Belo Horizonte pode ser sede do Memorial da Anistia

O Jornal Hoje em Dia publicou nesta sexta-feira (17) matéria do repórter Orozimbo Souza Júnior sobre as articulações da UFMG junto ao Ministério da Justiça para que a capital mineira seja a sede do projeto Memorial da Anisitia Política no Brasil. Uma d

O reitor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Ronaldo Pena, deverá formalizar no próximo dia 28, em Brasília, junto ao ministro da Justiça, Tarso Genro, uma parceria com o ministério para que Belo Horizonte sedie o Projeto Memorial da Anistia Política no Brasil. Trata-se de uma iniciativa para organizar, preservar e divulgar a memória e o acervo histórico dos períodos de repressão política no país, desde 1946 até o fim da ditadura militar, em 1985. A criação do memorial foi definida ano passado, mas a escolha da cidade que o abrigará será nos próximos dias.


 



De acordo o Ministério da Justiça, entre as propostas apresentadas por universidades de todo país, a melhor seria a da UFMG, mas outras cidades, como São Paulo e Porto Alegre, seguem como candidatas. “Está quase certo que a sede seja aqui, mas estamos agindo ‘mineiramente’, esperando a assinatura para anunciar oficialmente”, disse ao HOJE EM DIA a professora de História das Ideias da UFMG, Heloisa Starling, que é vice-reitora da instituição.


 


Referência
De acordo com a professora Heloisa, mais do que colocar Belo Horizonte na rota dos estudos sobre períodos de repressão política, o projeto fará com que a cidade seja centro de referência em pesquisas sobre o tema. Atualmente, Rio de Janeiro e São Paulo, além da capital da Argentina, Buenos Aires, concentram grande parte dos documentos e estudos sobre períodos de repressão política na América Latina.


 



“O projeto é muito grande. Inclui o Memorial Nacional da Anistia, espaço museográfico, um centro de estudos latino-americanos e um observatório permanente da Justiça Brasileira”, explicou Heloisa. Além disso, segundo a professora, o memorial deverá funcionar nos moldes do Museu Abílio Barreto, que preserva a memória histórica de Belo Horizonte, com fotos, cartões postais, livros e estudos sobre a cidade. E terá, ainda, espaço para mostras de filmes e atividades culturais.


 



O ex-ministro da Secretaria Especial de Direitos Humanos Nilmário Miranda, um anistiado, entende que “é importante ouvir a história das vítimas, a voz das vítimas, como a Alemanha, que preservou a memória do nazismo, conseguindo exorcizá-lo e julgar os acusados”, disse. Nilmário disse que estará em Brasília no dia 28, durante o ato solene de criação do memorial, cujo nome definitivo ainda será definido. Ele destacou o trabalho que UFMG desenvolve para preservar o acervo documental dos períodos de opressão.


 



Nilmário Miranda, que atualmente preside a Fundação Perseu Abramo, entidade criada pelo PT para desenvolver projetos político-culturais, disse que caso a eminente escolha de Belo Horizonte para abrigar esse projeto seja consolidada será importante para todo o Estado. Ele lembrou um projeto de lei, aprovado na Assembleia Legislativa, atualmente paralisado, que cria o memorial de Minas na sede do antigo Departamento de Ordem Política e Social (Dops), na Avenida Afonso Pena, em BH.


 



“O Dops simboliza a tortura e o arbítrio da ditadura, tem um peso simbólico a sede do memorial mineiro ser lá. Qualquer outro lugar poderia sediar, mas a escolha tem que ser pelo Dops, por todo simbolismo que possui. Não queremos remexer em feridas, mas lutar por um futuro melhor. A sociedade civil deve se mobilizar mais para implantação do memorial em Minas. Algumas entidades estão trabalhando nesse sentido, sem abrir mão de utilizar o espaço que era do antigo Dops”.


 


Doações
A maior parte do acervo virá de doações, que estão sendo recebidas desde meados de 2008, através da campanha de doação e arrecadação de documentos do Ministério da Justiça. Uma fonte ligada à UFMG revelou que o ministro Tarso Genro doará o seu acervo pessoal, com material que possui para o projeto.


 


Todas as doações serão recolhidas e organizadas junto a dossiês administrativos, fotos, relatos, testemunhos, livros, vídeos, áudios, imagens, entre outros, acumulados pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça nos últimos anos. O material receberá tratamento adequado, para possibilitar a consulta e o estudo, criando as condições para que a memória da resistência do povo brasileiro ao período de repressão fique acessível. De acordo com Heloisa Starling, a UFMG já trabalha há um ano na organização de documentos. “Várias coisas estão emergindo. Coisas pouco ou nada conhecidas. É um projeto muito interessante”.


 



Também para a anistiada Gilse Cosenza, mineira de Paraguaçu, perseguida e torturada na ditadura militar, o memorial permitirá algo que a maior parte dos arquivos disponíveis não possibilitam: ouvir o ponto de vista dos torturados. “Em muitos documentos com depoimentos, temos acesso ao que os torturadores obrigaram as vítimas assinarem. O memorial vai trazer a opinião do outro lado”, comemorou Gilse. Ela atua na defesa dos interesses dos perseguidos pela ditadura e no resgate da memória.


 



“Infelizmente, não poderei doar documentos e fotos ao memorial. Como fui perseguida e mudei de cidade e estado várias vezes, destruía todos os documentos que pudessem permitir que fosse encontrada. Tenho pouquíssimas fotos das minhas filhas daquela época. Mas acredito que outras pessoas que tiveram uma vida menor na clandestinidade poderão ajudar muito. Creio que elas tenham documentos que contribuirão”, finalizou Gilse, que aguarda com expectativa a confirmação para a UFMG.


 


 


HOJE EM DIA