51º Congresso da UNE: Um congresso e o futuro pela frente
Patrique Xavier de Lima tem 21 anos e cursa o terceiro ano de engenharia florestal na Universidade do Estado do Amapá. Com aquela disposição típica de quem está na faixa dos 20 anos, ele descreve sua programação para os próximos dias. “No domingo de ma
Publicado 12/07/2009 21:24
O encontro na capital federal deve reunir 10 mil estudantes que, como Patrique, virão de todas as regiões do País. A mais tradicional entidade estudantil brasileira comemora o que considera o congresso mais representativo de sua história, em que 92% das instituições de ensino superior elegeram 5,2 mil delegados. No encontro, estes escolherão por voto tanto os temas defendidos pela UNE (direito à meia-entrada e reforma universitária, entre outros) como quem a presidirá no próximo biênio. Ao que tudo indica, deverá ser eleito Augusto Chagas, candidato da chapa “Da unidade vai nascer a novidade”, afinada com o PCdoB e à frente da UNE desde 1989.
É impossível falar de movimento estudantil sem revistar o passado. Fundada em 1937, a UNE teve maior ou menor presença nos principais acontecimentos políticos do País desde então. Na ditadura, tornou-se um importante foco de resistência. Em 1984, a UNE estava nas passeatas pelas Diretas Já e, anos depois, chamou para si (e à União Brasileira dos Estudantes Secundaristas) o mérito de ter levado milhares de estudantes às ruas pelo impeachment do então presidente Fernando Collor.
Depois de FHC, com a chegada de Lula ao poder, a UNE e todos os movimentos sociais viram-se em situação inédita: não havia mais um inimigo comum e o presidente era um “companheiro”. Tanto que um dos pontos altos do presente congresso será a presença de Lula, na quinta-feira 16. No mesmo dia, os estudantes farão uma passeata em defesa do petróleo e da Petrobras.
“A UNE deixou de fazer resistência ao projeto neoliberal para passar a fazer proposições. Mudou a relação do movimento social com o estado”, analisa a estudante de jornalismo e diretora da UNE, Débora Pereira, de 24 anos. Ela milita no PT e presidiu o grêmio no ensino médio antes de entrar na faculdade particular com bolsa integral graças ao ProUni – programa federal defendido pela UNE. Débora não vê problema na proximidade com o Planalto. “O governo é progressista, mas não significa que estejamos atrelados a ele. Um é um, outro é outro”, diz, e exemplifica como independência o pedido, no último congresso, em 2007, da saída de Henrique Meirelles (Banco Central) e Helio Costa (Comunicações) do governo. E pondera: “Temos plena consciência de que o movimento estudantil não é mais o grande mobilizador da juventude. Hoje, há um leque muito grande de atuação, como nas ONGs, mas temos avançado”.
No entender do cientista político e pesquisador da Fundação Getulio Vargas, Marco Antônio Teixeira, a UNE vive outros poréns. “Como em todo movimento reivindicatório, hoje restou muito mais uma representação partidária do que algo que dialogue realmente com a base. Na UNE, uma máquina se estruturou para manter o poder enquanto, com o crescimento de universidades privadas, a base estudantil aumentou e mudou de perfil. A UNE não acompanhou esse bonde, mas tem um papel político e deve interferir.”
Críticas mais duras vêm de uma entidade alternativa, a recém-fundada Assembleia Nacional dos Estudantes Livre (Anel), durante um congresso com 2 mil estudantes. “Diante da paralisia da UNE desde a eleição do Lula, vimos a necessidade de reivindicar o que ela sempre defendeu, mas abandonou”, diz Glória Trogo, de 25 anos, aluna de letras e integrante do Diretório Central dos Estudantes (DCE) da UFMG. Além deste, os DCEs da USP e da UFRJ apoiam a nova entidade.
Glória e outros protagonistas militam no PSTU – partido tão ligado à Anel quanto o PCdoB à UNE.
Se é legítimo, e desejável, que lideranças políticas surjam das demandas sociais, a proximidade dos partidos políticos com o movimento estudantil nem sempre é bem-vista. “Somos extremamente contra o aparelhamento”, pontua Marcelo Chilvarquer, de 19 anos, diretor de política social do Centro Acadêmico XI de Agosto, grêmio tradicional da faculdade de Direito da USP. Segundo ele, o problema não é militar, mas trazer bandeiras partidárias para dentro do movimento. “Slogans por slogans não mudam muita coisa. Pode parecer despolitização, mas é uma busca por qualidade”, diz. Marcelo considera emblemática nesse sentido a discussão sobre a flexibilização da lei da anistia, “um momento de efervescência política”. Apesar de ter uma relação “bem razoável” com a UNE, o XI de Agosto, associado ao DCE da USP, não enviará delegados ao congresso.
Mesmo na oposição, a UFRGS enviará cerca de 80 estudantes a Brasília. Do Rio Grande do Sul, sairão 330 delegados. “O movimento estudantil continua muito vivo”, garante Rodolfo Mohr, de 22 anos, aluno de jornalismo e tesoureiro do DCE da federal gaúcha. “Vivemos uma época de individua-lismo muito forte. Mas problemas cotidianos da faculdade, como a falta de professores, acabam incentivando a mobilização”, diz ele, que é filiado ao PSOL. No Sul, as discussões giram em torno da política de cotas, e as principais manifestações são contra a governadora Yeda Crusius e o senador José Sarney. “Como pode a UNE não ser contra o Sarney?”, cutuca.
“Porque queremos uma reforma política, e não um Parlamento enfraquecido”, rebate a presidente da UNE, Lúcia Stumpf. Em fim de mandato, ela refuta a ideia de que um partido domine a entidade. “Dos 85 diretores, cerca de 20 são alinhados ao PCdoB e há militantes de todos os demais, exceto o PSTU, que rompeu por não ser capaz do exercício democrático”, diz. E comenta a independência da entidade. “Não defendo, de forma alguma, os temas do PCdoB. Há um controle muito grande das opiniões defendidas pela UNE.” Para concluir, Lúcia argumenta que o diálogo com o governo tem permitido conquistas, e cita o fim do vestibular e o novo Enem. “Não vieram de presente, lutamos por isso.”