Marteli, o preferido dos imperialistas para abrir o "business"
"Os EUA estão particularmente satisfeitos com o presidente eleito Michel Marteli", declarou a secretária de Estado, Hillary Clinton, durante entrevista dada em Washington, tendo ao seu lado Marteli, no âmbito da viagem de 4 dias que faz aos EUA o haitiano, ocasião em que manteve contatos com várias autoridades do governo, FMI, Banco Mundial, Banco Interamericano de Desenvolvimento, empresários e imprensa, antes de assumir o Haiti no dia 14 do mês que vem.
Pedro Belasco, no Monitor Mercantil
Publicado 29/04/2011 01:15
O visível entusiasmo dos EUA foi impossível ser dissimulado, especialmente porque desempenharam papel protagonista no golpe de estado eleitoral que resultou na eleição do ex-cantor Michel (Sweet-Micky) Marteli, conhecido por seus estreitos relacionamentos com os grupos paramilitares, assim como com o Exército do Haiti, declarado co-participante dos dois golpes de estado contra o presidente Jean-Bertrand Aristide, tanto em 1991, quanto em 2004.
O entusiasmo norte-americano cresceu graças ao sucesso que Marteli registrou em seus "primeiros exames". "O Haiti marchava no caminho errado há 25 anos", declarou em entrevista à rede CBC do Canadá, insinuando, exatamente, o período quando o povo do Haiti tentou quebrar, de alguma forma, o regime de dependência.
Sua meta principal é a reconstrução do país após o terremoto de 12 de janeiro do ano passado, já que encontra-se, tragicamente, atrasada, conforme declarou, esclarecendo que será realizada com a adoção de um imposto de cinco centavos sobre cada ligação telefônica, além do acesso que o Haiti possui às ajudas econômicas internacionais e, principalmente, aos investimentos estrangeiros (leia-se "business" das multinacionais).
Destacou, também, que espera o imediato reagrupamento do exército, as FadH, forças que haviam sido dissolvidas pelo ex-presidente Aristide por causa de seus crimes, violações de direitos humanos e contínuos golpes de estado. Também, Marteli anistiou o ex-ditador Jean-Claude Duvalier.
A propósito, Lady Catherine Ashton, "ministra" de Relações Exteriores da União Européia, saiu de seu silêncio e caracterizou a atual fase de "transição democrática do Haiti um estágio importante". Mas, para se tornar mais compreensível este estágio da "transição democrática do Haiti", é necessário serem esclarecidos os fatos que o compõem.
Golpe de estado eleitoral
Enquanto o presidente "eleito" Marteli realizava sua visita nos EUA, o presidente da anticonstitucional Comissão Eleitoral, Pierre Tibot, lendo um simples comunicado, declarou-o vencedor do segundo turno das eleições presidenciais, realizadas em 20 de março deste ano.
Milagrosamente, os percentuais anunciados por Tibot não são diferentes sequer por um voto dos resultados do primeiro turno: 67,57% para Marteli e 31,5% para sua adversária, ex-primeira-dama e senadora Mirland Maninga.
O maior partido, Fanmi Lavalas, de Aristide, foi excluído imediatamente após as eleições, as denúncias de eleições-paródia foram ignoradas, enquanto predominaram as ameaças dos paramilitares de Marteli: "Se Marteli não for eleito haverá guerra civil".
A participação dos eleitores no segundo turno foi ainda menor do que no primeiro, 22,8%, com inúmeras denúncias de fraudes, como a inexplicável eliminação de 400 mil eleitores das listas eleitorais.
O terremoto de 12 de janeiro foi catastrófico e, além das mortes que causou (talvez cerca de 300 mil), revelou em todas as dimensões o crime que está consumado no Haiti pelo sistema capitalista e seus protetores imperialistas.
A catástrofe não foi causada pelo terremoto, mas pela crônica exploração capitalista e a depreciação do nível de vida da população. Um milhão, exatamente, de haitianos continua morando em acampamentos de refugiados provisórios, 15 meses depois. As condições são perigosas e desumanas, enquanto os estupros e as agressões são fenômenos endêmicos; 95% dos escombros continuam amontoados nas ruas de Porto Príncipe.
Sistema público de esgoto não existe mais após o terremoto. E decorrência do terremoto foi, também, a destruição da limitada rede particular de esgoto que existia. Agora, caminhões recolhem os dejetos das ruas e os atiram em rios ou em grandes buracos que abertos para este fim.
Estas condições resultaram em epidemia de cólera, inicialmente, na região de Artibonit, no Centro do país, por causa do vírus que disseminaram os soldados do Nepal, participantes da Minustah.
Um dos maiores buracos para despejar dejetos encontra-se em Trutier, uma pequena comunidade ao norte de Porto Príncipe, onde a cólera grassa em níveis extremamente altos. Desde 20 de outubro do ano passado, quando registrou-se o primeiro caso de cólera, 4.856 pessoas perderam a vida, segundo dados oficiais, enquanto mais de 200 mil são os casos atuais.
No último fim de semana, novos focos de cólera foram localizados em regiões agrícolas do Haiti. Contudo, relatório publicado em 16 de março deste ano pela revista médica Lancet duplicou as estimativas da Organização Mundial de Saúde para 400 mil casos e avaliou que até o final deste ano serão registrados 770 mil casos e cerca de 11,1 mil mortes.
Temor de levante
"Um levante da população está próximo"; "O vazio político criado pelo terremoto, a instabilidade política, assim como o retorno de Aristide elevaram em demasia os riscos de eclosão de um levante popular, considerando que o retorno de Aristide significará o início da luta para seu retorno ao poder", relatam documentos, altamente secretos, do Ministério de Relações Exteriores do Canadá, divulgados pela Canadian Press.
O MRE canadense não é um player casual no que diz respeito o Haiti, considerando que protagonizou na "Iniciativa de Ottawa" a orquestração entre EUA, França e Canadá para a campanha de convulsão social e provocação do caos que justificou a intervenção, o golpe de estado e a violenta expulsão de Aristide para a África do Sul.
Também no dia 4 deste mês chegaram os primeiros integrantes da Força de Choque, Bon Voizen, que no dialeto creole significa bom vizinho, parte da Missão Humanitária Novos Horizontes 2011, segundo comunicado da Embaixada dos EUA aqui, em Porto Príncipe, que acrescenta que "estes soldados humanitários evoluirão em Saint Mark para se prepararem antes de seguir para sua base em Madrin, na região de Artibonit".
Na Cité de Soleil, maior favela e maior foco das forças de Lavalas e de Aristide, e no Porto de Saint Mark, recentemente foram realizadas violentas manifestações populares que poderão evoluir em ondas de ira popular e ameaçar os interesses da plutocracia haitiana e dos imperialistas aliados de Marteli.