura. Ele pede que a União Europeia haja logo para evitar que a situação piore. 



O setor de construção, que representa 12% do PIB irlandês, está em contração desde meados do ano passado. Segundo a Federação da Indústria da Construção, as empreiteiras do país estão tendo de procurar obras no exterior para tentar manter seus funcionários. 



Para Rowan Manahan, consultor da Fortify Services, a crise na construção está fazendo com que os irlandeses também comecem a migrar para outros mercados menos atingidos, como Austrália e Nova Zelândia. “Muita gente do setor de construção, como eletricistas e encanadores, está simplesmente deixando seus apartamentos para alugar e procurando oportunidades em outros países.” 



Cerca de 1,5 mil pessoas por dia estão recorrendo ao seguro-desemprego. Analistas estimam que a taxa de desemprego pode chegar a 12% até o fim do ano. 



No sistema bancário, a tensão não é diferente. As ações do Allied Irish Banks e do Bank of Ireland, os dois maiores do país, despencarem mais de 25% nos últimos dias por causa de temores quanto à solvência dos bancos. O ministro das Finanças, Brian Lenihan, disse ontem que o governo deve recapitalizar os dois “em poucos dias”. 



A isso se junta o temor sobre a dívida irlandesa. A Irlanda foi o primeiro país da Europa Ocidental a ter sua classificação revista pela Moody's, de estável para negativa. “O rating Aaa é apropriado por agora, pois o país entra numa crise financeira ainda em uma posição fiscal favorável”, disse Dietmar Hornung, analista da Moody's, em relatório da semana passada. A S&P, que já rebaixou Espanha, Grécia e Portugal, alertou a Irlanda de que pode perder o status de AAA. 



Segundo estimativa do BC do país, o déficit público deve chegar a 9,5% neste ano. O governo do Fianna Fáil (Partido Republicano, de centro) propõe aumento de impostos e corte de gastos, mas tem enfrentado reveses. Terça-feira, anunciou o fracasso de sua tentativa de acordo com os sindicatos para aumentar a contribuição de aposentadoria sobre o funcionalismo – há hoje 350 mil funcionários públicos, numa população de cerca de 4 milhões. 



O premiê Brian Cowen disse que o funcionalismo vai ter de aceitar um padrão de vida menor. O jornal “Irish Times” publicou um editorial recentemente em que traduz um pouco a sensação dos irlandeses hoje em dia, fazendo um paralelo com o Titanic – que foi construído na Irlanda. Antes, os irlandeses eram passageiros viajando em meio ao luxo e ao conforto; agora, depois de bater em um iceberg, foram jogados em águas geladas. E tudo vai depender do socorro. 



Fonte: Valor Econômico