Jaime Sautchuk: versos para um amigo morto
Jaime Sautchuk é um homem das letras. Jornalista experiente, a partir dos anos 70 andou por redações da imprensa convencional (como O Estado de S. Paulo, O Globo, Folha de S. Paulo, Veja, entre outras) mas deixou sua marca também na imprensa da resistência, como Opinião e Movimento e, mais tarde na imprensa do PCdoB. Hoje, é um destacado colunista do portal Vermelho.
Por José Carlos Ruy
Publicado 25/02/2011 17:48
Jornalista e escritor, não poderia estar avesso àquela que talvez seja a mais exigente forma de escrita, a poesia. Seguem, abaixo, duas manifestações dessa arte. Uma delas é uma homenagem a um amigo e também homem do pensamento, o pesquisador Cezar Martins de Sá, biólogo, professor da Universidade de Brasília, especialista numa área de ponta da investigação científica, a biologia molecular. E que deixou de viver no dia 25 de janeiro, com apenas 62 anos de idade. Veja abaixo os poemas:
De Quê Viver?
Por Jaime Sautchuk
A cirrose mata o bêbado
Overdose, o tri-legal
Aids, o do risco
Stress, o jornalista
Sol, o camponês
Trabalho, o operário
Fome, o miserável
Mar, o pescador
Coragem, o revolucionário
Tiro, o menino de rua
Tensão, o piloto
Tesão, a prostituta
Paixão, eu e alguns amores
Que, bem ou mal, serão louvados
E os burocratas, de quê morrem?
De tédio, os desgraçados!
Estímulos
Por Jaime Sautchuk
Ao amigo Cezar Martins de Sá
Nossa vida, olhando bem, é apenas
Um delicado programa de morte
Que se prolonga e prolonga
Sob os desígnios da sorte
É sublime nascer, belo desenvolver
Mas, súbito, paramos de crescer
Quem mandou parar?
E agora, o que nos faz viver?
Somos, pois, programados para a morte
Sou, sois, experimentos genéticos
De quem não sei, não me cabe saber
É pelo bem, é de lei, o que posso crer
Sei garimpar minhas proteínas
Nos cotidianos estímulos da vida
São o amor, a flor, as meninas
Os meninos da roda, a cantiga
São o simples luar, o fruto, o mar
As águas do rio, um alguém que sorriu
A bola a rolar, a seriema a cantar
Um bem-querer a quem nunca viu
É o coração, portanto, a porteira da vida
A beleza, o encanto, viram carga biológica
A emoção que nos aparece – é esse o motor
O resto é pura prece ou coisa de doutor